Blog do Guto Guto de Castro é escritor, formado em filosofia e pós-graduando em Filosofia Clínica pelo Instituto Lúcio Packter, Porto Alegre-RS
Sobre a verdade de cada dia
08/05/2022
Bom dia Planeta! Tenho recebido alguns e-mails tratando sobre o tema em tela. Os últimos tempos na Terra estão sendo marcados por dias de incertezas. A pandemia, o aquecimento global, a guerra, a crise econômica e a falta de perspectiva estão levando as pessoas ao medo e à ansiedade.
Bem, devemos fazer uma diferenciação entre o medo e a ansiedade. A ansiedade é inevitável. Todos nós temos ansiedade, principalmente em um mundo em que há tantas coisas que nos ameaçam. A ansiedade parece algo que vem da angústia. É limitante. Faz com que nos sentamos pequeninos.
E com a ansiedade aparecem o medo e cenários que talvez nunca existirão.
- Não, eu não quero que isso aconteça (...)
E ficamos tensos. Para muitas pessoas é muito difícil superar tudo isso. Para outras pessoas é possível meditar e focar uma máxima:
- Certo é inevitável, mas vai passar. A vida nos permitirá superar essa situação.
E sabemos como fazer isso desde muito cedo. Todos nós quando nascemos passamos por meio de uma passagem, um canal muito estreito, durante o parto. E essa é a nossa primeira experiência de medo e ansiedade. E para tanto, chegamos à vida, fora da proteção da barriga da mamãe, com medo, com fome e chorando.
É interessante que todas as vezes que entramos em lugares estreitos ou em situações existenciais e mentais que nos sufocam somos submetidos a experiência vivida naquele primeiro parto. E com o passar do tempo, percebemos que a vida é um passar por vários partos. São oportunidades para novos nascimentos. Contando, é claro, que confiamos na vida. Porque ao contrário, ficaremos presos neste eterno retorno.
E isso é o pior que pode acontecer. Vira um trauma, um toque, uma fobia. Então, ao contrário de sentirmos medo (...) devemos seguir em frente com confiança – ainda que um dia nos apareça o choro e no outro a alegria de viver.
Tenha em mente que o pior já passou e que você tem tudo a favor porque a vida está, constantemente, fazendo tudo por você. Você não pode ficar preso neste ciclo. Então, você tem todos os motivos para confiar na vida. E a vida nos dá momento a momento uma palavra de superação. Chamamos isso de palavra porque tudo que acontece tem uma explicação, uma palavra. Nossa conversa neste momento, por exemplo, é uma palavra cercada por alguns questionamentos como, por exemplo:
- O que a vida quer de você?
Então, você terá que responder a essa pergunta. Eu não posso responder por você. Claro que todos temos problemas. Mas o Sol está lindo, podemos respirar ainda. Temos esperança. Só percebemos que isso é um presente quando deixamos de sentir todo o encantamento da vida. E viver é justamente isso. Não temer está por aqui. Não ser ansioso com o que está por vir. Devemos viver com coragem e esperança a verdade de cada dia. E então, cercado de vida, você reage.
Ganhamos um tempo novo e vemos um mundo velho e doente
19/03/2022
Bom dia Planeta!!! O que há de tão especial neste tempo novo? A percepção que tenho é que testemunhamos o mesmo e velho mundo doente. Bem, senhores e senhoras, essa é uma opinião muito particular e que pode ser diferente para cada um de nós. É bem verdade que o mundo e as pessoas sempre foram assim e que sempre em tempo de guerra e crise, como essa que estamos vivendo, há uma esperança de que seremos melhores em humanidade. É claro que neste cenário testemunhamos histórias inspiradoras, fatos notáveis, como a dedicação dos profissionais de saúde às vítimas deste vírus, a assistência espiritual de padres, pastores e sacerdotes que sacrificaram suas vidas para ajudar os enfermos. São lições de grande monta e solidariedade. Simultaneamente, assistimos os grandes eventos da natureza: tsunamis, terremotos, maremotos, ciclos de estiagem, o agravamento da poluição, etc. Enfim, por todos os lados percebemos que precisamos mudar nossas práticas e que serão fundamentais para mudar o destino que nos aguarda. Não há um homem ou uma mulher a quem essa loucura não tenha ocorrido: a de mudar o mundo. Chamar para si essa responsabilidade ainda que nos limitemos a apenas arrumar nosso quarto ou deixar o carro na garagem. Um outro desafio que precisamos realizar é mudar a forma como acreditamos que as coisas são. Se antes tudo nos parecia justificável por narrativas mitológicas e crenças, agora é chegada a hora de usar a razão, o pensamento e a ciência para validar o que de fato acreditamos ser o melhor caminho. Precisamos também frear essas paixões desenfreadas na política, no esporte, na vida. Falo dessas paixões cegas e dogmáticas que são insensíveis ao respeito e a solidariedade de quem pensa o contrário. Um outro tópico que destaco é nosso egoísmo e apego aos bens materiais. “A fortuna não nos pertence.” Vamos partir e tudo isso vai ficar por aqui com os outros que terão a mesma ilusão. É incompreensível que uma minoria continue administrando 97% das riquezas e outros tantos bilhões de indivíduos tenham que partilhar apenas 3% destes valores. Portanto, diante do velho mundo doente, temos algumas chances de reparar esses cenários de barbárie e miséria e passar por esse dificil e complexo emaranhado existencial. Não se trata de renunciar simplesmente renunciar as coisas, mas ultrapassá-las. Isso se faz com discernimento. Vamos procurar organizar as coisas por aqui e repartir melhor o pão da vida. E isso já será de bom tamanho, de grande monta, para resolver os outros problemas que temos. Por hora envio algumas provocações : - O quanto estamos contribuindo de fato para que a vida seja uma catástrofe existencial, uma tragédia? E quanto, de fato, é nossa contribuição e reação para mudar esses cenários postos anteriormente? Bem, é isso. Até o nosso próximo encontro, se Deus quiser!
Bom dia planeta!!! Gosto muito desta época do ano. Há um eterno retorno para o período em que eu era criança e sonhava com a Ceia de Natal, o Menino Jesus, o Papai Noel e os Reis Magos. Fui catequizado por meu avô e por minha avó através desta simbologia. O evento marcava também a festividade de nascimento do meu avô – Raimundo Firmino Oliveira. Era, portanto, a garantia da realização de dois grandes sonhos na minha vida de criança.
Desde criança somos iniciados à vivência de momentos mágicos em nossas vidas. Esses acontecimentos são como um oxigênio a mais para enfrentar a realidade e não constitui nenhuma alienação. Há muitas experiências assim e essas vivências suavizam nossa trajetória existencial.
O poeta Mário Quintana escreveu muito sobre esse tema. Para o poeta, muitas questões de nossas vidas não podem ser simplesmente separadas do que é sonho ou do que é realidade. Há dias que são melhores vividos como sonhos do que realidade. Mas há também ocasiões que realidade e pesadelos nos castigam. Mas não irei falar sobre isso aqui.
Onde começam os sonhos?
É bem verdade que cada evento tem um significado especial para singularidade da cada um. Muitas pessoas passaram o ano sonhando com a chegada do veraneio, as férias, uma viagem especial. Para outros, a retomada dos eventos festivos, as folias de ruas, as festas religiosas, culturais e esportivas constituem importantes fatos para suas vidas. Eu, particularmente, gosto de dezembro, da noite mágica do Natal.
Planejar e realizar uma viagem, mudar de vida após a pandemia, descartar um monte de coisas que não servem mais. Isso é sonho? Isso é realidade? Para muitos de nós esse sonho já é realidade e não há como desconectar. Existem pessoas que hipotecam anos de suas vidas por conta de um sonho. Projetam casas, automóveis, sítios, entre outros bens materiais. E isso é errado? É certo? Essa é uma resposta muito particular de cada pessoa.
O mais importante é que não devemos deixar os sonhos de fora da nossa realidade – como bobagens, devaneios, delírios. Precisamos temperar a vida com os sonhos e os sonhos com a vida. Principalmente, diante de momentos complexos e de profundas crises como estamos vivendo agora.
E o Mário Quintana? Já dizia o poeta gaúcho que:
“A gente deve atravessar a vida como quem está gazeando a escola (...) não como quem vai para a escola. ”
Viver a vida como quem passeia por ela, como quem brinca com ela, como quem usufrui dela e é feliz. Todavia, vamos realizar isso com prudência, conhecimento, ética, sabedoria e respeito.
Bem, é isso. Eu quero desejar aqui um Natal bem feliz, um ano novo cheio de sonhos e realizações para todos. Até o nosso próximo encontro se Deus quiser!
Bom dia Planeta! Hoje nós vamos falar um pouco sobre a importância das avenidas, ruas e vias públicas em nossas vidas. Mas, vamos falar com um outro olhar. Não como apenas passante, mas como elemento afetivo, de grande emoção, de grande valia em nossas vidas.
Que sentimento você vive diante de certas vias em que passa, mora, trabalha, estuda? Esse exercício também pode se dá viajando no passado. Que sentimento você trás em sua memória existencial sobre ruas ou avenidas que percorreu? Onde morou? Onde estudou? Onde trabalhou? Quais as memórias afetivas? Os amores vividos? Os traumas? As partidas? Os retornos? As ausências? Os acidentes? O exercício também acontece com projeções no futuro, como por exemplo: Qual o endereço de seus sonhos? Onde você pretende morar quando casar? Etc.
Há uma avenida, por exemplo, na minha cidade, chamada Maria Dolores. Quantas dores vagueiam numa via pública chamada Maria Dolores? Existem logradouros na cidade que são de grandes sofrimentos para algumas pessoas. Moradores de ruas, vítimas de acidentes de trânsito, pessoas que perderam seus namorados, entes queridos, vítimas de assaltos, perdas de veículos, entre outros fatos. Muitas destas pessoas preferem inclusive nem passar nestas vias, pois de fato alimentam memórias de traumas profundos em suas jornadas existenciais.
Lembro do caso de um partilhante falar sobre um acidente de trânsito, fato que envolveu sua bisavó. Ele, ainda menino, testemunhou tudo. E desde então procura evitar passar nesta região. Foi sua melhor forma de sair dessa dor. Outras pessoas adotam posturas diferentes. Assumem os riscos de encontros com suas tragédias ou fatos desagradáveis vividos na via. Na verdade, cada pessoa tem sua forma muito especial de encontrar suas saídas diante de cenários como esses.
Existem, por outro lado, memórias felizes sobre os logradouros. Algumas pessoas vão sentir saudade da casa onde viveu com seus pais, outras das casas dos amigos que visitava para brincar, assistir um filme, tomar um lanche, jogar uma bola. Outras pessoas lembraram com carinho do endereço do colégio que frequentou, a faculdade, a casa da namorada. Outras pessoas sentem saudade dos locais onde trabalhavam. Há uma série de possibilidades.
Olha, na Filosofia, esse é um importante exercício espiritual e existencial que lhe ensina a ler, a dialogar e a viver de forma mais intensa com o lugar que lhe apresenta. Como é isso para você? Aqui para a Filosofia, a rua ou avenida nunca será apenas um elemento da mobilidade, mas uma construção maior, mais ampla, de empatia, respeito e acolhimento das pessoas, suas dores, alegrias e historicidades com o objetivo de provocar o despertar de uma humanidade – dentro do espírito de uma cidade e seus cidadãos.
Para fechar, os versos da linda composição Avenida 10 – do cantor e compositor Babal.
AVENIDA 10 Desde o tempo de menino eu brincava Com ar de sonhador Conheci a natureza Beijando meus pés O movimento da vila da rua O ronco do tambor Em todos os arredores
Da avenida 10 Os guaranis festejando a paz O guerreiro bumbum Éramos todos devotos Meninos fiéis Quando não era possível ter sonho A gente tinha um E ele girava em torno
Da Avenida 10
O movimento do parque O jogo de bola na lama A bandeirinha é o poste Bom barquinho eu quero passar A lata no carnaval Pra nós tudo aquilo era a vida Em meio aquela alegria
A bagunça saía a tocar
Minha casa bananeira o jardim Os meus amigos, eu, Quinho, Bonfim, Nelson, Neguinho e Moisés, Galvão, Fernando, João e Omar Todos irmãos Eris Hoje nós somos saudades
Da Avenida 10
Bem, é isso! Até o nosso próximo encontro se Deus quiser!
Bom dia Planeta!!! Interessante observar como, aos poucos, com a naturalidade de tantas pandemias, as pessoas começam novamente a viver suas rotinas, dentro de mundinhos divididos, onde permanecem a vontade dos mais fortes.
Há, entretanto, entre esses a velha fórmula da organização de grupos para chegar ao poder e partilhar suas riquezas entre os amigos. É a criação de partidos, grupos, quadrilhas que se organizam e se você não está neste ou naquele grupo, realidade da grande maioria, logo tende a viver com carências e dificuldades de toda as ordem.
Aliás, essa parece ser a única coisa relevante que o sistema de dominação leva em consideração com relação a você. Você é o oprimido e, mesmo que você saiba, continuará sendo, pois você já internalizou isso e acredita que nada vai mudar, que isso é assim mesmo.
E neste cenário, por mais que eu queira conversar com você, eu talvez não possa. Não estou no seu grupo, também não estou no grupo do outro e muito menos daqueles outros. Então, o mundo inteiro parece ser essa guerra armada de identidade de grupo contra a identidade de outro grupo e a ordem é silenciar as pessoas que não concordam com você. Afinal, por que você deveria deixar elas falarem?
E isso não é acidental. Não é também somente porque eles têm medo de você - apesar que é por causa disso igualmente. Eles usurpam a compaixão. Eles transformam qualquer um que apresente uma visão alternativa em um terrorista de ideias, um alienado, um louco. O que é uma saída muito inteligente. Uma ótima estratégia para silenciar o outro. Afinal, quem quer ser taxado como intolerante?
Provavelmente você acaba também pensando que é intolerante como todo mundo mais. Sabe, é fácil as pessoas se sentirem culpadas sobre isso.
De qualquer forma, o que está acontecendo? O que você faz aqui enquanto isso acontece? O que você faz quanto a isso?
Sinceramente, eu não sei o que você pensa sobre isso. Não tenho a mínima ideia. Talvez eu tenha apenas uma teoria sobre tudo isso. É isso, uma teoria. Esse parece ser um dos problemas com o pós-modernismo. E esse é um grande problema - um problema fatal, além do fato que é incoerente e não tem valor estrutural para uma sociedade organizada. Pelo contrário, é fundamentalmente divisivo e destrutivo.
De fato, eu sou o oprimido e talvez eu até mesmo esteja lhe oprimindo já que você é parte deste outro grupo marginalizado. Mas, pelo menos nós compartilhamos a opressão. Aqui está o outro grande problema. Na verdade, um grande problema. E colocamos toda essa maldita opressão no preço das coisas e de nós mesmos. Quanto custa uma vida? Quanto vale uma vida? O sistema dominante coloca a sua opressão à disposição para pagar um preço por isso. E essa é uma solução ruim, desumana. Sabe por quê? Porque 10% de alguns terão uma vida muito bacana, outros 10% estão no poder e outros nesta fração irão acumular riquezas. E nós, todos os outros, a grande maioria, continuaremos a acreditar que os nossos "fracassos", as nossas dificuldades são construídas por nossa própria incapacidade de sair deste cenário. Será?
Bem é isso. Até o nosso próprio encontro se Deus quiser!
Sobre o tempo, movimentos e frequências existenciais
23/08/2021
Bom dia Planeta! No nosso encontro anterior falamos sobre o passado, entes queridos que não estão fisicamente entre nós, mas estão presentes. Hoje vamos continuar percorrendo esses caminhos que nos levam a pensar sobre o passado, o presente e o futuro. Algumas vezes sentimos que este passado é tão presente, outras vezes sentimos que o futuro é tão passado e muitas outras vezes não estamos presentes em nosso próprio presente – é como no filme que assistimos passar e não temos o controle dos nossos personagens nas narrativas.
Eu ando muito. Visito lugares, entro em edifícios, castelos, fortes, palácios, casas pequenas, apartamentos grandes, visito praças públicas, ruas, avenidas que nunca passei anteriormente – às vezes dentro da cidade onde moro outrora em cidades para onde viajo. Não sei como explicar, mas em alguns destes lugares tenho a impressão que já estive antes.
Não sei porque me sinto assim (...) Eu acho que já estive aqui ou eu acho que já sonhei com esse lugar (…) Alguém que não viveu esse momento? Esse lugar no passado, estranho, parece agora recordar o próprio lugar onde nunca tinha caminhado antes.
Eu acho que já tinha seguido por essa escada no palácio, eu acho que já vi esse rosto, vi esse quarto, estive neste lugar. É uma espécie de vivência novamente de algo que nunca vivi. Em minha mente há uma ideia estranha de que talvez o meu destino - as minhas expectativas e a minha esperança - esteja lá no passado. Então, o que seria o passado? O presente? O futuro? Compreende?
Eu simplesmente não tenho essas respostas. Apenas sinto minha mente, minha consciência, transitar simultaneamente nestes tempos, espaços. Talvez essas respostas teriam alguma ligação com os sonhos, as memórias de obras contempladas, os poemas, as composições, os filmes, etc, que assisti ou os sonhos que sonhei? E se o real é também um sonho? Como ficaremos?
Não sei se acontece com você sob outro olhar (…) Acho que já escutei essa voz, acho que já ouvi essa canção, tenho uma lembrança que já estive nesse lugar (…) Acho que já disse essas palavras antes. Essa é uma nova “realidade”? Eu estou perdendo a lucidez? Eu sonho por que estou vivo? Eu vivo por que estou sonhando?
Vivo essa estranha sensação. Nada que eu contemple parece estar de fato no presente. Mas, também não está no meu presente ou no futuro. Tudo parece apenas viver dentro da minha cabeça, da minha memória, dos meus pensamentos, na minha consciência ou no subconsciente. Preciso ficar longe destas correntezas existenciais. Neste paradoxo, irônico e trágico, o tempo está passando. Aliás, será que o tempo está passando? Não vivemos numa existência paralela? Uma existência que não depende de tempo, espaço, etc?
Bem (...) é isso partilhante. Até o nosso próximo encontro se Deus quiser!
Morangos com Chapati - o que é mesmo o passado aqui?
27/07/2021
Bom dia Planeta! Em algumas regiões da Terra estamos celebrando a chegada do Inverno. Nesta estação, gosto de ficar em casa, curtindo as memórias e experimentando antigas receitas preparadas em fornos à lenha ao longo dos caminhos existenciais que vivi.
Aqui, em tela, apresento uma receita muito especial criada por minha avó Maria Geni: Chapati com Morangos!
Ela costumava preparar esta refeição à base de farinha de trigo e água para alimentar os três netos que criava na vida com muito sacrifício.
Lembro que eram dias difíceis, complexos, de dinheiro curto. Adorava acordar ainda pela madrugada para escutar suas conversas com meu avô sobre as dificuldades do cotidiano. Aquilo, de certa forma, passava mais segurança. Pois, de fato, sabia que eles iriam resolver.
Hoje, refletindo sobre tudo isso, fico a questionar comigo mesmo:
- O que é mesmo o passado aqui? O que de fato passou (...) se tudo isso ainda está tão vivo dentro de mim?
Se recordar é viver, acredite, isso não tem qualquer relação com a razão. São fragmentos vivos, vidas, momentos imortalizados pelo coração.
É claro que cada partilhante terá uma forma muito especial de viver essa experiência. Algumas pessoas irão atingir esses níveis de percepção em suas vidas por meio de um cheiro, um perfume, uma rosa. Outras irão caminhar pelas ruas da infância, acessando traquinagens, jogos de queimada, futebol, paqueras. Outras seguirão suas memórias afetivas por meio da sintonia com a arte, a poesia, o cinema, a pintura, a escultura e a música.
Há uma série infinita de possibilidades neste exercício existencial. E aqui recordo uma linda composição dos poetas Dado Villa Lobos e Renato Russo - cantada numa bela canção da Legião Urbana: Vento no Litoral (...)
De tarde quero descansar
Chegar até a praia e ver
Se o vento ainda está forte
Vai ser bom subir nas pedras
Sei que faço isso pra esquecer
Eu deixo a onda me acertar
E o vento vai levando tudo embora (...)
Agora está tão longe
Ver a linha do horizonte me distrai
Dos nossos planos é que tenho mais saudade
Quando olhávamos juntos na mesma direção
Aonde está você agora
Além de aqui dentro de mim?(...)
Há, por outro lado, pessoas tão especiais ao nosso lado, no mesmo espaço geográfico em que estamos vivendo, mas que parecem tão distantes na frequência do pensamento e no tempo. Como tem sido essa experiência para você?
O que é passado aqui? O que é presente? Retomo os questionamentos. Qual a história de vida que você traz dentro de seu coração?
Bem é isso! Até nosso próximo encontro se Deus quiser!
Bom dia Planeta! Sentado em um café, seguindo todos os protocolos de biossegurança, observo do outro lado do salão, uma mesa composta por velhos amigos que questionam sobre a ideia de felicidade em tempos de pandemia:
- O que te fará feliz, João?
- Creio que a possibilidade de tomar essa vacina e vencer a Covid-19.
O papo segue e fico a refletir sobre o sentido de felicidade, alegria, entre outros temas diante de um mundo com um manancial infinito de possibilidades, dentro, é claro, da visão de cada pessoa. Cada indivíduo tem uma experiência muito própria com o tema em tela.
Há entretanto algumas considerações que devemos fazer entre os sentidos de felicidade e alegria. A primeira condição diz respeito a qualidade ou estado de felicidade, uma consciência plena e satisfeita, bem-estar. A segunda condição se relaciona com o gozo, o prazer, o contentamento diante de um acontecimento feliz.
Vamos para algumas analogias que podem ajudar a entender melhor os dois sentidos e, assim, evitar uma espécie de ilusão de foco na hora de visualizar um cenário para responder o questionamento no café, entre amigos.
Ex.: 1 – Se você perguntar para um recém-formado candidato a um estágio no mundo corporativo sobre o que lhe fará feliz, ele responderá que será sua efetivação como estagiário. A mesma questão tem um outro sentido para um outro estagiário efetivado no último semestre e que deseja agora um contrato de funcionário da empresa.
Ex.: - Para algumas pessoas a sexta-feira parece ser o dia perfeito para alcançar a ideia que tem sobre “felicidade”. A sexta possibilitará a perspectiva do fim de semana. Outros que não gostam muito do fim de semana, sofrem tédios. Outros poderão sofrer com a chegada do domingo por anteceder a segunda-feira. E outros mais ficarão alegres com a possibilidade de retomarem às suas atividades na segunda-feira.
Ilusão de foco? Sim. O cérebro induz a pessoa a acreditar que somente será feliz com aquilo que lhe falta. E para tanto, a pessoa esquece de viver uma vida plena no presente. E não ter tempo para viver no presente com as opções que temos é perder um tempo precioso de vida.
Retomando os exemplos anteriores, uma série de eventos, acontecimentos poderão também contribuir para o esvaziamento das perspectivas postas. O estágio poderá acontecer, mas o contrato definitivo não. O calor poderá atrapalhar o chocolate quente com os amigos no final da tarde de sábado e o domingo que prometia céu aberto amanheceu debaixo de uma tempestade.
Compreende? Assim quanto mais tempo retardar essa resposta, mas você estará preparado para fazer do limão a limonada e enfrentar cenários adversos em favoráveis. O chocolate quente que não foi tomado no sábado, pode ser consumido no domingo. E o sábado de sol, pode virar o melhor momento para chegar até a enseada.
Manter o otimismo mesmo diante destas e outras possibilidades também não fará mal. Por outro lado, não devemos ser ingênuos como aquele jogador que aposta tudo que dispõe numa única carta. E assim, consequentemente, a perda ou decepção será menor, assim como a tristeza.
É usual, portanto, que façamos uma análise de todos os nossos movimentos em busca do que desejamos – ainda que no outro dia a meta seja apenas conseguir um lugar na sombra de um guarda sol na praia. Estudar demais todos os cenários para tomar uma decisão pode nos levar para as chamadas “sub-ótimas escolhas”, as chamadas alternativas à Coca-Cola. Sabe aquele máxima de que “quem muito escolhe, acaba ficando com o refrigerante cola concorrente”?
Então, a ideia é encontrar neste pensamento, no íntimo de nossa condição existencial, um chão de reconhecimento que estamos pisando na felicidade e não conseguimos enxergar. A consciência desta máxima poderá evitar o aparecimento dos dados brutos que adiam para o amanhã a ideia que acreditamos ser a melhor resposta para o questionamento posto nesta introdução.
Viver momentos alegres e tristes nada tem haver com a felicidade ou a infelicidade. Enxergar esses momentos como processos comuns, dentro da nossa jornada existencial, tornará nossos caminhos mais leves e consequentemente nos levará para um entendimento, uma lucidez e, assim, a um melhor tratamento destes pontos cegos na alma, na mente, no cérebro que insistem em nos levar ao engano de não contemplar e mergulhar no pleno viver.
Bom dia Planeta! Vou pedir permissão a você, partilhante, para fechar esse mês falando algumas considerações sobre essa citação, essa imagem que se constroi e que está sendo plantada com outros saberes nos principais canteiros da cidade, dentro da campanha internacional Maio Amarelo de combate à violência no trânsito. O tema deste ano trata da construção “Respeito e Responsabilidade: Pratique no Trânsito... Pratique na Vida.”
Quando iniciamos nossa jornada na escola aprendemos a conceituar os seres, as criaturas e os objetos pela filosofia dos números inteiros. Então, denominamos os elementos como sendo o 1, o 2, a casinha, o patinho, o gatinho por inteiros. Posteriormente, vamos conhecendo os elementos éticos, estéticos. O certo, o errado, o belo e o feio, noções de esquerda e direita, entre outras construções pedagógicas que nos alfabetizam e desenvolvem em cada um os gostos e as atitudes. É verdade que são noções primeiras, limitadas de certo ou errado – assim como foi no início a ideia do desenvolvimento da lógica nos programas de computadores (0 ou 1).
Acontece que a vida é mais do que a ideia inicial destes elementos. No ensino médio, por exemplo, começamos a examinar e a viver valores mais complexos ligados, por exemplo, a raiz quadrada, as equações envolvendo números e letras (2x+4y = 6), temos também os números quebrados, decimais e que não são inteiros (1,23...2,27...), tem ainda os negativos, aqueles números menores que zero (-1, -2,-3...), e há ainda uma infinidade de outras combinações e elementos que formam essa miscelânea e que são fundamentais para que toda essa complexidade funcione harmoniosamente.
Depois de sair da escola, muitas pessoas preferem deixar isso bem longe de suas práticas na vida. Outras irão usar como recursos em suas áreas profissionais, nos bancos, em laboratórios de física, química, na engenharia, arquitetura, na medicina, na vivência do magistério. E outras mais não terão a mínima ideia de sua utilidade.
Gosto de usar essa analogia para fundamentar o título desta conversa e o projeto que ofereci ao Executivo municipal. Perceba que a vida é constituída por um pouquinho disso tudo. Não somos só inteiros, mas também não somos somente fragmentados. Há uma infinidade de possibilidades que formam toda a complexidade desta vivência.
Vamos a alguns exemplos práticos disso. Se a gente considerar a família. Toda historicidade ao longo da construção de uma família. Primeiramente, teremos a formação do casal (gêneros distintos ou não), depois aparecem os filhos, os netos, os agregados que vão se encostando e acabam ficando. Tem também os gatinhos, os cachorrinhos que a gente não sabe ainda como classificá-los no grau de parentesco, mas que estão na família e são de fundamental importância para saúde e bem-estar de todos.
Um outro exemplo: o trabalho. É impressionante a diversidade dos saberes e das funções empregadas pelas pessoas. Tudo funcionando harmoniosamente para construir a excelência de um produto, de um serviço. Essa complexidade se desdobra em várias funções que são fundamentais para o sucesso da empresa e da corporação.
Vamos considerar um outro exemplo: o do trânsito. Na via pública, não está somente a autoridade de trânsito, temos o condutor do carro, o motorista do ônibus. Temos ainda o motociclista, o ciclista, o pedestre, o skatista. Tem também o gatinho, o cachorro, o cavalinho e uma infinidade de outras criaturas que se movimentam ao longo do passeio e que são invisíveis à percepção de certas pessoas e criaturas. Todavia cada uma cumpre sua missão de extrema importância no funcionamento deste sistema. O motociclista irá deixar o almoço do condutor do veículo no local do trabalho. O condutor vai remunerar o motociclista. O ciclista prestará serviço para o pedestre levando mantimentos da padaria até sua residência. O pedestre retribuirá o ciclista. E assim a vida segue na cidade, na sociedade, no planeta.
Não há um ator principal nestes exemplos. Todos são importantes. Essas mesclas, essas misturas, que chamamos de diversidade, portanto, precisam ser respeitadas em suas singularidades e possuem também uma responsabilidade de grande monta, aliás, de fundamental importância para manutenção de um sistema saudável e harmonioso na via pública, no trânsito e na vida como ela é. Portanto, o respeito à diversidade e a responsabilidade com cada um devem ser praticados permanentemente tanto no trânsito e na vida. Respeitar essa diversidade é sinônimo de crescimento em humanidade e evolução numa ética planetária e cósmica.
Um elemento que causa indagações é a exposição de edifícios e prédios antigos mutilados nos centros históricos das cidades. Será essa a forma mais completa e perfeita com que podem chegar até nós?
Como filósofo clínico, nos diálogos que realizo por videoconferência nas escolas, institutos, faculdades, universidades e no mundo corporativo, procuro transferir essa imagem para a singularidade de cada partilhante.
Uso o exemplo das velhas edificações, algumas abandonadas, para provocar com alguns questionamentos:
E sua historicidade humana? Como você tem cuidado da sua poesia existencial? O que ficou no caminho? O que se apresenta desta história no seu presente? Qual o impacto desta construção no seu futuro? O que é passado para você?
Interessante neste exercício para o filósofo clínico e o partilhante não é observar somente os aspectos externos do edifício humano que nos apresenta, mas suas narrativas, seus elementos do pensamento. Alguns partilhantes, apesar de décadas de existências, conservaram bem a sua historicidade. Outros, apesar da breve existência, se perderam em caminhos da vida. Outros mais, diante de traumas vividos, preferiram esquecer o que foram e trilharam outras veredas.
Cada partilhante, enfim, tem sua maneira de cuidar da sua poesia existencial assim como a forma de contar sua história tão singular. E todas essas particularidades, singularidades são de um valor imensurável e devem ser respeitadas.
Retornando ao início de nossa história, há na arqueologia todo um trabalho para se conhecer a historicidade de cada construção encontrada em sítios históricos. Mesmo que algumas construções apresentem “mutilações físicas” visíveis ao longo do tempo, elas terão um valor imensurável para história de um povo, de uma raça, de um país – quando restauradas, ou não, e postas à mostra para contemplação.
Hoje nos encontramos como aquele edifício em ruínas no centro histórico de alguma cidade. É, portanto, urgente a necessidade de restaurar a dignidade de sua edificação humana, ampliar sua visão, sua percepção e o seu real valor na Terra e no Cosmo. É imprescindível salvar o homem da sua desumanização. A guerra que enfrentamos ao longo dos séculos, da nossa historicidade, contra as nossas misérias e enfermidades existenciais somente será ganha quando um dia voltarmos a nos sentir humanos. E será que fomos, de fato, humanos algum dia?
Bem, é isso! Todo esse cenário de guerra, mutilações, peste e miséria não vai nos proibir de pensar, repensar nossa historicidade e lutar por um mundo mais solidário, fraterno e humano. Até o nosso próximo encontro se Deus quiser!!!
Sobre a pandemia, cachorros e fragmentos de Schopenhauer
27/03/2021
Bom dia Planeta! A Pandemia do Covid-19 tem nos oferecido a experiência mais severa do vazio humano e sua existência tão frágil. Tem sido muito difícil para as pessoas manterem suas rotinas e construções sobre uma base de caos, sofrimento e morte. Sinto o sofrimento de milhões de seres humanos e ao mesmo tempo a esperança que tudo vai mudar para melhor em algum dia.
Enquanto isso, aconselho a todos a se manterem vivos, lutando pelos seus ideais. Lembro, nestes breves fragmentos não pessimistas, do filósofo alemão Arthur Schopenhauer. Autor de importantes obras, entre elas “O mundo como vontade e representação”, em que ele caracteriza o mundo fenomenal como o produto de uma cega, insaciável e maligna vontade metafísica. Ao final de sua vida, o pensador alemão trouxe alguns apontamentos sobre uma série de temas que parecem bem atuais no mundo contemporâneo. O filósofo enfrentou muitas dificuldades e manteve-se sereno diante de um mundo de aparências corrompidas. Para ele, o mundo tal como nós entendemos é uma representação. Para cada um de nós esse mundo terá uma aparência e ainda que cada um de nós o perceba de uma forma, não podemos deduzir o mundo e toda sua existência. Provavelmente há muito mais para além disso.
Numa outra passagem de sua construção filosófica, Schopenhauer escreve sobre a verdadeira fonte do medo da morte como podemos conferir abaixo:
- O grande apego à vida, ou antes o medo da morte, de modo algum origina-se do conhecimento, que neste caso seria o resultado do reconhecimento do valor da vida; mas, em vez disso, o medo da morte enraiza-se diretamente na vontade, provém de sua essência originária, que é desprovida de conhecimento e, por conseguinte, cega vontade de vida. Assim como somos seduzidos pela vida devido ao impulso ilusório da volúpia, do mesmo modo agarramo-nos à vida pelo medo, também por certo ilusório, da morte. Ambos se originam de modo imediato da vontade, que é em si desprovida de conhecimento. (W II, cap. 41, 595).
Há outro fragmento, na obra do pensador que gostaria de destacar nesta conversa é quando ele fala no Estado. Vamos à sua construção:
- O Estado não é mais do que uma mordaça cujo fim é tornar inofensivo o animal carnívoro que é o homem. O homem, no íntimo, é um animal selvagem, uma fera. Só o conhecemos neste estado domado e que chamamos de civilizado. Por isso ficamos assustados ante a explosão de seu temperamento.
E, mais além, ele continua:
- A organização da sociedade humana oscila como um pêndulo entre dois polos. De um lado o desportivo, do outro a anarquia. Quanto mais se afasta de um mais se aproxima do outro. Surge, então, o pensamento que o justo, o meio, seria o ideal para todos – que erro! Esses dois males não são exatamente os mais nocivos e perigosos. O primeiro é menos para recear, pois, de fato, os golpes dos desportivos só existem no estado de possibilidade. Quando se converte em ato só atinge um homem entre milhares dele. Já a anarquia não. Possibilidade e realidade são inseparáveis. Os golpes da anarquia ferem cada cidadão. Nós não temos aqui exatamente o melhor. Mas, há algumas escolhas entre as piores. A obediência a lei, as normas seria, portanto, menos ruim.
Chegamos aqui ao grande dilema em que vivemos no mundo contemporâneo diante da pandemia. Uma anarquia. Cada país, cada governo dentro de cada país, define seus próprios protocolos de sobrevivência baseados em narrativas que alienam seus governados como grandes rebanhos a caminho do matadouro.Pensar que Bonaparte, Hitler e tantos outros assassinos são os únicos maus entre nós não é necessariamente um pensamento correto. Estes que nos governam são tão cruéis quanto eles.
São como dizia Schopenhauer:
- Cavaleiros mascarados sob os quais se escondem os mais selvagens e gananciosos seres. Um a afivelar a máscara da justiça e do direito para gerir melhor seu semelhante; o outro, com o mesmo fim, escolheu a máscara do bem público; o outro da religião; e tem outros que se ocupam da filosofia, da filantropia, etc.
Quanto a amizade o pensador também foi duro. A amizade para ele era uma fraude recheada de interesses egoístas e falsidades. O único que ele considerava amigo era o cachorro. Para ele nós deveríamos ser mais cachorros, menos humanos.
- Os cães realmente sabem o que é uma amizade, o que é ser transparente.
E diante deste caos que se tornou a vida na Terra, Schopenhauer propõe:
- Nem amar, nem odiar é a metade da sabedoria humana. A outra metade da sabedoria humana diz respeito a nada a dizer e nada a crer. O homem sábio é tolerante com os outros porque na verdade ele sabe que os outros são ignorantes e selvagens. Não seria também o próprio homem sábio essa fraude? E contrariar esse outro tão cheio do saber seria colocar em risco a própria vida? Bem, essa é uma longa construção. Poderemos retomar aqui em outro momento. Quem sabe depois da pandemia. O que acham? A tarefa de hoje é viver heroicamente até morrer. Lutar contra a pandemia e a ignorância não através do abandono da vida, mas como uma forma heroica contra o inimigo. E neste sentido, a maior arma que temos contra o nosso adversário, o genocídio e a barbárie dos governos é ficar em casa. Ficar em casa neste momento da guerra é um ato de extrema coragem e lucidez. A casa, enquanto nossa consciência, é - no momento - a nossa maior trincheira existencial contra o inimigo. Até o nosso próximo encontro, se Deus quiser.
É possível construir uma linguagem para definir a realidade?
26/02/2021
A linguagem permeia toda nossa existência. Pela linguagem nos definimos, nos constituímos. Através da linguagem se estabelece as relações de afetos, de poder, de desejo.
Mas, será que toda a gramática de uma língua seria suficiente para traduzir a complexa realidade do mundo em que vivemos? Esta inquietude, esta tensão entre o que é real e o que a linguagem tenta capturar do real é questão fundamental para nós que estudamos a filosofia.
De fato, a linguagem parece insuficiente para definir o real. O real a gente não sabe onde começa, do que ele é feito e onde termina. Muitas vezes a gente quer dizer uma coisa e acaba dizendo outra. A gente começa uma frase e, de repente, muda o pensamento no meio do caminho. A gente queria dizer algo e o outro entende completamente diferente.
Se a gente soubesse usar a linguagem – o pensamento – muitos de nossos conflitos seriam pacificados. Você acha que domina a linguagem. Mas parece ser a linguagem que domina você. A linguagem tem regras, leis. A linguagem lhe impõe uma série de coisas que você nem percebe.
Quando chegamos neste mundo entramos numa espécie de conversa que já está em curso e somos obrigados a falar a língua daqueles que nos cerca. A gente se torna um sujeito a partir da linguagem e da relação com o outro. A gente não se cria como um indivíduo autônomo que aprende com a própria consciência.
A primeira máxima disso tudo é que não somos indivíduos (aquilo que não se divide). Nós somos divididos. Somos divididos por nossa relação de fala e escuta, por nossas relações de escrita e leitura, de discurso e por tudo aquilo que vem junto com a linguagem. A gente não percebe isso porque nossa relação na linguagem é uma condição de alienação. Nós estamos alienados na linguagem.
Vivemos como peixes dentro de um aquário e que não nos damos conta que existe uma coisa chamada água. Por que, então, estamos tão envolvidos nestas coisas que determinam os nossos limites geográficos, filosóficos, teológicos, políticos, etc – sem que ao mesmo tempo a gente perceba que está acontecendo?
Seria, portanto, toda essência do homem – enquanto corpo e mente – vazia ou construída pela falta de uma consciência própria, individual? Nossa consciência é dada pelo que não temos? A consciência coletiva que nos governa? O que eu desejo é o que o outro deseja: dinheiro, carro, sucesso, casa bonita na praia, etc?
E neste sentido, o que é o real? O que é isto que está acontecendo diante dos nossos olhos? É possível construir uma linguagem própria para o real? O que precisamos buscar? Romper com os sentidos prontos? Buscar a livre expressão do inconsciente, do lírico, do poético, do absurdo, do inédito?
Bem é isso. Um abraço em todos e até nosso próximo encontro se Deus quiser!
Bom dia Planeta!!! Lendo as notícias que nos chegam sobre o início do processo de vacinação contra a pandemia do Covid-19 em todo mundo nos chegam fragmentos de pensamentos sobre quem de fato tem prioridade em tomar o fármaco e quem não tem. O que é justo? O que é injusto neste processo?
Primeiro é preciso desdobrar a ideia de justiça, o conceito. E, talvez, ao fazê-lo nos daremos conta de que essa palavra que acreditamos conhecer abre problemas, questões difíceis, complexas e que nem suspeitamos.
Eu penso que muitos de vocês estariam de acordo em afirmar que a ideia do que é justo é o que está de acordo com a Justiça. Porém, apresenta-se de imediato uma pequena dificuldade de linguagem. Quando falamos em Justiça pensamos nos fóruns, nos tribunais, nos juízes, nos processos. Mas, essa Justiça não é a qualidade do que é justo. É a instituição que aplica a Lei.
Será que a Lei é sempre justa? Todos vocês estão prestes a dizer que não. Mesmo que não tenhamos nenhum exemplo a narrar sobre isso. O fato é que nós desconfiamos da Lei plenamente. Entendemos que a Lei não é necessariamente justa e que, portanto, cada um de nós pode decidir não seguir a Lei porque considera que ela não é justa. Aqui começa outra questão.
Se compreendermos bem que a palavra Lei, por si mesma, nem sempre é justa é porque temos uma ideia do que é justo, uma ideia de Justiça além da Lei. Talvez uma Justiça para a qual nem possa haver uma Lei. A ideia de um dever moral. Quem sabe?
Sabemos, por exemplo, que é justo dividir um bolo em partes iguais para todos. Entretanto, seria justo partilhar a mesma proporção com alguém deste coletivo que sofre de diabetes? A ideia de justo, de Justiça, portanto, vai muito além disso. E cada um de nós tem dentro de si essa noção.
O que encontramos ao final dessa reflexão? Todos nós sabemos que é justo dar a cada um o que lhe é devido. Mas, essa ideia de Justiça é tão antiga e injusta como a própria injustiça. Dar a cada um o que é lhe devido é antes de mais nada fazer coexistir dois princípios. Um princípio de Igualdade (onde cada um é considerado como todos os outros) e um princípio de Singularidade (o que é próprio de cada um). Ora, na medida em que cada ser é único, igualdade e singularidade são inseparáveis na ideia de Justiça e ao mesmo tempo podem entrar em contradição, mas não em conflito.
Isso nos ensina uma outra coisa muito importante. O justo e o injusto se definem sempre em relação aos outros e a minha pessoa. Isso significa que não pode haver Justiça apenas para um de nós. Não faria sentido. A Justiça, portanto, só existe em relação ao outro. E neste sentido pode-se facilmente distinguir alguns elementos do que é devido a cada um. Todos têm o direito de viver, de estudar, de trabalhar, de tomar a vacina, etc. Mas, o que fazer quando não temos os mecanismos para atender a todos ao mesmo tempo? Essa é outra questão complexa.
Não temos como vacinar todo mundo ao mesmo tempo. Cabe aqui uma ideia de ajuste na justiça. Mas o que é que será ajustado? Qual é a saída mais justa? Encontrar os grupos de maiores risco, idosos, profissionais da saúde, etc? Isso é o que por hora temos em nossas consciências? Mas, como fica, então, a ideia de que todas as vidas importam?
Bem, um dia a Lei poderá chegar bem perto da Justiça. Mas sempre vai precisar de ajustes. Por isso ela será sempre atualizada. Nós vivemos uma época na qual essas questões de Justiça, de Lei, estão vigentes porque estamos em um nível da humanidade que ainda precisa de coisas assim tal qual precisa de cadeias, hospitais psiquiátricos, instituições que, talvez, em futuro próximo não mais existirão a ponto da gente nem mais precisar falar de Justiça, Leis, bom, mal, justo e injusto.
Mas, enquanto essa era não chega, no limite de tudo isso, só há uma coisa devido a cada um. E isso que é devido a cada vida humana na Terra é o que chamamos de amor. Não somente o amor das histórias sentimentais e românticas. Mas, o amor em seu sentido mais amplo, mas profundo, o amor enquanto reconhecimento infinito do valor imensurável de cada vida.
Para fechar nosso encontro, vocês devem pensar sobre tudo isso que falamos por vocês mesmos. Jamais haverá alguém para dizer: eis aqui o que é Justiça Absoluta!!! Um abraço em todos, em todas e até o nosso próximo encontro, se Deus quiser!
Bom dia Planeta!!! Nestas breves palavras que escreveremos aqui procuraremos fazer um fechamento do que vivenciamos todos nós neste período de muitas dificuldades e também de oportunidades e experiências de grande valia para a humanidade.
Terminamos o ano vivos? Terminamos o ano mortos? De fato, estamos todos mortos para o que passou? Estaremos vivos para o que virá? A proposta do período da Natividade é justamente essa: - a de um nascimento para uma vida nova e a morte, a renúncia para aquilo que fora em outro momento uma outra existência.
A filosofia nos abre essa janela que decorre de todo nascer e morrer, recriar o homem, o meio, e o faz assumir uma outra condição, “que não é a alternativa vida ou morte, mas uma totalidade: vida e morte num único instante de incandescência”. (Octavio Paz in “O Arco e Lira”).
A nossa leitura clássica do que chamamos realidade necessita de novos incrementos, novos elementos. De fato, se queremos ultrapassar alguns problemas, se queremos prosseguir além de várias peculiaridades que neste momento fazem pesar cada vez mais a existência, é necessário que compreendamos uma espécie de Gramática com a qual conseguiremos ler com mais precisão as coisas da vida, o universo e a própria vida.
E essa Gramática agora nos pede melhorias e aprofundamentos importantes. Devemos estar preparados para descobrir que a estrutura da matéria viva funciona de uma outra forma que não pode ser reduzida as “leis comuns” que aparentemente conhecemos (física, biológica, filosófica, etc.). Não temos mais como tratar com os “saberes” que achamos conhecer as doenças físicas, existenciais dos organismos sociais, humanos e do meio a qual estamos inseridos. Somos organismo dentro de organismos, em dimensões infinitamente maiores do que imagina nossa própria filosofia em tudo aquilo que chamamos de Universo.
Bem, o que fazer então? Eu não tenho uma resposta. Todavia, creio que necessitamos de instrumentais para fazer tudo isso funcionar de uma outra maneira, de uma outra forma. Pois, a coletânea das peças que usamos outrora já não funciona harmoniosamente como outrora operava no motor, aliás nunca funcionou bem pelo menos entre nós aqui na Terra.
Necessitamos ordenar a vida de uma outra forma, dentro de nossa organização social e as demais organizações que envolvem outros organismos no planeta e no Cosmo como protocolo que nos leve a quebrar esse ciclo vicioso existencial que está nos levando para caminhos insustentáveis.
Para resumir, estávamos acostumados a pensar o mundo a partir das nossas experiências cotidianas, depois a partir das experimentações físicas, biológicas, intelectuais, etc. Só que essas derivações começam a se tornar cada vez mais precárias diante das nossas incertezas. É fato de que algo está acontecendo e eu não sei o que é isso. E que, portanto, essa breve síntese que tentei construir aqui também é precária e foi apenas uma maneira de ilustrar aquilo que estou enfrentando como pensador e filósofo. Que Gramática usaremos em neste Novo Tempo?
Um Natal bem feliz para todos e todas e um Novo Ano Inspirador!
Bom dia Planeta! Hoje vamos conversar sobre a ideia de quem é o meu próximo. Olha, quando a gente considera quem é o próximo da gente, o pensamento pode nos levar diretamente para as pessoas mais necessitadas, carentes, sem recursos e que estão nas ruas dependendo muito de nossas boas ações para sobreviverem.
Há também neste olhar um pensamento voltado para questões mais profundas da alma como a lembrança dos nossos queridos familiares e amigos que partiram ou aqueles que estão vivos e que convivemos diariamente em nossos locais de trabalho, de estudos e encontros.
Outras pessoas tem como o próximo o seu jardim, um cachorrinho, uma velha caminhoneta à diesel, aquela mochila antiga companheira de tantas viagens e lembranças inesquecíveis – algumas felizes, outras nem por isso. Mas que tiveram e tem um enorme significado em nossas vidas.
Há pessoas que consideram o próximo outras pessoas e outras pessoas que consideram o próximo um gatinho de estimação, um passarinho, uma plantinha. São diferentes olhares e todos tem um significado muito importante para cada um e devem ser valorizados.
Outras pessoas tem a necessidade de encontrar o seu próximo em cafés, bares, lanchonetes, passeios a beira mar, onde a conversa tranquila nos convida a levantar os pés do chão e se deliciar com as narrativas que vamos construindo.
Há, por outro lado, pessoas tão próximas da gente fisicamente, geneticamente, geograficamente, sentimentalmente, dentro de nossas próprias casas que não conseguimos acessar quando pensamos na máxima: quem é o meu próximo?
Muitas vezes essa distância foi provocada por um desentendimento, um motivo insignificante, que gerou um enorme abismo e que precisa ser religado. Para outros, a própria religação trará mais sofrimento existencial e neste caso o mais importante é que se considere a distância entre si. Em outros casos, o perdão, o acolhimento, o abraço poderão funcionar como um fármaco de grande valia no tratamento destas dores existenciais – principalmente neste momento do mundo, com a pandemia do Covid-19 e a chegada da Festa da Natividade.
Todos esses cenários quando considerados sob outro enfoque, dentro de uma perspectiva fraterna, solidária, igualitária, ganham outros significados. Eu acho, assim, que de certa maneira é dentro desta perspectiva que podemos tirar muito da humanidade que está em nossos corações para o exercício prático na vida aqui fora visando assim relações mais sadias e harmoniosas com o próximo e tudo o que há no meio.
E você como lida com tudo isso? Como é isso para você? Quem é o seu próximo? Quem é o seu distante? Por onde anda seu coração quando pensa no outro? Bem é isso. Um abraço em todos e até o nosso próximo encontro se Deus quiser!
Bom dia Planeta!!! A mentira fez do mundo um lugar melhor para viver? Sustentável? Olhe para o Estados, as relações institucionais, as próprias relações pessoais. Elas parecem funcionar de forma mais harmoniosa fundamentadas na mentira.
Percebam como a mentira, uma atrás da outra, faz o mundo absurdamente viável. Vocês querem ordem no mundo? Então, terão que mentir para as massas, ou então, teremos que tirar ela do mundo e encarar a vida como ela é.
Então, qual é a mentira que estão dizendo neste período? O Covid-19 não foi criado em laboratório? Não há dinheiro e emprego para todos no mundo? O mundo é assim mesmo? O candidato X é o mais preparado para vencer a eleição? Marcos é o melhor esposo para Myriam? Myriam é a melhor amante de Gustavo? Gustavo ama Ligia?
De fato, ao examinar esses tópicos percebemos como a mentira está enraizada em nosso meio, nas nossas relações de A à B, institucionais e pessoais. A coisa verdadeiramente perturbadora neste problema é que elevamos a mentira em um princípio geral social, no princípio da organização de nossa vida político-social.
É como se as relações nas sociedades, nos estados, nas instituições, nas organizações corporativas, entre as famílias e as pessoas somente conseguem permanecer estáveis e harmoniosas se foram baseadas em uma narrativa mentirosa. É como dizer que se contarmos a verdade o mundo desaba sobre nós. A verdade pode nos levar a uma desintegração da ordem social, política e familiar.
Perto do fim, é como se a mentira funcionasse como uma batata quente, passando da mão de uma pessoa para a outra, a fim de manter a confiança das massas no sistema “legal” e nos subsistemas onde elas habitam miseravelmente. A ideia final é que se as massas, as pessoas, fossem aprender o quanto é mentiroso e corrupto os sistemas e subsistemas onde estão inseridas, tudo entraria em colapso, caos. (Slavoj Zizec, 2013).
Não há nada de novo nisso. Essas narrativas sobre a mentira nos acompanham desde Platão, mas especialmente nas obras de Immanuel Kant, Friedrich Nietzsche e Edmund Burke. A ideia de que a verdade é forte demais e os que sistemas, os políticos, as pessoas, embora tenham uma ideia no fundo de suas consciências sobre o que seja a verdade, eles preferem viver aquilo que um dia Platão chamou de uma “Fábula Nobre”, uma mentira.
Em tempos de crise, qual seria, então, a boa notícia?
27/09/2020
Bom dia Planeta! Os tempos de crise são inevitáveis. A história da humanidade está repleta de momentos que marcam o fim de uma era e trazem as transformações necessárias para o início da próxima.
Nunca tivemos um mundo ideal para todos e não sei se um dia ainda teremos. Alguns poucos vivem em bolhas de excelente qualidade de vida e outros, na verdade a grande maioria, se sujeitam a uma vida com muitas dificuldades e ameaças de sobrevivência.
E neste sentindo quanto mais avança a crise, mais avança a incapacidade para pensá-la em termos planetários. Ainda pensamos com fronteiras, limitações existenciais, geográficas, econômicas, políticas, teológicas, filosóficas, sociais – entre outros vetores – que deixam limitada a nossa capacidade de reação frente as grandes tragédias da humanidade e do meio ambiente.
O desafio de uma ética, uma escolha, planetária é o mesmo desafio da complexidade de perceber que embora falamos diferentes, pensamos diferentes, somos diferentes, pertencemos a um mesmo habitat – chamado Terra. E que quanto mais os problemas se tornam planetários, mais precisaremos da união de todos pra resolve-los como é o caso agora diante da pandemia do Covid-19 e todas as outras crises que se aliaram a ele.
Pensar numa saída digna para todos hoje é pensar numa saída digna para a boa convivência entre todos na Terra. Sem esse olhar, estaremos condenados a avançar na ignorância “que é favorecida por esse pensamento parcelar, fragmentado, que vê apenas fenômenos separados, incapaz de compreender suas relações” (Edgar Morin, 2013).
E pensar assim é refletir de forma pequena. Não é empenhar-se em pensar bem, elaborar estratégias, fazer apostas em uma consciência plena planetária – respeitando as singularidades de cada um.
- Qual seria, então, a boa notícia?
- “Uma conscientização da amplitude, da profundidade, da complexidade do momento em que vivemos, dando conta de um novo começo. Estamos em um período de crise planetária tão complexa como os antigos conflitos entre as nações, seus povos e não sabemos o que sairá disso tudo; tudo aquilo que der conta da possibilidade de transcender essa crise será uma boa notícia.” (Morin, 2013).
- O que faremos com a nossa vida?
- Essa saída terá que ser pensada e decidida coletivamente. Porém, dentro de uma visão aristotélica de que você tem direito a felicidade – o bem supremo. Mas, essa felicidade individual – mesquinha, egoísta – não deve ser soberana a felicidade coletiva. É insustentável, por exemplo, que três pessoas no mundo tenham em seu patrimônio a renda dos 48 países mais pobres do planeta e que a fortuna de 225 pessoas seja equivalente à soma dos irrisórios rendimentos individuais de 2,5 bilhões de seres humanos.
Teremos também que repensar todo o nosso consumo, nossa relação com o meio e os outros seres que estão no meio. Enfim, atingir um grau de humanidade qualitativamente superior, fraterna e solidária – dentro do espírito mosqueteiro de um por todos e todos por um.
- É difícil? Sim. É utópico? Sim. Mas, o simples fato de pensar sobre isso já eleva nossa consciência para o desafio de crescer em humanidade. Bem é isso. Até o nosso próximo encontro se Deus quiser.
Bom dia Planeta! Hoje faremos um breve passeio em torno de alguns fragmentos de pensamento construídos por alguns filósofos que poderão nos ajudar diante do momento em que estamos vivendo. Uma época de muitas crises, martírio e desrespeito a vida humana.
Vamos abrir nosso papo com Hannah Arendt – filósofa alemã de origem judaica – considerada uma das mais influentes do século XX. Em um de seus ensaios denominados de “Homem em Tempos Sombrios”, ela apresenta uma reflexão sobre o mundo mergulhado no totalitarismo, no nazismo, marcado pelo genocídio. Ela constrói seus relatos residindo na sólida crença do poder da solidariedade e na dignidade humanas como fármacos capazes de impedir o avanço da barbárie.
Ainda no prefácio, Arendt nos alerta com a afirmação de que “mesmo no tempo mais sombrio temos o direito de esperar alguma iluminação, e que tal iluminação pode bem provir, menos das teorias e conceitos, e mais da luz incerta.” Paradoxalmente, em tempos como estes – sombrios – é comum a fraternidade se manifestar mais plenamente como um aspecto de autodefesa da humanidade.
Um outro fragmento de pensamento que se apresenta nesta caminhada vem do filósofo italiano Giorgio Agamben cujo artesanato filosófico se concentra nas relações contínuas entre ética, estética, lógica, literatura, poesia, política e o meio jurídico. Em um dos seus diálogos sobre o “home sacer”, ele retoma a figura do direito romano antigo para evidenciar o ponto entre o poder soberano e a biopolítica que é exercido pelo meio e que torna certas vidas, “home sacer”, matáveis. Agamben fala também na ideia de Aristóteles entre Bios e Zoé. Onde Bios é o reino da ética e da moral onde se manifesta o juízo. Já Zoé é a vida nua, natural comum a todos os homens, lugar que torna o vivente sujeito a mais perversas políticas de exclusão, aniquilamento e morte.
O paradigma de onde isso acontece são os campos de concentração nazistas descritos por Hannah Arendt, nos quais o indivíduo é reduzido a pura Zoé, animalizado, e seu corpo é privado de sua diferenciação, absolutamente controlado e aniquilado. A necessidade de se recorrer ao direito a vida dignamente marcará o combate à vida nua.
O terceiro fragmento neste breve passeio diz respeito a ideia de Necropolítica desenvolvida pelo filósofo camaronense Achille Mbembe que trata os limites da soberania quando o Estado escolhe quem deve viver e quem deve morrer. Para Mbembe, quando se nega a humanidade do outro, qualquer violência se torna possível, inclusive, agressões até a morte.
Eu poderia continuar esse passeio enveredando por caminhos existenciais mais profundos, mas não farei. Quero, entretanto, demonstrar por meio destes três fragmentos algo que parece está bem claro no mundo contemporâneo. De fato, a humanidade, os ditos civilizados, jamais permitiriam uma reedição do Holocausto no mesmo modelo operado nos campos de extermínios de outrora.
Mas, se tudo isso foi planejado? Se essa indústria da morte se modernizou, se sofisticou e aumentou seu poder de produção dentro de um método que “achamos natural” contra as vidas matáveis, seus “home sacer”? Como sairemos deste cenário?
Bem é isso. Até nosso próximo encontro, se Deus quiser.
Bom dia Planeta! Há pessoas que o tempo todo procuram um sentindo para vida. Percorrem caminhos, pesquisam em livros, realizam análises, escutam gurus, mentores espirituais, existencialistas e uma série de outras possibilidades que nada tem em comum com que tanto anseiam em suas vidas.
A verdade é que isso é muito particular de cada um e não nos cabe aqui responder qual o melhor caminho de encontrar esse sentido. Na filosofia clínica costumamos colocar o tema em pauta e dentro dele provocar uma série de questionamentos que levem o partilhante a encontrar suas próprias respostas.
Algumas respostas são únicas assim como as pessoas que as responderam:
- Dizem que procuramos um sentindo para vida. Penso que o que procuramos são experiências que nos façam sentir que estamos vivos.
- O sentido da vida é estar vivo!
- Viver é experimentar e não ficar pensando no sentido da vida!
- Talvez, o sentido da vida, nada mais seja que um abraço inesperado.
- O sentido da vida é ajudar o próximo.
- O sentido da vida é construir uma família, criar uma descendência.
- O sentido da vida é correr em círculo com mais de 300 quilômetros por hora.
Outros definirão com outros olhares:
- O sentido da vida é marcar um gol em cada partida que eu jogar!
- O sentido da vida é transmitir conhecimento!
- O sentido da vida é encontrar a cura para o Câncer, a Aids, o Covid-19!
- O sentido da vida é encontrar a cura para morte!
- O sentindo da vida é viver um grande amor.
Todas as construções em tela têm validade, são de grande valia, pois, de fato, são verdades particulares de cada pessoa e que precisam ser levadas em considerações nesta busca existencial da raça humana enquanto coletivo.
Essas construções são frutos de grandes buscas, de longas travessias existenciais em busca de si mesmo. E cada pessoa tem um sentido muito especial para a vida de todos neste planeta e deve, portanto, ser respeitada, tratada com dignidade, admirada, amada. Até o nosso próximo encontro se Deus quiser!
Bom dia Planeta! Olha, não são dias fáceis. Assim como diz o poeta dentro de sua quarentena existencial: “Dá para ver o tempo ruim lá fora.”
Mas, tenhamos calma. Tempos ruins também passam e passam, sobretudo, com a força que temos diante das adversidades. E neste sentindo, não importa o que a gente é, ou mérito ou medalha que conquistamos. Importa realmente o que a gente pode, o que a gente faz pelo outro. O mundo precisa da gente, as pessoas precisam da gente.
Qual nome tem sua luz? Qual nome tem sua potência? Amor? Paz? Harmonia? Fraternidade? Solidariedade? Generosidade? Gentileza? Respeito?
É preciso intensificarmos a orientação para o caminho do amor enquanto potência, da paz enquanto potência, da harmonia enquanto potência, da fraternidade enquanto potência, da solidariedade enquanto potência, da generosidade enquanto potência, da gentileza enquanto potência, do respeito ao outro e a si mesmo enquanto potência, da ética enquanto potência para construção dos bons acontecimentos.
Perceba a grandeza destes valores somados aos verbos poder e fazer. Como eles são de grande valia no auxílio ao próximo e a si mesmo. Perceba a grandeza destas palavras aliadas a ideia e a prática de que você pode e você faz. São de uma força imensurável.
Vivemos um tempo de muita fragilidade. Há carências enormes. As pessoas estão carentes não somente de alimentos para o corpo, para alma, mas de afetos, sentimentos. Estão também carentes de uma orientação para que possam organizar seus pensamentos.
Os próprios governos em toda Terra estão à deriva em construções e narrativas que nada tem haver com a crise e o Covid-19. Não estamos falando apenas de um problema de saúde. Também não se trata apenas de um problema político, de esquerda, de direita, centro, econômico, social, cultural.
A questão é mais além, é existencial. E por ser um vetor existencial exige de todos nós o verdadeiro exercício do amor, da paz, da harmonia, da fraternidade, da solidariedade, da generosidade, da gentileza, do respeito a dignidade humana, do respeito a si e ao outro dentro da promoção de uma ética planetária, uma ética cósmica.
De repente, tudo está fechado. Estamos todos dentro de nossas casas existenciais, alguns em condomínios luxuosos, dentro de fronteiras, muros, muralhas, protegidos dos que estão lá fora, vivendo em abrigos miseráveis. Outras pessoas vagam nas ruas de um lado para o outro, tentando aquecer seus corpos nas madrugadas frias das cidades. Abandonadas e condenadas a própria sorte.
Esquecemos que somos todos um. Um planeta, um universo, um infinito. Não dá para se isolar numa bolha fingindo que não temos nada com isso ou jogar de forma egoísta toda a responsabilidade da cura desta enfermidade nos cientistas, médicos e profissionais da saúde. Precisamos evoluir. De fato, ou evoluímos pautados na prática dos verdadeiros e imensuráveis valores humanos ou sucumbiremos. Até o nosso próximo encontro, se Deus quiser.
Bom dia Planeta! Tenho recebido muitos e-mails sugerindo a abordagem do tema em tela – principalmente neste período de isolamento social e pandemia. De repente com quase tudo fechado, o dinheiro curto, percebemos a inutilidade das coisas e do consumismo.
Na clínica filosófica tenho sugerido o exercício diário de analisar essas questões e assim sugerir que cada partilhante retire de suas mãos aquilo que pesa e que de fato não fará nenhuma falta durante a viagem na Terra.
A história é rica em exemplos de pessoas que levaram em suas bagagens o essencial para viver. O filósofo Diógenes de Sinope, na Grécia antiga, por exemplo, foi exilado de sua cidade natal e se mudou para Atenas, onde residiu por longos anos num grande barril, fazendo de sua vida simples uma virtude e uma espécie de protesto contra o consumo desenfreado, a ganância e a corrupção.
A vida de Jesus Cristo foi extraordinária, mas também muito humana e simples. Assim como Diógenes, ele andou por cidades e levava nas suas viagens apenas o necessário para combater o pecado e anunciar a salvação.
Outro exemplo de abnegação, o escritor gaúcho Mário Quintana – considerado o poeta das coisas simples – não casou e nem teve filhos. Viveu grande parte de sua vida em quarto de hotéis e hospedarias, de onde um dia escreveu o belo tratado do desapego:
- De repente tudo vai ficando tão simples que assusta. Vamos perdendo algumas necessidades, antes fundamentais, e que hoje chegam a ser insignificantes. Vamos reduzindo a bagagem e deixando na mala apenas as cenas e as pessoas que valem a pena. De repente, vamos abrindo mão das certezas, pois com o tempo já não temos mais certeza de nada e isso não faz a menor falta. De repente entendemos que tudo o que importa é ter paz e sossego. É viver sem medo e simplesmente fazer algo que alegra o coração.
Bem é isso. Se livrar de tantos pesos na bagagem existencial, ter uma vida simples, passa pela adoção e prática de alguns desses exemplos, que não são regras, mas filosofias para viver. Quando nos abrimos para o desapego às coisas, percebemos que a nossa bagagem existencial pode ser leve e rica em ensinamentos para uma vida bem feliz. Até o nosso próximo encontro, se Deus quiser.
Tenho acompanhado e visto muitos diálogos sobre o tema em tela neste período de crise. Todas as reflexões funcionam como um esforço do pensamento, da mente, no sentindo de construir futuros cenários sustentáveis para humanidade.
Haverá um novo mundo?
Eu, confesso, que já estaria bem feliz se pudéssemos retornar ao mundo que tínhamos na infância. Não gostaria que a esperança para um mundo novo nos retirasse alguns prazeres que somente podiam existir lá como a ideia de conversar com um amigo sem malícia, brincar, jogar bola, andar pelas ruas, passear nas praças e sorrir sem nenhuma maldade. Com relação as demais variáveis apresentadas para este novo mundo, devo admitir que todos os cenários construídos pelos seus estudiosos funcionam como histórias de ficção – mas que devem ser respeitadas e consideradas.
Há alguns anos, acompanhei, como relações públicas, o escritor judeu polonês Ben Abraham, sobrevivente da fúria nazista. E foi durante nosso primeiro encontro que fiz esse mesmo questionamento focando um outro momento da história, o período pós-guerra:
O mundo mudou depois do nazismo? E ele respondeu:
- Depois de estabilizada a situação, os vencedores promoveram diálogos sobre o cenário político, social e econômico em todo o planeta. A Inglaterra e Estados Unidos assinaram a Carta do Atlântico e foram selados diferentes acordos diplomáticos, nasceu Israel. A Organização das Nações Unidas aprovou a criação da Declaração dos Direitos Humanos. Entretanto, depois de um período fraterno o mundo, as nações, as pessoas retomaram suas antigas rotinas. Surgiu a Guerra Fria, os Estados Unidos lutaram contra o Vietnã, a Inglaterra entrou em combate contra a Argentina pelo controle das Ilhas Malvinas, os conflitos se espalharam no Oriente Médio, entre os lugares e o resto da história você já conhece.
O mundo mudará depois do coronavírus?
- Bem! Retomo aqui o meu diálogo. O sistema e o meio são inseparáveis. Toda crise – seja no período de guerras, recessão ou de saúde pública – antecipa e ajuda o homem a pensar sobre sua existência. E isso é bom. Teremos de fato alguns ganhos. Por outro lado, ninguém se engane. Alguns problemas continuarão a existir por que nos falta a ideia e a prática de uma consciência ética planetária.
Sem essa consciência ética planetária continuaremos a celebrar o eterno retorno da guerra e da paz, do amor e do ódio, do bem e do mal, etc. Precisamos ser luz e não curto-circuito – dentro de um ambiente harmonioso. É difícil, portanto, imaginar qualquer cenário futuro sem essa premissa de levar em consideração todas as lições conhecidas ao longo do tempo e da historicidade do homem na Terra.
Por que? Porque o tempo e a história são fatores determinantes na formação do que somos e nos torna diferentes do que éramos. Alguns serão bem melhores, outros bem piores. Neste dualismo, um pouco fica do que era e outro pouco muda. E o que muda para “melhor” em certos períodos ainda guarda algo do que ficou de pior – ainda que no inconsciente e muito bem escondido até o momento em que tenha uma oportunidade de retornar.
E que, portanto, a minha ideia de voltar à infância, no início deste texto, não seja de toda tão perdida. Por que não acredito nos homens como são, mas como eram quando crianças. Fui criança, creio nas crianças. Elas são puras, não carregam a maldade, são felizes, solidárias e fraternas. Que possamos, enfim, nesta crise retomar a nossa infância, o nosso espírito lindo de criança e nele encontrar a cura, a vacina, para todas nossas doenças existenciais e físicas. Até o nosso próximo encontro se Deus quiser! Guto Castro – É escritor, filósofo, educador e especialista em Filosofia Clínica (Instituto Packter).
Temos algumas ideias sobre esse tema. Há uma linda canção do grupo sueco Firts Aid Kit, formado por duas irmãs, que pode ser um bom começo para nosso café de hoje. Vamos alguns versos da bela canção “My Silver Lining” (ouça a música):
- “Eu não quero esperar mais/Eu estou cansado de procurar por respostas/Me leve a algum lugar onde há música e há risos...”
E mais à frente, na mesma canção, encontramos esses belos versos:
- “Eu não sei se eu tenho medo de morrer/Mas eu tenho medo de viver rápido demais, devagar demais/Arrependimento, remorso, espera, oh não, eu tenho que ir/Não há recomeços, nem novos começos, o tempo voa...”
Olha é bem provável que para alguns a vida seja assim mesmo. Para outros de outra forma. Muito acreditam que já nasceram com as respostas de suas vidas prontas, outras pessoas acreditam que seja uma construção entre o nascer e o morrer.
Tem algumas outras pessoas que acham a vida bem simples e acreditam que não temos muito controle sobre ela. “O nascimento não está em suas mãos. Você apenas nasceu. A morte não está em suas mãos e você terá apenas que morrer um dia. Você, então, terá algum controle de sua existência apenas entre estes dois polos.”
- Será assim mesmo para você?
Bem, eu gostaria que a vida fosse um pouco mais previsível e que eu pudesse lê-la como um livro que escrevo e adivinhar o que virá a seguir. Mas não é bem assim. Há, entretanto, um segredinho bem legal que aprendi com a Filosofia. Quando você colocar de lado tudo que não pertence a você, tudo que não é você, inclusive esse ensaio, o que você é, estará lá. Essa consciência própria do que é você tornará sua busca existencial, sua caminhada mais leve e lhe proporcionará felicidade – uma outra forma de existir.
A maioria das pessoas não está consciente sobre isso. Vive uma vida baseada em sonhos que muitas vezes não são seus, em vidas que não são suas, estagnadas. Será que tudo que realmente você deseja é a velha fórmula de vencer na vida, possuir bens, ser famoso, morar bem, na mesma cidade, viver no mesmo emprego a vida inteira? Todavia isso terá alguma importância durante esse processo de travessia existencial? Você não está perdendo muito tempo para construir tudo isso?
Bem essas são questões que você terá que responder durante sua jornada. Aqui provoquei esses grilhões no seu pensamento numa tentativa de fazer com que você seja livre destas amarras que aprisionam “nossa consciência” com muitas coisas pesadas e desnecessárias. Olhe para essa possibilidade por esse ângulo e tente imaginar como será o seu dia depois deste papo. Bem é isso! Até o nosso próximo encontro se Deus quiser!
Bom dia Planeta! Tenho recebido muitos e-mails falando que “passa ano e entra ano e a vida continua do mesmo jeito por mais que enveredamos por outros caminhos”.
- Então, o que fazer?
Não há uma fórmula pronta para resolver essa questão. Haverá dias bons, haverá dias ruins e entre eles infinitas possibilidades, caminhos que poderão ser encontrados para viver melhor e com mais sabedoria.
Entretanto, essa será uma jornada que terá que ser realizada por você. Há algumas máximas na literatura mundial que diz que “o caminho se faz caminhando”. Agora é importante buscar no meio do caminho os instrumentos que podem proporcionar uma mudança de vida.
O educador Paulo Freire, por exemplo, costumava dizer que “ninguém caminha sem aprender a caminhar, sem aprender a fazer o caminho caminhando, refazendo e retocando o sonho pelo qual se pôs a caminhar.”
A poetisa Cora Coralina escreveu em um dos seus versos a máxima: “O que vale na vida não é o ponto de partida e sim a caminhada. Caminhando e semeando, no fim terás o que colher.”
Um outro poeta, o espanhol Antônio Machado na obra Cantares em versos escreveu:
“Caminhante, são tuas pegadas
O caminho e nada mais;
Caminhante, não há caminho, se faz o caminho ao andar…
Ao andar se faz caminho
E ao voltar a vista atrás
se vê a senda que nunca
se há de voltar a pisar...”
Bem é isso. A Filosofia clínica trabalha este tópico com o entendimento de que cada existente tem um caminho singular a seguir em sua vida e suas buscas ajudam a entendê-lo. O devir, o projeto pessoal, o sonho guardado, essa busca se bem fundamentada ao longo do percurso pode mostrar para onde o sujeito está indo existencialmente.
O fazer a vida, o dar o sentido a existência no uso da liberdade, não corre no vazio. É preciso um esforço nosso para que as coisas mudem – e de preferência dentro de nós. Essa reflexão dentro de nós e o estar no mundo, no meio das coisas, é uma circunstância fundamental para que os dias sejam mais leves e consequentemente os anos mais felizes. Um abraço em todos e até nosso próximo encontro, se Deus quiser.
Bom dia Planeta! Conta uma história judia que toda manhã um homem enchia seu cantil com água doce e saia para sua jornada. Atravessava as ruas do lugar onde morava, caminhava entre as alamedas da cidade e seguia até o mar – onde depositava com carinho toda água que levava.
Ele repetia isso todos os dias, ano após ano, no inverno e no verão. E foi num determinado momento de sua caminhada que um observador foi falar com ele.
- Bom dia amigo! Olha o pessoal anda fazendo piada com você. O que você pretende com esta ação? Aumentar o nível do mar? Regar o mar com água doce? Isso é coisa de um bobo. Não acha?
Algumas testemunhas do fato relatam que esse homem ficou muito surpreso com os questionamentos. Todavia, enquanto o observador falava, ele ficou pensando em todo o caminho que fazia de casa até o mar. Ele estava muito feliz com sua atitude e nunca imaginou que pudesse está chamando atenção por realizar isso.
Lembrei desta história porque ela é rica em simbolismos e emoções. De fato, o homem que regava diariamente o mar com seu cantil na verdade estava realizando um gesto de gratidão e reconhecimento a imensidão do oceano que banhava sua cidade e toda região que dele dependia. O mar que oferecia de graça os frutos mais deliciosos para o povo do lugar. O mar que trazia renda para os pescadores, os cozinheiros e os comerciantes. O mar que atraia os navegadores e os turistas que movimentavam a economia local. O mesmo mar que fazia tão bem aos corpos e aos espíritos daqueles que se banhavam em suas águas. O mesmo mar que um dia encantou os profetas e Jesus Cristo.
Há muitos contos de Natal, ensinamentos para se criar um mundo melhor, para causar uma mudança de pensamento e uma nova consciência individual, familiar, comunitária, planetária e cósmica. Essa, particularmente, é mais uma linda história de Natal contada entre os povos judeus e que transcrevo para vocês como forma de inspirar a cada um ações por um mundo mais humano e fraterno.
Fico imaginando como seria lindo e harmonioso o mundo se cada ser humano – assim como esse sábio homem – tivesse o mesmo cuidado de regar com água doce o mar existencial do seu próximo. Bem é isso. Um Natal bem feliz e um Ano Novo repleto de realizações e muita saúde para todos. Até a próxima temporada se Deus quiser.
Bom dia Planeta! Volto a falar sobre esse tópico diante de alguns e-mails que venho recebendo - principalmente de jovens que estão deixando o ensino médio, cheios de projetos e que muitas vezes encontram dentro de si aquele que é o seu maior concorrente, o pensamento.
Quando o pensamento não é educado, de forma a se comportar, ele pode trazer muitos problemas. E nesta frequência a pessoa pode vagar pelos perigosos abismos existenciais, labirintos, que acabam sabotando a consciência e levando o indivíduo a ideia que ele está no mato sem saída, que o problema não tem jeito, está tudo acabado e pronto.
Tomar decisões a partir destas “conclusões” pode ter consequências muito sérias. Há pessoas que simplesmente desistem do local onde foram postas a prova. Quantas pessoas, por exemplo, procuraram empregos nos últimos meses e não encontraram e acabaram desistindo? Quantas outras pessoas estão em casa esperando uma oportunidade? E aqueles alunos que terminaram o ensino médio e enfrentaram no último mês o ENEM? O que farão de suas vidas se não passarem para a universidade? Haverá outros caminhos, outras possibilidades?
Claro que sim! A vida é surpreendente! Li algumas histórias de vida fantásticas como a da escritora judia Anne Frank, que mesmo confinada com sua família nos fundos de um prédio, em Amsterdã, na Holanda, fugindo da fúria nazista, escreveu algumas das cenas mais lindas vividas por uma adolescente - seus sonhos, perspectivas e projetos. Mesmo diante de tantas atrocidades, ela foi capaz de escrever fragmentos como esses que transcrevo a seguir:
– Apesar de tudo, eu ainda creio na bondade humana.
E mais à frente narrava o segredo de sobreviver em meio as adversidades de seu tempo:
– O melhor de tudo é o que penso e sinto, pelo menos posso escrever; senão, me asfixiaria completamente.
Importante observar como a própria autora floresce como pessoa humana diante de seus desafios. Não será assim para todos que vencem seus obstáculos existenciais? Bem, “O Diário de Anne Frank” é uma obra extraordinária que deveria ser lida por muitas pessoas que acreditam que seus problemas são difíceis e que talvez pela falta de uma educação voltada para o pensamento isso seja assim mesmo para elas. Na verdade, o pensamento é apenas uma parte da existência. Muitas vezes há sentimentos, emoções, juízos e fé dentro de nós que são maiores que ele e que são determinantes para encontrar uma saída existencial sem radicalismo.
Não é porque o pensamento fala que ele é determinante para as tomadas de decisão que você anuncia. Agora, é fundamental que você saiba educar o pensamento, que saiba silenciá-lo no momento certo. Um pensamento educado, auxilia, orienta e acaba virando um bom amigo.
A questão então passa a ser: Como é que a gente pode educar o pensamento? É um processo muito semelhante com o vivenciado nos anos que passamos na escola e na academia. Cada um aprende de um jeito. Algumas pessoas educam seus pensamentos com rotinas, estabelecendo horários, aulas de ioga, exercícios físicos e mentais, leituras, tendo acesso a bons filmes, ouvindo boas músicas, participando de uma roda de conversas com temas agradáveis, construtivos, visitando templos, orando. Enfim, há uma série ilimitada de possibilidades que cada pessoa irá realizar de acordo com o que ela achar melhor e mais confortável.
Em tempos tão complexos, de oscilações e estados de estresses, algumas destas sugestões podem ajudar a pensar sobre a vida numa outra frequência, menos angustiante e pesada. Um abraço em todos e em todas e até nosso próximo encontro se Deus quiser!
Por que é tão difícil ultrapassar os limites de um nevoeiro? Por que é tão difícil ultrapassar os limites do pensamento? Os limites de uma consciência? Pensar é ter consciência?
Temos respostas para quase tudo. E por outro lado, temos tantas perguntas e nos faltam as principais respostas. Nossa existência parece cada vez mais atolada na ignorância, na violência e na intolerância.
Em mais de 6 mil anos de história do pensamento humano não conseguimos andar e algumas de nossas faltas no mundo contemporâneo são tão antigas quanto o próprio mundo. Continuamos a matar, continuamos a roubar, a desejar o alheio.
Quais são nossas culpas neste processo? Precisamos reconhecer nossa queda. Esse talvez seja o momento, a oportunidade, da gente reconhecer que somos culpados pela realidade em que vivemos.
Por que mordemos as iscas de um mundo cruel? Por que somos seduzidos por caminhos fáceis? A gente é lançado no buraco e busca uma altura. A gente é lançado numa altura e busca um chão. A gente leva uma queda e depois fica de pé. Será que não era bom ficar no chão algum tempo? Ou de repente ficar num buraco por um período? Ou quem sabe ficar na altura aonde fomos jogados? Ou, melhor, quem sabe não ficar em nenhum destes polos? Não ser um bipolar?
Por que em períodos semelhantes, os poetas e os artistas cresciam? Cresciam pelas provocações que realizavam, pela renúncia a própria renúncia ao que estava posto. Seria uma expressão do inconsciente? Esse inconsciente seria mais importante do que a própria consciência? E por que hoje nem os artistas estão encontrando uma resposta para a consciência e angústia existencial nas quais estamos inseridos?
A consciência existencial, assim como essa angústia existencial, é provavelmente o fenômeno do fenômeno. Como posso saber se sou único? Como posso saber de que entre minha consciência e bilhões de outros partilhantes há uma diferença básica no pensamento de cada um? E se somos uma única consciência, por que brigamos tanto entre nós mesmos?
Não há um caminho fácil para lidar com o tamanho deste problema. Precisamos ser incansáveis no empenho de buscar essas respostas. A própria Teoria da Evolução Humana, do britânico Charles Darwin, nos impõe a ideia de que o homem seria o fim último desta cadeia evolutiva. Será que é isso mesmo? E se não for isso? Estaremos caminhando para uma evolução além do próprio homem? E o que restaria ao próprio homem? A floresta? A selva? A vida selvagem? A brutalidade? A disputa com o leão pelo domínio do mundo selvagem? E quem viria depois do homem nesta cadeia evolutiva?
Esse é um longo caminho que teremos que percorrer. Não tenho como responder. Por hora, vamos analisando essas possibilidades e outras também. Um abraço em todos e até o nosso próximo encontro, se Deus quiser.
Uma provocação: O que pode o pensamento? Em certos momentos não seria melhor nem pensar sobre o que temos competência para compreender e deixar a vida seguir seu fluxo natural? Bem, como é isso para você?
A potência do pensamento é tão pouco explorada pelo homem, embora, muitos filósofos tenham tratado sobre o tema. Um deles, Baruch Spinoza, desafiou leis teológicas, tratados cristãos e foi excomungado do judaísmo por sua honestidade filosófica defendendo a alma como guia do corpo, sua mestra, condutora.
Spinoza dizia que percebemos o tempo e o espaço usando a medida para essas duas extensões. A medida é usada para explicarmos as coisas e essa realidade é uma coisa muito mais vasta do que as categorias humanas de entendimento podem conhecer. Isso porque existe a essência e Deus é o único ser em que a essência coincide com a existência. E isso não acontece com os outros seres.
O pouco que percebemos confunde o real com a razão, e o filósofo, numa postura investigativa, não pode se deixar enganar. Neste contexto, a gente costuma falar sobre tudo e ao mesmo tempo nós não sabemos nada sobre as outras possibilidades – preferimos ficar no juízo comum. Talvez por preguiça mesmo de se aprofundar nos questionamentos sobre o que anunciamos e acreditamos como verdade.
Será que pensar é simplesmente buscar essa verdade? Realizar uma vontade? Um desejo? Ou simplesmente a gente é coagido a pensar e a agir conforme o pensamento nos orienta? Que força racional é essa que emerge de nós? Por que nos colocamos em estado de choque, ou com o juízo suspenso, diante do acaso, de uma tragédia, do inesperado?
Que força é essa capaz de provocar em nós uma reflexão sobre o que é viver? O que somos? Qual a nossa condição no planeta? De onde vem essa necessidade de aprender as realidades que nos atravessa, nos afeta, e que nos coloca em labirintos existenciais e complexos?
Será que a questão do pensar é mais importante do que a de agir com o próprio corpo, um corpo intenso, ativo, não mais interessado em buscar a verdade? Refletir? Um corpo que apenas se movimenta, segue o fluxo da vida, nasce, cresce, gera vida e falece. E posteriormente, será que esse pensamento, enquanto memória, segue em outra frequência de energia consciente no Cosmo?
Bem é isso! Um abraço em todos e todas e até o nosso próximo encontro se Deus quiser.
No nosso último encontro falamos sobre a ideia de quem é o autor da sua vida, o que de fato você deseja ser e o que necessariamente luta para não ser em meio a esse complexo emaranhado no qual a vida é construída.
E se estivermos errados sobre tudo isso? Por que acreditamos que podemos ser uma coisa? Por que negamos o não ser? Por que precisamos, inclusive, construir instituições que validam a ideia de identidade deste ser que desejamos ser? Por que não queremos ser outra coisa? Por que não somos simplesmente acontecimentos capazes de criar realidades? É possível criar uma realidade na existência? Por que colocamos nossas vidas nestas encruzilhadas?
Vou usar a analogia do espelho, que costumo usar em sala de aula, para tentar explicar melhor o que pretendemos provocar aqui. Um leão, por exemplo, não se reconhece como leão no espelho e muito menos ele tem a ideia do que é ser um leão. Atribuímos a esse diagnóstico a falta de razão, consciência do que ele próprio é. Será?
Entretanto, o mesmo leão, fora do espelho, é capaz de identificar o outro no seu bando – aquilo que chamamos de alcateia. Interessante que o mesmo fenômeno acontece com o gato e as outras espécies que consideramos irracionais. Mas, com o homem é bem diferente. O indivíduo se reconhece no espelho e, todavia, é incapaz de reconhecer o seu semelhante fora das relações de interesse dentro da “homarada”. Interessante essas inversões e percepções – homem, bicho, espelho e vida real.
Um outro clássico que já virou uma tradição é famosa frase interrogativa:
- Você sabe com quem está falando?
Nossa. Bate um frio na barriga sempre que ouço essa frase. Há entre nós, os humanos, racionais, uma carência de ser alguma coisa além da própria coisa que nos limita. Não é à toa que diante desta angústia, carência, reagimos de maneira tão inesperada e muitas vezes violenta.
Retomo aqui novamente a visão do espelho visto a partir de uma outra dimensão. Será que se colocarmos em cena um juiz, um réu, um médico, um louco – ambos sem ostentarem seus hábitos consagrados – haverá a possibilidade de um outro humano fora do campo visual do espelho perceber quais são, de fato, as reais identidades de cada um?
Bem essa é uma construção difícil. Trata-se de pensar a ideia de ser ou não aquilo que acreditamos ser e que talvez nem sejamos. Porém, de fato, o mais importante nesta tentativa não é desanimar, mas acreditar que essa busca por um sentido de ser é natural à condição humana. O homem sempre pensou sobre si em todas épocas e sociedades e existiram homens que observaram esse esforço.
A reflexão do homem sobre o homem e este com o meio é tão antiga quanto a própria existência humana e será sempre um tema de interesse quantas vezes o presente ou o futuro quiser tratar a proposição. Pois, de fato, nada garante que hoje somos quem acreditamos ser. Muitas vezes é preciso ignorar a si mesmo para melhor se encontrar e perceber inclusive o quanto estamos errados ou talvez certos em atribuir um valor, um conceito, as coisas ou aquilo que chamamos de humano. Um bom começo, portanto, é reconhecer que tudo flui e que talvez por hora nem sejamos essa Coca-Cola toda. Bem é isso! Um abraço em todos e todas e até o nosso próximo encontro se Deus quiser!
Todos nós desejamos viver uma vida melhor, mais feliz, mais saudável, livre de tantas atividades prejudiciais ao nosso corpo e a nossa mente. Coletivamente desejamos um país melhor, mais ético, fraterno e justo. Todavia, por mais que nos esforçamos e tenhamos essa intenção diária, a maioria das pessoas parece caminhar para o lado oposto do que desejam e o pior que tudo isso parece acontecer com sociedades inteiras como o nosso país.
Não há como negar que nós – seres humanos – sofremos determinações coletivas e outras bem particulares – impostas por sistemas e armadilhas existenciais que nos limitam na consciência e na ideia de liberdade. Todavia, há pessoas que quebram esses paradigmas para construir novas possibilidades de vidas, inclusive, coletivamente.
É assim, por exemplo, que o filósofo francês Émile-Auguste Chartier (1868-1951) explica como um hábil marinheiro manobra um veleiro e, fazendo ziguezagues, parece possuir o controle de seu destino – o seu porto seguro:
“O oceano não quer mal nem bem. A onda segue o vento e a lua, e se estendemos uma vela ao vento, este a impele segundo um ângulo. O marujo, então, orienta sua vela, apoia-se no leme e avança contra o vento pela própria força do vento.”
A consciência do determinismo do vento se transforma, nesse caso, em outra causa, capaz de alterar a ordem das coisas e transformar o sujeito que promove a ação em um ser atuante e determinante do seu próprio destino – uma vez que o veleiro não segue apenas para onde sopra o vento, mas para onde o marinheiro deseja ir.
Há um outro pensador francês, o filósofo Michel Foucault que realiza uma provocação sobre este tema em um ensaio maravilhoso denominado “O que é um autor?” (1969). O autor, segundo o próprio, Foucault é aquele capaz de manipular e controlar todas as personagens e a trama da história – seus labirintos e suas conexões. E isso vale para o indivíduo e para sociedade.
Como tem sido escrito o roteiro de sua viva? Você se inspira em alguém? Tem caminhado com seus próprios pés? Tem solicitado uma orientação no caminho? Tem aprendido com seus próprios erros? Tem se inspirado em alguém? Quem escreve a sua história?
Ser o autor, ou velejador de sua vida, é refletir permanentemente sobre esses questionamentos e outros que aparecem ao longo da nossa obra existencial – há portanto, neste caminho inúmeras influências de outros autores e suas histórias e isso não faz da sua obra um plágio, mas uma tentativa inclusive de ir além do que os outros escreveram.
Há, por outro lado, pessoas que estão tão acostumadas a viver a vida dos outros que não encontram significado para sua própria vida – são como personagens de uma trama escrita por um outro autor. E essas pessoas sofrem profundas crises existenciais por não entender qual de fato é a história de sua vida, o significado de sua existência.
Esse processo acontece com indivíduos e muitas vezes com sociedades inteiras, países. É, portanto, um tratado muito mais complexo do que esse breve ensaio. Enfim, não é um sistema fácil de ser manipulado por sofrer a influência de inúmeros fatores – que vão desde a família, sistemas educacionais, religiosos e éticos, espaço, tempo, entre outros tópicos.
Todavia, é possível viver sua própria obra, a história de seu sonho. E neste processo de construção não há mágica: é necessário ter o conhecimento dos determinismos que estão a favor ou contra a sua obra como autor e usar essa sinergia como força, potência para realização do seu livro – o livro de sua vida. Bem é isso. É sempre um prazer partilhar com vocês esses diálogos, um abraço em todos e todas e até o nosso próximo encontro se Deus quiser!
Bom dia Planeta! Tenho realizado esta provocação durante os encontros que estou realizando com gestores, professores e alunos das universidades, faculdades e escolas interessadas em tratar o tema. E, como não poderia deixar de ser, as respostas são as mais variadas: - Para produzir líderes, vitoriosos, ganhar dinheiro, conquistar fama, poder, sucesso, etc.
Teríamos a ideia mínima do que seria, por exemplo, uma outra educação? Lembro com saudade de uma advertência que levava da minha avó, a professora Maria Geni Costa. Depois de umas travessuras que fazia na rua, ela costumava perguntar para quê eu estudava. E pontuava: - Eu não posso ensinar um leão a se transformar em um homem. Mas, posso ensinar a você os caminhos para se tornar gente e gente no sentido de ser civilizado.
De fato, acredito que como professores temos uma missão muito maior do que simplesmente ensinar a vencer. Temos a missão de educar as pessoas para humanidade, para ser gente – nada mais pertinente. Um leão, ainda que docilizado, será sempre uma fera. O “homem” e a “mulher” podem e devem ser estimulados a atingir níveis de excelência em civilidade nas suas relações com o outro e no meio onde vive.
A ideia de uma sociedade amorosa, fraterna, humana, justa, igualitária e democrática precisa ser construída na prática desde os primeiros anos de formação do ser. E todo esse processo deve ser concebido por meio de uma relação horizontal entre partilhantes – facilitador e aluno e aluno e a comunidade visando principalmente o crescimento e o bem-estar de todos.
Um olhar mais atento a cena brasileira nos revelará que nestas últimas décadas nossos índices de violência, corrupção e intolerância somente aumentaram. Há divisões insustentáveis no país. Temos números de guerra, de uma barbárie – fruto da falta de preparo dos governos e principalmente da ausência de uma educação para humanidade.
Dai a importância de todos neste processo. A promoção de um projeto nacional com o propósito de articular, mobilizar, capacitar as pessoas para humanidade por meio de conteúdos interdisciplinares que levam à reflexão para o bem comum.
E dentro desta proposta podemos trabalhar uma série de variáveis e conteúdos programáticos. No ensino da Geografia, por exemplo, podemos tratar sobre temas relacionados com os limites, as fronteiras, entre o eu e o outro. Na Matemática é possível questionar por que alguns poucos ganham milhões e outros milhões ganham tão pouco. Na Ciência poderíamos discutir por que os avanços tecnológicos e as pesquisas somente beneficiam os mais ricos.
Um outro tópico que precisa ser discutido diz respeito a avaliação do aluno. Para quê nota? Por que conceituar o indivíduo? Por que atribuir um valor a cada aluno? Você, por exemplo, enquanto aluno, seria capaz de doar dois pontos de sua nota 10 para o colega de sala que não atingiu a média do seu colégio? Qual o sentido da avaliação? O que pretendemos com isso? Aumentar as diferenças?
Há um longo processo na estruturação deste caminho e que não é possível tratar aqui. Podemos concluir esse breve tratado colocando que esse será o grande desafio da educação nos próximos anos: a ideia de educar a pessoa para ser gente, para a valorização da vida e a promoção de uma comunidade que se baseie em fundamentos como o amor, a fraternidade, a solidariedade, a paz e o respeito entre todos. Senão, qual o sentido de educar, de ensinar e de aprender? Até o nosso próximo encontro se Deus quiser.
“ – Não conseguia dormir. Meu pai de sentinela olhava para porta a noite inteira. Ouvia umas freadas buscas de caminhões, ônibus lá fora, seguido de tiros. Foi na casa dos Baroshs – exclamava papai. E quando o dia amanhecia, contávamos as vítimas e os medos eram outros. Outras formas de mortes – acidentes, fome, assaltos”.
O diálogo acima parece muito contemporâneo. Mas, não é. Faz parte de um livro chamado “Holocausto Nunca Mais”, do escritor polonês e sobrevivente do nazismo Ben Abraham escrito no período em que ele testemunhou os horrores do nazismo nos campos de extermínio.
E por que inicio minha fala pontuando esse diálogo?
Estamos em Maio, o mês que simboliza a luta da Organização das Nações Unidas contra a violência no trânsito, o mês que celebra a vida, as mães e a maior entre todas elas – a Virgem Maria. Achei oportuno lembrar que neste país 45 mil pessoas serão assassinadas no trânsito até o final de ano, outras 500 mil sairão feridas, somadas com mais 60 mil pessoas que serão mortas por armas de fogo, e outras centenas de milhares de feridas que serão mortas por falta de atendimento adequado.
A leitura destes números de guerra é devastadora. Quem precisa de Auschwitz, Adolf Hitler e a indústria da morte nazista diante de uma produção de óbitos como essa? Trata-se de um processo complexo cujo método definimos como “Metanásia” – a moderna indústria que tem como meta a morte de milhares de pessoas todos os anos no Brasil – uma fábrica sem chaminé”.
De fato, essa violência desenfreada – tanto no trânsito como fora dele -, as vítimas fatais, o número incalculável de feridos, os dramas existenciais provocados nos sobreviventes precisam ser denunciados como crimes e crimes de guerra de nós mesmos com nós mesmos.
Nesta indústria, assim como no período nazista, também são selecionados os bodes expiatórios. Aqui, os mais pobres, os que tem menos recursos para prolongar suas respectivas vidas. E assistimos tudo isso como um fato natural, um grande espetáculo que banaliza a ideia de vida, a violência e os métodos de extermínios.
Diante de tanta barbárie o que fazer? O mundo dito civilizado se uniu novamente por meio da ONU e vem articulando ampla campanha de valorização da vida assim como fez contra o período nazista. Uma delas diz respeito ao Maio Amarelo que luta para reduzir esses números de vítimas no trânsito no Brasil e no resto do mundo. Trata-se, portanto, de uma oportunidade – durante um período do ano – para repensar a vida e seu valor imensurável.
Mas, além de louváveis iniciativas como essa, o que nos falta para viver dignamente e em paz? Ética? Respeito aos contratos sociais? Respeito ao Código de Trânsito Brasileiro? Também! E nos falta muito mais. Nos falta amor à vida, civilidade, fraternidade, solidariedade. Pois, quem ama não mata, quem ama não rouba a vida do próximo.
Talvez por isso que tanto a Organização Mundial da Saúde quanto a Organização Mundial das Nações Unidas passaram a incluir o trânsito, assim como a violência urbana, no pacote das crises humanitárias globais ao lado da luta contra o vírus Ebola e o drama dos refugiados.
Há por outro lado uma ideia errada sobre acidentes de trânsito – por exemplo. Acidentes de trânsito não são acidentais – e os provocados por armas de fogo, faca, etc? O carro sozinho não mata. A arma sozinha não atira. A faca sozinha não fere. Há inúmeros fatores que contribuem para isso e que deveriam ser tratados pela sociedade e o Estado com mais prioridade na origem de seu problema: o próprio homem e com sua falta de civilidade, a intolerância, o egoísmo, a irresponsabilidade, entre outros tópicos.
Bem esse é um assunto introdutório e que não pretendemos encerrar por aqui. Iremos ao longo da nossa jornada explorar o tema de acordo com o debate que ele poderá promover. Um abraço fraterno em todos e até o nosso próximo encontro se Deus quiser.
Bom dia Planeta!!! O Verão passou, a temporada de chuvas chegou e alguns dos nossos jardins enfrentaram e vivem momentos de grandes provações. Hoje eu gostaria de falar com vocês sobre os nossos jardins existenciais.
Ando por algumas ruas da cidade e junto aos muros percebo como algumas casas possuem lindos jardins com bonitas flores, rosas, gerânios, violetas, tulipas, gardênias, orquídeas, entre outras espécies, que exalam um perfume suave e que acalma a alma e acalenta o corpo.
Um jardim bem cuidado, por exemplo, atrai passarinhos, beija-flores, borboletas. Olha é lindo testemunhar os passarinhos cantando neste lugar. As borboletas aproveitam o embalo da música e dançam entre as plantinhas e mais a frente um beija-flor toca suavemente aquela que ele escolheu para um selinho.
Olha a vida dos seres humanos segue uma dinâmica parecida. Quantas pessoas, por exemplo, são como jardins. Bem cuidadas, exalam um perfume, um aroma que atraem outras pessoas também cultivadoras de viridários, quintais e bosques.
Há, por outro lado, algumas criaturas que nada tem haver com os jardins. Foram criadas em ambientes de concreto armado, quando muito decorados com plantas e rosas artificiais. Outras são alérgicas e vão se afastar destes locais. Já outros seres humanos construíram jardins com plantas ornamentais que não dão flores, mas espinhos. E aí a colheita será de outra ordem.
Aqui há algumas reflexões importantes. Muitas pessoas que desejam mudar sua maneira de ser iniciam um novo tempo, mas não cultivam os seus jardins existenciais e acabam se machucando, se frustrando, porque aquilo que mais desejavam não veio e não virá. Ora, é fato, que sem o cultivo de um jardim, de um ambiente favorável, as borboletas e os passarinhos não aparecerão.
Há um livro, na verdade um clássico da literatura mundial, chamado de “O Pequeno Príncipe”, do escritor Antoine de Saint-Exupery, que diz muito sobre tudo isso por meio de fragmentos preciosos como os que cito abaixo:
- “Se alguém ama uma flor da qual só existe um exemplar em milhões de estrelas, isso basta para que seja feliz quando a contempla.”
Em outro momento, o autor revela:
- “Foi o tempo que perdeste com a tua rosa que a fez tão importante.”
É importante, portanto, neste processo que você observe seus desejos, suas buscas, os caminhos que você percorrerá para a construção deste jardim, o que será plantado, cultivado e consequentemente o que será colhido. Cada escolha terá um destino e o destino será resultado desta escolha.
Bem, é isso. Esse tema não termina por aqui. O cultivo das flores é uma atividade que remota os tempos mais antigos, que tem muito a ensinar sobre as nossas relações e que inspira o prelúdio deste ensaio. Espero que tenha cultivado essa rosa para lhe ofertar nesta analogia que nos leva a refletir sobre nossas vidas – em um tempo tão complexo e frio. Até o nosso próximo encontro se Deus quiser.
O que é a certeza? O que é a incerteza? A ideia do primeiro evento tem uma relação com a segurança, a convicção, a confiança, a estabilidade, a constância. O segundo momento diz respeito a imprecisão, a dúvida, a dubiez, a falta de certeza. Para a filosofia, a ideia de incerteza tem um valor imensurável, ela funciona como um chamariz, um engodo, para alcançar novos níveis e possibilidades de conhecimento.
Sócrates, por exemplo, se considerava ignorante porque não tinha certeza sobre nada e afirmava que o conhecimento absoluto ou com certeza, só existia nos deuses.
Então, por que temos tantas dificuldades em lidar com a incerteza?
Não é uma pergunta fácil e que pretende uma resposta breve. Nosso cérebro não gosta de trabalhar com a ideia de incerteza. Nossa educação ocidental é cartesiana e simplificou a realidade em atalhos: certo, errado, verdade, mentira, quente, frio, cheio, vazio, belo, feio. E assim, nesta zona de conforto, imaginamos e acreditamos que a realidade é dividida em polos assim mesmo.
Ora, a ideia da simplificação da “certeza” parece uma ótima solução para o pensamento. Mas, não é o ideal. Pois, embora, a certeza pareça ser tudo, ela é bem menos que parece ser. A história humana está repleta de erros que nasceram na certeza e acertos que foram concebidos a partir da incerteza.
Em minhas palestras, quando trato sobre o tema, costumo convidar as pessoas à experiência de entrar na água, no rio, no mar. Perceba que ao entrar em um rio, ou no mar, você sente em seus pés a terra, o chão. Posteriormente, essa sensação desaparece e você é posto a prova para sobreviver. Nesta incerteza, nasceram a ação de nadar, a construção de uma jangada, a canoa, um barco, um navio, um submarino, entre tantas outras possibilidades.
Perceba que trabalhar com a incerteza pode ser uma forma muito mais profunda de navegar nestas águas e tentar conceber um outro olhar para compreender a realidade. E entender essa limitação torna nossas perspectivas maiores em relação ao Cosmo. É também uma oportunidade para crescimento, uma vez que a natureza não se preocupa com a perfeição ou a imperfeição, a certeza ou a incerteza, mas a suficiência.
Portanto, se entender menos perfeito do que você imagina ser, trabalhar com a incerteza do devir, entender que tudo é fluxo, poderá ser uma importante ferramenta para a construção de um ambiente melhor, um mundo melhor. Por isso tome muito cuidado com suas certezas. Elas são tão frágeis como a própria incerteza. Mas não há nenhuma dúvida que ambas – mesmo sendo derivações uma da outra, opostas, foram, são e serão fundamentais para a evolução humana.
Bem é isso. Um abraço em todos e até o nosso próximo encontro se Deus quiser.
Bom dia Planeta! Por que mentimos? Quem queremos enganar? Quais os objetivos por trás de uma mentira? Qual a intenção de quem inventa uma mentira? Seria uma falhar de caráter?
E você? Como você tem se relacionado com o tema?
A mentira é objeto de estudo da Filosofia. Sua origem é anterior ao nascimento do homem. No reino animal, por exemplo, um camaleão muda de cor de acordo com o ambiente que visita como uma forma de enganar seu predador. Plantas também simulam e até os vírus usam estratégias para enganar sistemas imunológicos de seus hospedeiros.
Assim como os animais, as plantas e os vírus, o homem passou a usar a mentira como uma estratégia de sobrevivência e uma infinidade de outras possibilidades.
Mas, será ético usar a mentira como estratégia de sobrevivência? Na natureza, por exemplo, um animal simular uma cena para roubar o alimento de outro animal é perfeitamente normal assim como na guerra, onde a primeira baixa é a da verdade. Todavia, será ético invadir um país, tirar a vida de seus filhos, roubar seus tesouros em nome de uma guerra construída por meio de um argumento mentiroso?
Olha esse é mais um tema de alta complexidade. Pois, embora na sociedade a mentira seja “oficialmente” algo abominável, detestável e que provoca repulsa, ela parece tão presente quanto a verdade nos relacionamentos.
Em muitos casos ela é até bem-vinda como, por exemplo, nas artes. E é tão natural no mundo lúdico da infância. Quantas vezes, por exemplo, quando éramos crianças, construímos estórias incríveis? E na adolescência, o pó da maquiagem no rosto da menina-moça não seria uma forma de mentir para simular a idade ou corrigir imperfeições?
Diante destes exemplos, dá para se ter uma ideia da dificuldade de contextualizar o tema. Embora, “pré-julgada” como ruim e não aceita por questões éticas e morais, a mentira parece ser a única saída diante de uma situação complexa.
Na família, quantos casamentos, por exemplos, são mantidos para salvar a sobrevivência dos filhos? Porque mentimos para nossos filhos sobre certos temas da vida? Na clínica, quantos diagnósticos são minimizados por médicos diante de seus pacientes? No mundo corporativo, quantos sócios se suportam diante de uma farsa? Na política, quantas inverdades são ditas na ordem do dia? Quantas vezes mentimos na última semana?
A mentira é, enfim, mais um tema complexo da Filosofia e discutir sua valia deve ser, portanto, uma forma de provocar nas pessoas uma reflexão sobre o seu uso ou não – suas limitações e possibilidades. É, portanto, um assunto que não se encerra aqui e muito menos adiante. Cabendo a cada partilhante um olhar muito particular sobre o tema e seu uso.
Bem é isso. Um abraço em todos e até o nosso próximo encontro se Deus quiser.
Pode parecer clichê. Todavia, não há como não repensar a vida de tempos em tempos, principalmente em momentos como a transição de um ano para o outro, seja numa conversão cristã, judaica, chinesa, islâmica ou em qualquer outro sistema étnico, civil ou religioso que opera a divisão do tempo - dividindo-o em anos, meses e dias a partir de influências como o Menino Jesus, a Lua, o Sol, entre outras variáveis.
Nesta transição muitas pessoas aproveitam a oportunidade para refazerem seus caminhos, suas jornadas existenciais, partes de suas vidas. Na filosofia, esse desejo de mudança tem muito uma relação com cada partilhante que analisa a viabilidade de construir ou reconstruir seus caminhos no novo período. Isso acontece de acordo com a vontade e o tempo de cada pessoa. E é muito particular de cada um.
Quando tudo topou na vida de uma pessoa, chegou ao limite, por exemplo, um dos procedimentos que o filósofo pode sugerir ao partilhante é a ideia da reconstrução. A reconstrução tem haver com refazer processos, rotinas, reestruturar a partir de um único elemento da malha intelectiva da pessoa questões, endereçamentos, situações e realidades.
Para isso é preciso estudar alguns elementos da historicidade de vida da pessoa. Há pessoas, por exemplo, que não sabem por onde recomeçar, refazer a partir de onde elas ficaram. Outras refazem seus caminhos a partir dos mesmos problemas que originaram suas quebras.
Um exemplo interessante sobre esse tópico transcrevo a seguir: uma pessoa, por exemplo, que constrói sua casa numa encosta, lá em cima do morro, se depara um dia, durante um inverno rigoroso, com uma forte chuva que acaba levando sua construção. O tempo abre, chega o verão, e aí ela retoma a reconstrução da mesma casa, no mesmo lugar e provavelmente terá que enfrentar os mesmos problemas em um outro inverno.
Neste caso, o ideal é nem reconstruir. Mas, realizar uma construção em um outro lugar. De fato, de nada valerá a reconstrução, pois ela perpetuará o mesmo problema dentro de um efeito borboleta cada vez mais complexo.
Há, enfim, muitas lições sobre o reconstruir e o construir de cada dia, de cada ano. Há pessoas que iniciam o ano dizendo que não irão mais beber, outras que não irão mais fumar, outras que realizarão dietas. E de repente, são vistas nos mesmos bares, nas mesmas cigarreiras e nos mesmos restaurantes que frequentavam no ano que passou ou no dia anterior.
E neste sentido, essa reconstrução dependerá de vários procedimentos que terão que ser realizados anteriormente ao próprio processo de recomeço ou construção de um novo tempo. E em muitos casos, como outros eventos da vida, pode não valer o esforço, dado os problemas que possa acarretar.
Este é mais um tema complexo da filosofia. Há um exercício que poderá orientar nesta reflexão, caro partilhante. Transcrevo a seguir:
- O que você tem feito com seu dia? Você é feliz? Com o que você tem gastado o seu tempo? Precisa mudar algo? Vive uma situação favorável? Vive um desconforto? Você usa seu dia com sabedoria?
Para ajudar nestes questionamentos, costumo usar uma referência de Dom Helder Câmara, grande sacerdote e pensador brasileiro, que costumava dizer que não existe diferença entre a criança, o adulto e o ancião para viver o dia que acabou de nascer. Eles terão pela frente o mesmo tempo, o mesmo dia. Viverá melhor, portanto, aquele que possuir sabedoria para realizar a travessia deste período de bem consigo mesmo, com a vida, com seus semelhantes e a natureza.
Bem é isso. Ganhamos um novo dia, um novo tempo, um ano novo. Que essa oportunidade nos faça melhor em todos os sentidos e até o nosso próximo encontro se Deus quiser.
Bom dia Planeta! Por esses dias mágicos que antecedem a Festa da Natividade do Menino Jesus tenho participado de encontros especiais, confraternizações, almoços, jantares e lanches cheios do maior sentimento que pode e deve ser manifestado entre os humanos: o amor.
Também é um tempo muito especial para passear, rever amigos, visitar a cidade da nossa infância, onde nascemos, o bairro, a rua da casa de nossos pais, os pais e familiares dos nossos queridos semelhantes e visitar pessoas e comunidades que ainda não conhecemos, levando palavras de amor e mantimentos para os novos Meninos Jesus que nascem a cada ano, longe dos centros urbanos e desprovidos de tudo.
E foi em um destes encontros, numa visita a uma instituição beneficente, que ouvi um lindo testemunho de um casal de idosos que estava próximo. Um dizia para o outro:
- Você é a melhor parte de mim. Eu te amo e amando você eu amo a mim mesmo! Levei anos para criar coragem e dizer isso para você.
E ao manifestar esse sentimento um para o outro, eles trocaram abraços e carinhos numa cena muito bonita.
Ainda durante o encontro, pensei em quantas pessoas passam pela vida e são incapazes de revelar essas palavras.
- Quanto vale a verdade que nos cala o desejo de manifestar o amor que sentimos ao próximo? E porque sentimos tanta vergonha em manifestar esse amor e essa dependência que temos em relação ao outro?
Muitas vezes a melhor parte da gente não está propriamente com a gente. A pessoa se desloca em um contexto, em uma realidade, para uma outra pessoa que lhe faz muito bem e não há nenhum problema neste deslocamento – inclusive na dependência do outro.
Há momentos, por exemplo, em que consultamos o coração da gente e não encontramos nada lá. Somente o deserto – por uma série de motivos. E nestes momentos, muitas vezes a melhor parte da gente está no outro que nos acolhe, nos abraça, nos complementa e nos ama. E não há nada de errado em ser assim, pensar assim e manifestar esse sentimento. Isso não resultará em perda de autonomia ou algo desta natureza. Pelo contrário, potencializará uma relação que será capaz de vencer os maiores obstáculos e provações existenciais.
Dependemos um do outro para viver em plena harmonia. Um coração vazio, sem amor, não tem sentido. Portanto, que não tenhamos vergonha de revelar a boa nova do amor ao próximo não somente com belas palavras, mas com afetos, obras e ações que validem nossos discursos.
Eis aí o grande milagre do Natal – Deus, que é Amor, se fez carne e habitou entre nós por meio da Virgem Maria no Menino chamado Jesus. Oxalá que essas manifestações sobre o Amor sejam realizadas ao longo de todos os dias no próximo ano e ao longo dos séculos, amém. Bem é isso! Eu amo o Pai Supremo e a todos vocês! Um feliz Natal e até o nosso próximo encontro se Deus quiser!
Bom dia Planeta! Vamos trabalhar hoje sobre algumas questões relativas ao falar e ao ouvir. Sempre que falo sobre o assunto na sala de aula ou numa conferência, gosto de iniciar o conteúdo com um poema muito bonito do compositor e cantor Oswaldo Montenegro.
Metade
Oswaldo Montenegro
Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio...
Observo que durante a fala do compositor algumas pessoas se prendem no toque do violão, outras na voz do cantor e outras pessoas vagueiam com olhar distante muito além do ambiente onde estamos. Poucas são, entretanto, as pessoas que estão presentes e em sintonia com os versos.
Olha isso é perfeitamente compreensível. Para cada pessoa, haverá sempre um valor, um tópico, que chame mais atenção de si do que outro. E assim acontece também nas nossas rotinas. O fato de uma pessoa ouvir a outra, por exemplo, não significa que ela esteja de fato conectada ao próximo. Na verdade ela ouve uma parte do discurso do outro e às vezes de todas as partes que ela ouve, ela vai responder com algum ruído a parte menos importante do diálogo com seu próximo.
Isso também acontece no fenômeno da fala. Muitas pessoas ao longo de suas vidas aprenderam a falar o que a sociedade dos homens quer ouvir, aprenderam a realizar as coisas de uma maneira que culturalmente são aceitas e com o tempo os lábios dessas pessoas se movem, emitem um som, mas suas falas não expressam mais nada.
Elas falam aquilo que elas falam e a própria pessoa que ouve tem a impressão que é algo vazio, ou simplesmente a ideia de um vinil arranhado que repete sempre a mesma nota, o mesmo verso. Normalmente elas trabalham com palavras chaves. Vamos para algumas ilustrações:
- Nossa que bacana! Sério? Caramba! Isso foi incrível! Você é o cara!
Como saber que é assim? Basta você perguntar o que acabou de dizer e provavelmente quem te “escuta” ficará sem resposta. Há pessoas que dependendo do nível de freqüência que estão e na relação do que está sendo dito por você, poderão responder algo muito chato, que machuca e que nada tem haver com o que foi dito. Nestes casos a surdez de quem ouve e a mudez de quem fala será o melhor caminho para o entendimento.
Bem esse é mais um diagnóstico do nosso tempo. Um tempo tão cheio de informações e ao mesmo tempo tão vazio de conteúdos existenciais e humanos. As pessoas estão ficando muito pouco no presente de suas vidas e então vagueiam entre seus pensamentos e os diálogos virtuais. Eu deixo vocês com os fragmentos finais dos versos da bela poesia do Oswaldo Montenegro e que diz muito sobre tudo isso. Até o nosso próximo encontro se Deus quiser.
Metade
Oswaldo Montenegro
Que as palavras que falo
Não sejam ouvidas como prece, nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas como a única coisa
Que resta a um homem inundado de sentimentos...
Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que mereço...
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais...
Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela mesma não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer...
E que a minha loucura seja perdoada
Pois metade de mim é amor
E a outra metade também.
Bom dia Planeta!!! Eu tenho visitado ambulatórios e hospitais psiquiátricos na cidade e acompanhado de perto casos bem interessantes e que ilustram um pouco o conteúdo que nós vamos tratar neste tópico sobre os enganos existenciais.
O primeiro deles diz respeito a um caso que acompanhei durante alguns dias em um hospital universitário na cidade. O cenário de uma enfermaria mostrava um senhor na cadeira de rodas ao lado de um jovem muito bonito e que confidenciava algo no ouvido do primeiro personagem da cena.
Qual seria a primeira impressão desta imagem para você?
Provavelmente diria que se trata de um momento especial na vida daqueles dois seres e temos aí um garoto cuidando de seu pai, tio, parente, amigo, etc. Todavia, com o passar dos dias, você se aproxima do caso em tela e percebe que nenhuma das hipóteses postas anteriormente tem validade. Trata-se, na verdade, de um pai, que é cadeirante e que acompanha seu filho na área psiquiátrica de um hospital. Um bonito exemplo para os nossos dias de hoje.
Na Filosofia Clínica, tratamos esses enganos existenciais como termos equívocos, ou seja, quando a pessoa em determinado contexto da vida, interpreta um símbolo, um cenário, que não parece ser de fato o que é.
Vejamos outro caso. Na academia estudamos que tudo nasceu no caos e posteriormente foi se organizando, ou caminha em vias de organização. É um tratado bem interessante. Mas, questionável.
Perceba que certas coisas estão justamente no processo contrário a essa trajetória. Uma pessoa, por exemplo, apresenta um comportamento confuso, equivocado, distante da realidade, e logo é posta em quarentena e submetida a pesados tratamentos complexos e químicos. E isso pode significar mutilações em sua alma, traumas irreparáveis diante daquele processo que poderia ser vivido naturalmente dentro do que definimos como área de passagem.
Essa certamente é uma das maiores características de nossa época. Desde o Renascimento, as vivências equívocas, aquelas que não são consideradas unívocas, tornaram-se extremamente “problemáticas” para o sistema e o pensamento padronizados. Em sua obra “História da Loucura”, o filósofo Michel Foucault coloca isso de uma forma bem clara ao defender a ideia de que as pessoas são cobradas a terem pensamentos maquinizados, padronizados dentro de um cabresto ideológico. Pensar fora desta caixa prisional pode ser muito perigoso. Daí tantos conflitos, tantas confusões. Mas, que terão que ser vividas, experimentadas para o aprimoramento das relações como elas são entre as coisas, as pessoas e o Cosmo.
Bem nós temos insistido muito em falar sobre esse tema aqui. Na verdade, tenho tratado dele em doses homeopáticas. Pois, trata-se de um tópico muito complexo. Mas, que serve como analogia no momento tão especial em que vivemos, principalmente aqui no Brasil – onde os discursos extremistas de um lado e do outro geram em nossas mentes tantas confusões, conflitos, distorções e crises existenciais profundas.
E talvez tudo isso seja natural dentro deste processo de maturação, reorganização do sistema coletivo assim como nos processos inerentes a alma, ao espírito e o natural fluxo da vida que temos que percorrer. E tudo isso certamente é o que “somos e o que podemos ser”, por hora, até que possamos chegar a um nível de compreensão mais profundo sobre sem necessariamente navegarmos em águas superficiais, ou muito profundas, profundas demais, que podem colocar a nossa embarcação em risco.
Enfim, sabemos muito pouco o que nós somos e menos ainda sobre o que podemos ser. É isso. É sempre muito bom participar deste momento com você. Até o nosso próximo encontro, se Deus quiser.
Bom dia Planeta! Durante um passeio recente à enseada de Ponta Negra - uma linda praia localizada no litoral Sul da cidade do Natal (RN), aqui no Brasil - fui a uma sorveteria que oferecia no anúncio três sabores de sorvetes em máquinas automáticas. Todavia, no caixa fui informado que somente estava disponível o sabor de chocolate, contrariando o meu desejo de experimentar o sabor misto que envolvia cacau e creme.
Lembrei desse momento para falar do período atual, que nos move a tomar importantes decisões, numa época em que estamos tratando de tantas questões relacionadas à política e ao futuro do país. Há elementos no exemplo anterior que devemos considerar. Um deles diz respeito à ausência de escolha, de opção. De um lado alguém deseja um sabor de sorvete e do outro lado a opção é um único sabor que não atende o anseio do cliente. Afinal, quais são de fato as nossas escolhas neste processo: pagar pelo sorvete de chocolate disponível na máquina ou esperar outro momento mais favorável para o primeiro fim?
Outro elemento interessante neste processo é a ausência de diálogos e de ideias. Não há, por exemplo, uma justificativa sobre o motivo que levou a máquina de sorvete a disponibilizar somente um sabor. Você simplesmente é convidado a participar do processo ou não, embora o anúncio admita que você tenha a opção de escolher entre os três sabores.
Há uma série de outras demandas que poderemos usar neste contexto para uma analogia com o processo político no país. Vamos imaginar, por exemplo, que ao contrário de uma sorveteria, você participe de um encontro com os candidatos. Neste encontro todos eles aparentam emitir um anúncio, mas não conversam com você. Eles falam de um tópico, anunciam os seus números e acreditam que realizaram uma razoável comunicação com você. Você por outro lado não tem a oportunidade de manifestar o seu desejo, o que de fato gostaria de falar. Não seria a mesma situação na sorveteria?
Embora o eleitor (consumidor) e o candidato (produto) admitam alguma forma de comunicação, isso não acontece de fato. E dependendo do emaranhado desta freqüência de sons e sinais pode até parecer que houve um diálogo comum, uma conversação. Mas, na verdade, tivemos apenas ruídos. São discursos distintos: eles precisam de seu voto para tocar um negócio bem remunerado e você acredita que, elegendo os candidatos postos, eles serão os seus representantes legais para tocar a ideia de um Estado livre e de oportunidade iguais para todos.
Com efeito, há ainda outras variantes bem delicadas e que poderão gerar resultados dramáticos, principalmente quando os discursos e enunciados tendem a roteirizar conflitos que irão muito além da falta de conversação e da ausência de ideias – promovendo a troca de insultos, agressões, prisões e até tentativas de assassinatos.
Olha é um momento muito complexo, muito delicado, que move a todos nós, pela esperança e pela fé no sentido de encontrar um caminho melhor para esta nação que sofre tanto com as ausências de escolhas, a falta de opção e a realização de um programa de ideias verdadeiramente democráticas e fraternas.
Enfim, o sistema até admite que você tem o direito de votar, mas o candidato posto na máquina tem um único sabor – o gosto amargo do chocolate. De que serve a nossa famosa liberdade de escolha quando a única escolha que temos não foi construída por nós? Bem é isso. Até o nosso próximo encontro, se Deus quiser!
Bom dia Planeta!!! Recentemente realizamos uma experiência com alunos de uma escola sobre a ideia do eu. Quem sou eu diante da vida? Quem sou eu diante do Universo? Usamos para auxiliar o experimento um espelho e uma caixa e estimulamos cada educando a realizar essa descoberta individualmente.
Olha, caro partilhante, os resultados alcançados foram os mais diversos. Alguns alunos se encantaram com a própria imagem, outros identificaram traumas em suas histórias de vida e outros mais se emocionaram diante da lâmina de vidro que refletia suas respectivas imagens.
Depois sugeri que cada estudante partilhasse suas experiências com os colegas e nestas narrativas avaliamos que muitos enfrentavam crises existenciais e formas de vidas semelhantes, mas não tinham consciência que os outros também passavam pelos mesmos dilemas. Estavam muito focados no seu próprio eu e tão cegos que não percebiam no outro a existência destes mesmos raciocínios.
Esse é mais um problema da cultura moderna. Uma cultura marcada pela subjetividade, uma cultura do sujeito, centrada no eu, no ego – inclusive nos momentos de profunda crise. É um tema, enfim, que vem sendo estudado na filosofia. E isso tem uma relação com o que nós entendemos como consciência de si ou consciência de mim, deste eu.
E, de fato, a ideia deste eu parece ser soberana, mais importante, do que a ideia da existência do outro. Parece, todavia não é e não deverá ser. Pois, de fato, ao olhar para o próprio umbigo, esse eu torna-se um problema ético.
Vejamos um exemplo muito prático. Temos no mundo mais de 7 bilhões de “seres pensantes”. Acreditar que esse eu – sozinho – é merecedor de um sentimento de alegria, bem-aventurança, satisfação em relação aos outros 6,999 bilhões de indivíduos é uma ideia egoísta, fruto de uma mente egocêntrica e de um ser profundamente individualista.
De fato, eu não sou e nem pretendo ser o centro do Universo. Há vários aspectos que poderíamos colocar nesta construção. Mas, seriam elementos muito particulares do meu eu. E isso iria contaminar uma reflexão mais autêntica e original do outro que lê essas breves linhas. E para não influenciar neste exercício, eu formulei algumas questões que poderão nortear um caminho mais saudável para a relação deste eu com o outro e do outro com o eu. Vamos para elas:
Como seria o mundo onde o centro do Universo fosse o outro? E se esse outro eu não fosse a ideia de ser propriamente o homem mas uma ovelha, um cordeiro, um gato, um coelho, uma árvore, um fruto, uma estrela, o próprio Universo? O que esse outro significa na minha vida? Por que para o eu viver o outro tem que morrer? Por que eu preciso construir o significado do outro? Por que o outro não poderia ser o centro do Universo?
Bem é isso! Esse é mais um tema muito complexo. Há vários aspectos neste experimento que irão muito além do eu e do espelho que reflete essa visão de mundo e cujos resultados não depende somente da minha consciência, a consciência do eu, mas de uma construção coletiva. Até o nosso próximo encontro, se Deus quiser.
Bom dia Planeta! Estamos enfrentando desafios enormes e os mais distintos dramas humanos em toda Terra. Não está sendo fácil para humanidade. Há pessoas, na verdade, milhões de pessoas que não estão suportando viver nesta realidade e estão em busca de uma saída química para enfrentar esses processos. É claro que um olhar mais atento a individualidade de cada um poderia nortear o emprego de “medicamentos existenciais” ou de “processos curativos naturais” bem mais interessantes do que os anteriores citados.
O medicamento existencial é um remédio diferente, tem outra densidade, outra composição, com fórmulas elaboradas, equacionadas na própria natureza a partir de uma visão muito superior de tudo que encontramos produzido pelo homem em laboratórios e na indústria química.
Houve um filósofo chamado Emmanuel Lévinas que enfrentou muitos problemas ao longo de sua jornada. Sua vida teve começo na Lituânia, na cidade de Kaunas (em 1906) e posteriormente por ser herdeiro de uma cultura judaica foi perseguido, deixou seu país de origem e seguiu para Ucrânia e posteriormente viveu um período na França, onde se tornou seguidor da filosofia de Henri Bérgson. O pensamento de Bérgson chamou muito atenção dele pelo conteúdo relacionado com noções sobre bondade, acolhimento, tempo e infinito. E o conjunto destes conceitos do pensador francês serviu como uma medicação de cura para angústia que Lévinas enfrentava.
Entre essa medicação estava o tratado sobre “O Poder do Riso”. De certa maneira, de certo modo, a leitura desta obra de Bérgson foi fundamental para a superação dos problemas que Lévinas enfrentava e os ensinamentos levados a reflexão e posteriormente a prática serviram como uma medicação existencial muito forte e eficiente para cura do pensador.
Com base neste exemplo é que eu queria pontuar aqui algumas questões e que poderão ser fundamentais no processo para evitar o uso de uma farmacologia química. A primeira questão é a ideia que o poder da palavra cura e sempre curou. E é, um método natural. A segunda questão diz respeito à ideia que além das palavras há outras infinitas combinações que são oferecidas e estão disponíveis nesta farmacologia natural.
O poder do riso, o poder de um abraço, o poder do amor, o poder de elementos naturais como o Sol, o mar, o ar, a terra são imensuráveis no processo de cura de muitas pessoas. Um banho de mar por dia, por exemplo, pode curar uma pessoa de seu drama existencial muito mais do que antidepressivo. O poder de um jardim bem cultivado pode proporcionar ao seu zelador e a quem passeia nele um benefício imensurável. E assim por diante nas infinitas possibilidades que o universo nos oferece.
Então, como saber qual a melhor medicação existencial para cada tipo de problema? Não há uma prescrição de uma medicação existencial específica e imediata para um problema enfrentado por uma pessoa.
A primeira grande lição que aprendemos na Filosofia é que aquilo que um ser humano sente, vive, faz é único e, portanto, deve ser respeitado e levado em consideração. Somente com o estudo aprofundado da historicidade de cada pessoa, pelo contexto que ela viveu e vive, é que será possível trabalhar uma medicação existencial, uma solução natural que ajude a organizar o seu pensamento e promova assim uma melhor qualidade de vida e bem estar para ela.
Bom dia Planeta! Tem uma música linda chamada “Amo Você” escrita pelos poetas Luiz Guedes e Tomas Roth e cantada por Peninha que fala “o que passou, passou não importa/Ficou do outro lado da porta/ Pra nunca mais”. Mas, será que o que passou, de fato, passou? Nosso tema de hoje vai decorrer sobre essa questão.
Nem sempre o que passou, passou. E isso ocorre com muitas pessoas e nos mais diversos lugares da Terra, independente de cor, credo, time de futebol ou etnia. Faz parte da condição existencial humana. E, portanto, se você carrega em seu caminho algo que aconteceu no passado e ainda não foi bem resolvido, não se assuste. Isso é assim mesmo.
Há pessoas, em vários casos, que sofrem muito com as vivências que não foram vencidas pelo tempo, à distância, o cansaço e todas as variáveis que norteiam o teorema que é a vida humana. Há, entretanto, outras pessoas para as quais certas questões já foram vencidas, ficaram pelo caminho e novos desafios entraram em suas vidas e elas estão bem resolvidas.
Certa ocasião em São Paulo (SP), eu participei de um bate-papo no Café Athenas, na Rua Augusta, no centro da cidade, sobre as memórias que carregamos na nossa mochila existencial. E lá eu conversei com algumas pessoas que carregavam muito peso em suas costas, fruto das lembranças que foram vividas ao longo de seus caminhos.
Uma pessoa particularmente chamou a atenção. Um empresário que não se perdoava pela quebra da sua empresa por uma série de questões que não estavam diretamente ligadas à avaliação da sua gestão no negócio, mas por fatores externos – como a crise econômica, dificuldades em adquirir a matéria prima para o seu produto, entre outras situações que não dependiam somente de sua boa vontade em tocar o empreendimento.
Os anos passaram e, posteriormente, em outro encontro durante temporada de férias em Natal (RN), ele falou que estava melhor, tinha criado um novo produto para o mercado e sua carreira no negócio caminhava muito bem. Mas, toda vez que falava sobre sua atividade, surgia em seu pensamento um mundo de sentimentos, mágoas, dores existenciais que não ficaram no caminho. E tudo isso provocava nele um profundo medo, pânico. Ele tinha receio que tudo pudesse se repetir em sua vida.
Isso era assim para ele. Outras pessoas não se perdoam, por exemplo, por fracassos no casamento, na vida acadêmica, nas opções de escolhas que fizeram para seus caminhos, entre tantas outras vivências não vencidas. Não há uma receita pronta para aliviar a dor de cada caso. Tudo isso vai depender da historicidade de cada partilhante e como se processam essas questões na sua estrutura do pensamento.
Lembro de um casal, ambos de boa formação acadêmica, que não podia conviver fora do momento do amor. Ela tocava piano e ele bebia e fumava muito. Os dados sensoriais, os sentidos, envolvidos em suas relações não eram harmoniosos. O som do piano perturbava a audição dele assim como o cheiro da bebida e do cigarro irritava o olfato dela. Combinaram então de cada um morar em seu próprio apartamento e marcarem encontros de vez em quando para se amarem longe do piano, da bebida e do cigarro. E assim essa relação completara naquele tempo trinta anos de convivência. É interessante observar como essa ruptura, esse afastamento, foi fundamental para aproximação dos dois. Em outros casos, o resultado poderá ser completamente diferente.
Bem é isso! Esse é um tema muito complexo, muito amplo, com muitas variáveis e possibilidades. Mas, em síntese, em muitos casos essas vivências são o momento, a parte que a pessoa mais vive no seu dia a dia e vai depender muito de cada um deixar isso no passado ou levar em sua mochila existencial ao longo da jornada extraordinária que é a vida. Um abraço para você, querido partilhante, e até o nosso próximo encontro se Deus quiser.
Bom dia planeta! Um jovem de 25 anos anuncia que está ouvindo vozes e visualizando imagens simultaneamente ao contato que mantemos com ele. O mais interessante é que estamos juntos no mesmo quarto de uma unidade de psiquiatria da cidade e não sintonizamos a frequência que nos levaria a audição e a visão deste partilhante.
O que acontece com esse jovem?
Provavelmente as respostas serão as mais variadas nos saberes que estudam esse e outros casos da mente humana. E hoje, mesmo diante de tantos avanços, a principal vítima desta falta de lucidez sobre o tema é o próprio partilhante.
Eu acho tremendamente injusto os rótulos sobre as pessoas. Cada um de nós é uma resposta ao meio em que vive. Podemos passar por crises existenciais enormes, traumas, alienações, felicidade, euforia, e isso não faz de alguém um louco.
A história humana é rica em literatura sobre o tema. Erasmo de Rotterdam no seu ensaio “Elogio da Loucura” mostra que os loucos não são aqueles que estão nos hospícios. Esses, de fato, são os mais sensatos. Para o filósofo, a loucura dá ao homem tudo que ele quer e pode fazer e afronta aos outros que pensam diferente.
Em outro ensaio, o filósofo Michel Foucault na belíssima obra “A História da Loucura” mostra que a “insanidade” surgiu muito mais como uma causa política do que saúde pública. Era muito mais interessante ao governo, a sociedade, a instituição, a família desacreditar sobre certas pessoas do que trabalhar com as ideias delas muitas vezes “importunas” e “incomodas”.
Mais recentemente, com a Idade Moderna, nasceu uma literatura voltada para o conceito de medicar com drogas as pessoas como forma de cuidar da “alienação” que vivem.
Mas, será essa uma forma correta?
Não tenho uma resposta para isso. Para alguns é interessante que existam conceitos como a loucura. Para muitas organizações isso gera receita, lucros imensos e é uma grande falta de ética, fora toda incompreensão em torno do assunto que cerca o tema. Todavia percebemos, que assim como no passado, as formas de relacionamentos com este partilhante não são as melhores. Faltam-nos recursos que estão além da própria técnica e as formas de relacionamento com o partilhante. Falo sobre o amor, a paciência, o acolhimento e a aceitação deste ser humano como ele é. E quanto mais natural for esse processo, melhores serão as respostas e a qualidade de vida para a pessoa e seus familiares.
Bem é isso. Não é um caminho fácil falar sobre esse tema que é complexo. Exige muito de todos nós e menos do partilhante que somente que ser respeitado em sua essência e conduta. É claro que desde que essa conduta não prejudique a si mesmo e ao seu semelhante. Até o nosso próximo encontro se Deus quiser.
Bom dia Planeta! Eu tenho visitado muitos lugares de prática religiosa - igrejas, templos, santuários - construções para experiência do que é sagrado, do transcendente. São lugares especiais, de vivência espiritual, de formação religiosa e experiências ricas com festividades, cultos e peregrinações que celebram a fé, a paz e o amor.
O nosso assunto de hoje vai decorrer um pouco sobre esse tema que está profundamente ligado aos mistérios de Deus. Muitos escritores e pensadores escreveram sobre essa proposição.
Alguns autores, como Agostinho, acreditam “que a fé precisa de compreensão”. E que sem a compreensão a pessoa tem dificuldade de exercer sua fé. Um pensador italiano chamado Ítalo Calvino admitiu que “a fé é uma visão das coisas que não se vêem”.
Há correntes filosóficas que sustentam a ideia de que a fé está muito ligada ao pensamento – aquilo que a pessoa pensa e que, portanto, a prática deste pensamento poderá levar a santidade. E é provado que cada pessoa tem sua forma de acreditar e viver sua crença e essas questões devem ser respeitadas, pois é uma visão muito especial de cada um e sua relação com Deus.
Quando encontro os religiosos nestes espaços sempre gosto de formular algumas perguntas para reflexão:
- Como se deu o processo de sua fé?
- Como se deu o processo de escolha por determinada religião?
- Como chegou até ali?
Os depoimentos são muito ricos. Há pessoas que relatam que conseguiram uma cura para uma enfermidade. Outras que estavam enfrentando grandes dificuldades na vida, outras que perderam tudo, pessoas queridas, que ficaram sozinhas no mundo e que se agarraram com a única esperança de uma vida digna e harmoniosa que é a fé em Deus, entre outras experiências lindas e maravilhosas.
Outro aspecto interessante nesta relação é o bem estar que o exercício espiritual proporciona aos seus praticantes. Há pessoas que focam um objetivo, tem fé e realizam essa chegada com muito esforço e graça divina. Outras pessoas possuem uma relação de cobrança com elas mesmas no sentido de serem humanos melhores, menos hostis, mais acolhedores.
Enfim, esse é um tema muito complexo. E, certamente, não cabe aqui um exercício mais amplo sobre o assunto. Todavia, lembro de certa ocasião em que uma senhora me disse que só passou a vivenciar mais sua fé quando deixou de teorizar a respeito e passou a viver sua prática baseada no amor e na paz entre seus semelhantes. Interessante observar que isso aconteceu não porque desistiu de estudar o tema, mas porque ao longo dessa trajetória de busca ela esquecera de viver a prática do que tinha conhecido nas palavras sagradas.
Bem é isso por hoje. Ame mais, promova a paz e o bem e que o Senhor nos ajude em nossas necessidades, corrigindo em nós o que desagrada a Deus, nos ajudando mutuamente e despertando em nós o amor uns para os outros e o amor dos outros para todos. Até o nosso próximo encontro, se Deus quiser.
Bom dia Planeta! Vivemos um mês dedicado a mulher. Um mês certamente de muitas reflexões. A história humana é cheia de mulheres extraordinárias e que realizaram obras extraordinárias em suas jornadas. O nosso assunto de hoje vai transcorrer sobre esse tema.
Há mulheres que, por mais que as pesquisemos, não temos como desvendar o mistério de sua essência. São seres complexos, mas que precisamente sem elas o homem não seria humanizado. Pois é da acolhida no ventre, passando pela catequese para o bem e a paz nos primeiros anos de nascimento e depois na juventude, que o homem levará consigo todos os ensinamentos de sua mãe, avó, tia ou quem dele cuidou para ser gente.
Há homens que não aprenderam com suas mães, avós, tias, por uma série de fatores, todavia se transformaram em grandes esposos amando uma mulher e vivendo a missão de constitui uma família fundamentada na paz e no bem entre os seus e seus semelhantes.
É por meio da mulher que o mundo se humaniza. E nela, por meio de Maria – a representação maior de uma mulher - que o Verbo, em forma de amor pleno, se fez carne e habitou entre nós.
E somente por meio deste amor é possível transformar o mundo e viver experiências plenas como a fraternidade, a igualdade, o respeito, a solidariedade, a docilidade, a paz na alma, a harmonia entre os corpos, enfim, tudo aquilo que melhor se propõe para a construção humana.
Apesar de sua grandeza, a terminologia e o sinônimo da palavra não foram capazes de definir a altura o significado maior de ser uma mulher. Os dicionários as classificam como: “mamífero, fêmea, bípede, sociável, que, tal como o homem, se distingue de todos os animais, pela linguagem verbal e pelo superior desenvolvimento intelectual e que se distingue do homem pela capacidade de engravidar, ser mãe natural ou adotiva”.
Com lemos, a mulher pode ser tudo isso. Mas, ainda assim, será uma definição singela, humilde, de menor valor diante do maior sentido que a própria palavra e sua ação são. E aqui, ensaio uma máxima – a partir de um anúncio que produzimos em conjunto com o cartunista Hamilton Rangel para uma campanha publicitária na cidade do Natal – e que diz o seguinte: “A mulher é o que é: sinônimo de amor!”
Ora, se a ética, por exemplo, é a imitação do amor. A mulher é a mais pura forma do amor. E sem amor, não chegaremos, ao exercício pleno de ser humano, de viver uma vida harmoniosa e feliz. De fato, o sentimento de amor é maior na mulher. Gostaria de saber amar como ama uma mulher, de viver e ser governado pelo amor em sua forma plena. Que saibamos, enfim, aprender a cada dia mais sobre a mulher e, conseqüentemente, sobre o amor.
Bem é isso! Ame mais, promova a paz e o bem. Até o nosso próximo encontro se Deus quiser!
Bom dia Planeta! Esperei o Carnaval passar para falar um pouco sobre a ideia do tema em tela que muito tem sido discutido nas universidades, na vida pública, na vida privada e entre nós antigos foliões.
Esse é um conceito bem complexo e vai muito além do certo ou errado, do bem e do mal, da conduta positiva ou negativa e da análise dos critérios que define esse julgamento. Será que o entendimento sobre Ética está somente ligado a um conjunto de regras? Será que de fato precisamos da Ética para viver? É claro que esse é um olhar muito particular de cada um e do coletivo onde estamos inseridos.
Todavia, é preciso avançar neste argumento e propor novas possibilidades. Independente de qualquer código de conduta que norteia um país, uma organização social, o exercício permanente da ética não deve ser dogmático, um método fechado de regras rígidas e inflexíveis, mas um processo construído coletivamente e permanentemente aberto por meio do diálogo e o respeito entre todos.
Há vários momentos, ao longo da história da humanidade, por exemplo, que a Ética não foi nem convidada para participar. A caminhada do homem na Terra é repleta de rupturas neste contexto. Rupturas culturais, geográficas, religiosas, políticas, econômicas, militares, entre outros acontecimentos, que levaram os estudiosos a questionar se, de fato, merecemos ser chamados de “humanos”.
Em outros momentos, mesmo em face de um grande tormento como é uma vivência em período de guerra, há “lições de humanidades” proferidas em quartéis que ensinam aos soldados, por exemplo, que não se deve atirar em um paraquedista enquanto ele estiver no ar. As contradições neste discurso são enormes como a própria guerra e a cessação dos preceitos morais.
Escrever sobre ética nunca foi um tema fácil. O ideal é procurar outros caminhos para atingir um fim menos traumático. O valor da Filosofia neste processo está em iluminar não apenas aos que se encontram perdidos nesta busca, mas, sobretudo, desconstruir as certezas dos que estão convictos sobre o que de fato seria ético ou não.
E neste sentido, a filosofia pode propor aqui um novo olhar sobre essa questão realizando uma provocação em forma de pergunta: - Será que se tivéssemos mais consciência sobre o exercicio da igualdade, da fraternidade, da solidariedade, da honestidade, entre outros valores universais e inalienáveis que nos tornam “humanos”, necessitaríamos da Ética?
Enfim, pensar uma possibilidade de valor sobre a Ética no dia a dia das pessoas é pensar em um princípio moral para além dos imperativos ou das emoções, é ir muito além dos postulados e do consenso do que significa a própria Ética. E essa é uma construção que sozinhos não iremos realizar.
Bem é isso. Depois do Carnaval e tantos excessos, é tempo de repensar a Ética, buscar novos horizontes que nos ajudarão a melhorar nossas relações com o próximo e as nossas condições de vida. Até o nosso próximo encontro se Deus quiser.
Bom dia Planeta! Tenho recebido alguns e-mails tratando do mesmo tema: as férias. Do latim “feriae” (dies festus), a celebração do ócio.
Algumas pessoas relatam que, mesmo diante de cenários paradisíacos e boa companhia, não conseguem relaxar. Outras pessoas admitem que, mesmo longe da labuta, na temporada de veraneio sentem falta de suas atividades. Já outras pessoas revelam que ficar longe do trabalho ou dos estudos por um tempo do ano é uma bênção. Outros gostariam até de não mais voltar à rotina.
Bem todas as construções são válidas, bem interessantes e dependem muito da visão de cada um. Há pessoas que amam o que realizam e no ambiente em que trabalham são felizes. Outras pessoas estão envolvidas em atividades que nada tem em comum com elas e contam as horas, os dias, para chegar o feriado, o fim de semana e as férias. Isso é assim mesmo e sempre foi ao longo da história humana.
Na Grécia antiga, por exemplo, o ócio era vislumbrado como um momento fundamental à filosofia e as artes. Sem ócio não era possível a filosofia e consequentemente as artes. Para o filósofo Aristóteles, a ideia de ócio estava ligada a condição de estar livre. Posteriormente, os romanos destacaram o ócio como “um intervalo entre suas atividades.”
A ideia de problematizar o “ócio” como atividade menor é mais recente. No senso comum circula um adágio que diz que “o ócio é pai de todos os vícios”. O jornalista e filósofo Benjamin Franklin, aquele da Declaração da Independência e da Constituição dos Estados Unidos, admitiu que “o trabalho dignifica o homem”. Já na Alemanha, durante o regime nazista foi construída uma máxima de que “o trabalho liberta” - frase soldada nos portões na entrada dos campos de concentração.
Todavia, e as férias? O tempo dedicado ao ócio? As férias humanizam o homem. O homem não é uma máquina para trabalhar sem uma pausa. Na teologia, até Deus descansou no sétimo dia! Então, não tenhamos qualquer paranoia de viver o ócio.
O pensador Berthand Russel publicou um fabuloso ensaio denominado de “Elogio ao Ócio” (1935), no qual destaca que é preciso saltar do senso comum para enfrentar a velha sociedade industrial – e porque não a atual era virtual que escraviza mais que a anterior?
Enfim, férias são férias, dias de festas e celebração da vida. Há um verso do poeta Ascenso Ferreira (1939), recitado pelo escritor Júlio Ramenzoni, que diz: “Hora de comer – comer! Hora de dormir – dormir! Hora de brincar – brincar! Hora de Trabalhar? - Pernas pro ar que ninguém é de ferro.”
Bem é isso. É tempo de caminhar na praia, férias, desejo um veraneio bem feliz para todos e até o nosso próximo encontro, se Deus quiser!
Bom dia Planeta! No nosso último encontro falei sobre caminhos, trajetórias, trilhas que as pessoas percorrem durante suas buscas existenciais e perguntei: como seria refazer esse caminho, voltar, retornar?
Na filosofia esse processo é denominado de “retroação” e tem um significado muito especial. Diz respeito ao ato ou efeito de retroagir, de voltar à condição anterior, retornar ao passado.
Na verdade é um processo bem mais seguro do que seguir para o futuro.
Como? Por uma série de fatores, entre eles a máxima que “aquilo que você tem consciência que viveu lhe proporciona um controle se, por ventura, em outro momento ocorrer no futuro. Diferentemente, do inédito, daquilo que você não tem consciência do que virá pela frente.
É claro que essas retroações poderão ser positivas, neutras ou negativas. Uma pessoa, por exemplo, que vive um momento de crise existencial, deseja retornar a um período no qual as disposições lhe pareciam tranquilas. Todavia, para refazer esse percurso, entre outras variáveis, a pessoa precisa ter consciência de onde está existencialmente e o sentido de ir e vir desta jornada rumo ao que objetiva.
Sem essa consciência de onde se situa existencialmente, a pessoa pode caminhar achando que segue para próximo de algo que deseja, enquanto na verdade executa movimentos que a afastarão mais e mais de seus objetivos.
Conheci alguns judeus sobreviventes do Holocausto e que ano a ano – durante suas viagens de férias – retornavam a Alemanha para visitar campos de concentração e extermínio. Estavam livres fisicamente daquela maldição. Todavia, se encontravam presos existencialmente naquele período com a máxima de que “era preciso lembrar sempre o passado, para que ele não se repita – Holocausto nunca mais!”
É claro que para alguns judeus, esse retorno poderá ser motivo de insônia, pesadelo, de reencontro com as atrocidades do Nazismo e isso será muito negativo para eles. Mas, usado para o propósito de denunciar ao mundo o que ocorreu ali, o passado passa a ser vivo no presente e tem a finalidade de conscientizar nações e lideres para que o genocídio nunca mais se repita.
Há, por outro lado, retornos maravilhosos, nascidos em verdadeiros contos de fada. Conheço casais, por exemplo, que de período em período retornam para lugares onde se conheceram ou realizaram viagens de lua de mel. É um momento harmonioso, feliz, de renovação das alianças em torno do amor e que tem o objetivo principal de fundamentar e pavimentar o caminho que se seguirá pela frente.
Enfim, muitas vezes é possível retornar e permanecer neste melhor que passou. Muitas vezes não é. E em outros momentos não fará nenhum sentindo, principalmente se e essa busca significar perdas tremendas diante de benefícios mínimos. Não valerá a pena.
Bem, é isso! Fim de ano chegando, nascimento de um novo período. O momento é favorável para essa reflexão. Feliz ano novo e que Deus torne 2018 um ano mais harmonioso, de muita paz e muito amor para todos nós.
Bom dia Planeta! Tenho caminhado muito neste período do ano. A cidade oferece parques ambientais, uma orla urbana com calçadão, praças, alamedas, enfim, uma estrutura que colabora com as práticas esportivas e que ajuda também na atividade intelectual e nas reflexões sobre a vida, o mundo e como estamos lidando com a realidade de cada um.
Outro dia no Parque da Cidade, caminhei por uma linda escadaria que leva a torre principal de sua estrutura administrativa e durante o percurso alguém falava com o outro sobre a importância de seguir o caminho com os pés no chão e vivendo dentro da realidade.
Interessante como no próprio caminho observei cenas que questionava a construção do diálogo anterior entre os dois amigos. Cada pessoa tem um estilo muito particular de andar em seus caminhos existenciais. Algumas pessoas subiram as escadarias cantando, outras contando cada degrau, outras dançando, outras pessoas aproveitaram para imortalizar o momento numa imagem e outras foram rapidamente ao topo.
É claro que diante desta perspectiva, as possibilidades de fazer esse mesmo caminho são inúmeras e depende da vivência de cada um. Há quem faça outras coisas. Algumas pessoas subiram ao topo, por exemplo, rezando com o terço na mão. E eu meditava sobre o significado de caminhar aqui e como, de fato, cada pessoa tem um estilo muito próprio de realizar seu caminho pelo mundo.
Cada ser humano tem uma forma de caminhar muito particular neste grande labirinto que é a vida e tem a capacidade de escolher a maneira como será realizada essa trajetória. Não há uma fórmula pronta para construção deste caminho. De fato, não existe um programa pronto que defina qual a melhor maneira de seguir na estrada. A construção deste caminho é uma experiência única de cada pessoa.
O importante é focar que estamos aqui para passar momentos agradáveis. É bem verdade que não vivemos no melhor mundo possível e que no meio do caminho há pedras, mas também há flores e talvez nenhuma das possibilidades anteriores. E daí? É vida, viva então! Se a realidade não corresponde ao conceito que você escolheu, pior para realidade – desde que sua maneira caminhar não prejudique ao próximo e tudo que existe no meio ambiente. E isso não é nenhum problema.
E descendo as escadas? Refazendo o caminho? Como seria isso para você?
Bem esse é um tema para outro momento. Um abraço em todos e até o nosso próximo encontro, se Deus quiser.
Bom dia, Planeta! Hoje eu vou conversar sobre um hábito que gosto muito de realizar. Os encontros e diálogos que realizo com amigos nas praças públicas e parques da cidade, principalmente nesta época do ano com a chegada da Primavera.
Depois da labuta, costumo caminhar nos jardins públicos, ouvindo as pessoas, os passarinhos, observando seus ninhos, os sons de felicidade de seus pequeninos filhotes, tocando as árvores, pousando para uma fotografia, sentido o cheiro das flores, testemunhando o passeio do sol calmamente em direção ao poente, os estudantes retornando para seus lares, outros saindo para estudar, passear, namorar, celebrando a vida em seu sentido mais amplo.
Gosto demais de tudo isso também porque você não precisa pagar nada para entrar, ou quase nada. A grande sacada é que estamos ali para encontrarmos, de fato, com quem gostamos de conversar, brincar, viver. E esses momentos são sempre festivos e harmoniosos.
Você já reparou como as pessoas são livres na praça pública e no parque? É impressionante como as pessoas se sentem libertas de suas paredes, habitações, casas, apartamentos, redes sociais e afins.
A cidade onde moro tem praças e parques interessantes e inspiradores. Particularmente, tenho um carinho muito especial pela Praça Cívica – antiga Praça Pedro Velho – no bairro de Petrópolis. O lugar é um imenso espaço aberto cuja vocação principal é promover o encontro das pessoas, das famílias, e que conta com um passeio agradável e um jardim muito bonito.
Muitos filósofos e artistas, em suas homenagens aos espaços públicos, recordam boas lembranças sobre o que esses lugares acrescentaram em suas caminhadas e reflexões. Eu tenho um amigo, o escritor e poeta Júlio Ramezoni (clicado acima por Jacinta Faria) que construiu parte de sua obra em andanças meditativas por esses lugares. Ali ele ouviu “O Extraordinário Grilo Falante”, descobriu “As Aventuras de Panduso” e toda a poesia de suas composições musicais.
Outro poeta extraordinário, inspirado por um dos seus passeios nos jardins, o compositor Genival Cassiano dos Santos, escreveu os versos da canção Primavera, um clássico da MPB, imortalizada pela voz do Tim Maia e que diz: “Porque (é primavera)... Te amo, meu amor... Trago esta rosa (para te dar)”. Conheço casais que começaram a namorar depois de um encontro na praça, outras pessoas ficaram amigas depois de uma boa conversa no banco de um largo público.
Tudo isso ajuda a viver, é uma gentileza para o corpo e para a alma. E assim a vida segue em perfeita harmonia nos jardins, embaixo das árvores, na grama, celebrando o amor, tudo que respira e não respira. Tudo que inspira, encanta e fascina e outras possibilidades mais que pelo andar das linhas que escrevo não devo demorar. Pois, é hora de concluir, sair para caminhar. É Primavera. Há quem faça outras coisas nesta estação. Eu, particularmente, gosto de caminhar nas praças e parques públicos.
Bom dia Planeta! Na crônica de hoje vou falar sobre os caminhos que percorremos em busca de um sentido para a vida. Há uma reflexão muita bonita do poeta, compositor e cantor Bob Dylan no filme “No Direction Home”, do diretor Martin Scorsese, que trata sobre o tema e acho oportuno compartilhar aqui com vocês:
- Eu pensava em sair pelo mundo e encontrar uma jornada de retorno para algum lugar. Eu tentava encontrar aquele lar que deixei há muito tempo e não conseguia lembrar onde era, mas eu estava a caminho. E depois de tudo que me deparei pelo caminho, percebi tudo. Eu não tinha nenhuma ambição. Nasci muito distante de onde eu deveria estar. Então, estou voltando para casa, entende?
Refletindo sobre esse fragmento é possível imaginar quantos seres humanos passaram por esse momento diante de suas vidas e quantos passarão. De repente, todo aquele mundo lúdico de criança, de brincadeiras, brinquedos, fantasias é retirado e nasce a obrigação de lutar para encontrar um caminho que possa ser viável existencialmente. Muitas pessoas se perderam nesta passagem, outras passaram sem maiores problemas.
Na filosofia é muito usual que a gente encontre associações entre as coisas do ambiente, do cotidiano e as coisas do pensamento. Os filósofos trabalham muito com esses recursos. Nestas relações entre o pensamento e o mundo do dia a dia há elementos que ficam presos na memória, mas que estão muito longe da pauta cotidiana da nossa reflexão. Todavia, é preciso aflorar tudo isso, trazer à superfície.
São memórias adormecidas no tempo da infância e que aparentemente parece não fazer nenhum sentido, mas que podem ser determinantes na busca deste caminho de volta para casa, onde nos sentiremos mais seguros e felizes. E isso não tem nada em comum com possuir ou não riquezas, bens, alcançar o sucesso, etc.
Tenho encontrado muito jovens nas faculdades, por exemplo, que ainda não sabem se seguirão nas áreas que escolheram. Outros que estão realizando determinados cursos porque os pais queriam e outros que na verdade desejavam a poesia das artes, mas que estão diante do dilema de ser ou não ser.
Eu não tenho uma receita para resolver esse dilema. Todavia, é impressionante a diferença que faz a chama de uma vela, tão frágil, diante da escuridão. Um bom exercício neste sentido é examinar melhor a infância. Buscar os lugares onde viveu você menino, os amigos, as brincadeiras, etc. A vivência neste mundo lúdico, tão pequeno diante da imensidão do universo, abre possibilidades inúmeras. Há horizontes imensos mostrando caminhos para um reencontro com uma vida plena e feliz.
Conheço amigos, por exemplo, que adoravam brincar de médicos e que hoje são excelentes profissionais da saúde. Outros que adoravam contar uma história e seguiram escrevendo livros com histórias lindas e maravilhosas. Outros que cantavam desde muito cedo e se tornaram compositores, outras se tornaram bailarinas, atrizes e seguiram para vida vivendo uma eterna infância. Claro que há muitas outras variáveis aqui e que poderão mostrar outras possibilidades para enfrentar melhor essa busca. Todavia, o importante é não perder esse olhar de menino e de menina diante do mundo que nos apresentam. Bem, é isso. Até o nosso próximo encontro.
Bom dia planeta! Qual o seu limite? Até onde você pode caminhar? Hoje eu vou falar sobre a ideia de limite e as armadilhas conceituais. Os limites existentes na vida de um ser humano podem ter naturezas completamente distintas e podem ser determinantes conjuntamente com as armadilhas conceituais no aprisionamento existencial de uma pessoa.
É clássica aquela frase em que o partilhante diz:
– Eu nado, nado e não saio do lugar. Parece que minha vida anda em círculos!
Há pessoas também que acreditam que são de fato os conceitos construídos por seus amigos, chefes, colegas de turma, de trabalho, etc. Há pessoas, por exemplo, que foram rotuladas como loucas e elas acreditam que são loucas. Outras foram conceituadas “menos inteligentes” e outras mais como incapazes, etc.
Nestas analogias temos uma série de exemplos que poderão ser bons ou ruins para o partilhante. E, dependo destas definições e como elas são recebidas, isso pode ter uma influência direta na construção ou destruição da estima do indivíduo.
É bem provável que se uma pessoa acreditar que esse conceito, esse limite, é assim mesmo, ele acabe deixando realizar uma série de metas em sua vida. Já a pessoa que acredita que não é bem assim ultrapassará seu próprio limite.
- Mas, afinal como você encara tudo isso?
Eu tenho falado sobre esse tema nas praças públicas, nas escolas e faculdades que visito. Os limites, as armadilhas conceituais, criam oportunidades para superação. A história dos vencedores é repleta desta validação. E se eles foram além, é possível que você seja capaz de superar também tudo isso.
Há um caminho dividido por um lindo jardim no Campus do IFRN em Natal (RN) que costumo usar como referência para fuga destes conceitos. Trata-se de uma subida íngreme, uma escada que leva ao saber, e que tem que ser enfrentada dia a dia ao longo de anos por seus alunos e uma vida inteira por seus professores e funcionários. É provável nesta perspectiva, compartilhada com esse lindo jardim que é a vida, que ao lidar com essas questões o desafio maior de cada um é vencer a si mesmo assim como os conceitos alheios que nada dizem de fato sobre você. Bem é isso. Até o nosso próximo encontro.
Bom dia Planeta! Eu tenho recebido alguns emails que tratam do tema central deste texto. Muitas pessoas estranham hoje como o amor, as amizades e as relações se transformaram numa vivência permanente de interesses.
O pensador polonês Zigmunt Bauman no livro “Amor Liquido” fala que “vivemos tempos líquidos, nada é para durar”. É certamente mais uma construção coerente neste mundo contemporâneo. As relações se caracterizam por sua fragilidade, diluem e escapam diante de qualquer conflito ou com qualquer desculpa e normalmente tem o final mais próximo do que o esperado.
Algumas pessoas, por exemplo, partilham o amor e em troca desejam receber mais amor. Outras pessoas procuram os amigos diante de situações complexas e quando resolvem seus problemas retornam as suas respectivas ilhas de segurança. Há ainda outras pessoas que organizam grandes eventos para celebrar o amor reunindo amigos por meio de uma escala de valor – onde os vetores que apontam essa medida nada têm com a ideia de fraternidade.
Olha, esse é um problema bem complexo para tratar aqui. O mundo vive um tempo bastante distinto e algumas relações são assim e outras não. E, é claro, que neste contexto isso será bom para uns e outros não. Vai depender da visão de cada um.
Certamente há pessoas que não se sentem confortáveis diante dessa realidade. Outras pessoas admitem que o mundo seja assim mesmo. E outros indivíduos entendem que é somente mais uma relação de interesse, etc.
E o amor como fica?
Existe um fragmento de uma antiga canção atribuída a São Francisco de Assis que pode ser usado como analogia nesta reflexão:
“Ó mestre, fazei que eu procure mais consolar que ser consolado
Compreender que ser compreendido
Amar que ser amado...”
É isso! A possibilidade da vivência do verdadeiro amor, de uma verdadeira amizade deve ser “desprovida” (carente) de qualquer interesse. E essa relação deve ser norteada sempre pela doação, pela entrega e a assistência aos que necessitam da gente – independente de ser o próximo ou não, independente de receber ou não nada por esse amor, essa doação.
Bom dia! Junho chegou e muitas pessoas falam que o tempo anda mais curto que antigamente e não encontram mais uma hora para viver dignamente. Trata-se, portanto, de uma questão existencial bem interessante e que merece uma reflexão da filosofia.
- O que de fato acontece?
No mundo contemporâneo, muitas pessoas atuam no piloto automático. Acordam, tomam café, estudam, trabalham, realizam um lanche entre o período da manhã e da tarde, retomam suas jornadas até o final do dia e depois retornam para suas casas cansadas e dormem. Depois acordam e começam tudo outra vez em um desperdício de tempo e de vida que nenhum dinheiro do mundo é capaz de remunerar a altura do tesouro que é própria existência.
Com o passar dos anos, essa rotina é tão cega que as pessoas não percebem mais que estão deixando de viver, perdendo tempo precioso e realizando apenas atividades básicas para manutenção do custeio de suas respectivas rotinas, tornando a vida assim limitada e sem um significado maior de celebração. Exatamente por fazer tudo sempre igual todos os dias, ao longo dos anos, as pessoas vão se entregando, o amor começa a adormecer e a vida começa a morrer.
- O que fazer?
Não é preciso uma revolução para mudar tudo isso. Em geral pequenas atividades fora desta rotina diária podem devolver a dignidade da vida e restabelecer a ideia de viver plenamente o amor.
Um bom exercício para isso, por exemplo, é passar no jardim, antes do desjejum, e colher uma rosa para oferecer a esposa, o esposo, durante o café. Outra possibilidade é o uso da poesia, se isso tiver sentido e um significado muito especial para a pessoa que está do seu lado.
Enfim, existe uma infinidade de exercícios existenciais que podem restabelecer o prazer que é viver o amor em sua plenitude e que nada tem haver com a rotina da jornada que se refere à labuta, à busca por dinheiro, à fama e as coisas do mundo do trabalho.
Há quanto tempo, por exemplo, você não escuta uma música que ouvia com seu amor? E o cinema? Qual foi o último filme que vocês assistiram? E a caminhada na praça? O passeio no calçadão, na praia? A conversa com os amigos? Estas pequenas ações podem ajudar a devolver o tempo perdido e a recuperar a vitalidade do amor e a celebração da vida.
Experimenta! Aproveita que junho chegou com tantas datas bacanas - o dia dos namorados e as festas juninas - e surpreenda!
Bom dia! Eu tenho uma imagem antiga, ainda do tempo da minha infância, de uma garotinha que se vestia muito bem nas tardes de domingo e aparecia lá em casa para alegria da minha avó Geni que elogiava a sua beleza e a sua elegância.
Eu estou falando sobre isso porque é tão natural como usar o espelho para identificar a si mesmo, algumas pessoas recorrem à ajuda externa: clubes de classes, academias, amigos, conhecidos, álbuns de família, fotos, imagens postadas em redes sociais, vídeos, realizações, compras de bens materiais e títulos para validar e justificar a sua existência – feliz ou não.
É claro que tudo isso faz muito bem a alma. Mas, também pode prejudicar. Nem sempre o espelho que uma pessoa usa é o melhor ou é o verdadeiro. Algumas vezes a pessoa se mira em um espelho e o entendimento é completamente diferente do que realmente ela enxerga.
A vida está cheia de exemplos sobre isso. Uma pessoa com anorexia, por exemplo, vai olhar para o espelho e encontrar uma pessoa mais corpulenta do que realmente é. Já um ser corpulento pode muito bem encontrar no reflexo da sua imagem um ser humano mais esguio do que é. Tem uma imagem que circula na internet de um gatinho olhando para o espelho e neste reflexo ele imagina ser um leão. O conteúdo é uma construção bem clara do que retrato aqui em tela.
Há outros espelhos bem mais complexos do que os tradicionais. Usamos esses espelhos por meio do olhar dos outros. Na verdade, a partir da ideia do outro sobre si, você é capaz de ser reconhecido e reconhecer. Vamos aos exemplos práticos: o clube de milionários, o baile das mais elegantes e a academia dos notáveis.
Enfim, as analogias e possibilidades sobre esses casos são inúmeras e merecem nossa atenção e uma reflexão mais profunda em momento mais oportuno, principalmente quando envolve riscos à saúde física e mental. Pois podem se tornar um problema ao longo dos anos.
Todavia, com base nestas breves fundamentações, eu pergunto: será que você precisa da aprovação do outro (espelho), ou de qualquer objeto ou instituição, para ser o que é? Para algumas pessoas isto tem um peso muito grande, sendo inclusive uma orientação para a sua vida. Para outras não e não faz a menor diferença.
Sobre essa questão, o filósofo francês Montaigne dá uma saída notável que estou tentando transcrever nestas breves linhas:
Dentre nossas doenças existenciais, “a mais selvagem é desprezar o nosso próprio ser”. E ele acrescenta que amar a si mesmo é o “auge da sabedoria humana e da felicidade”, independente de qualquer valor material, conceitual, estético ou de qualquer outro validador.
Então, aproveite o momento para ser o que você é no fundo de sua alma – e isso tornará menos complexa e dolorosa a sua jornada – física e mental.
Bom dia! Todos nós já ouvimos a máxima que “a vida imita a arte” e como no teatro, no cinema, na televisão, diariamente usamos máscaras e personagens para nos relacionarmos com os nossos semelhantes.
Você até poderá perguntar:
- Então, é normal, por exemplo, usar várias máscaras ao longo da vida?
Sim. Há pessoas, inclusive, que usam várias máscaras ao longo de um único dia. Elas representam as maneiras como a nossa personalidade se apresenta no mundo. Elas funcionam como um aparelho de proteção e de sedução dentro do espaço onde estamos inseridos. São importantes como elementos de ligação entre a nossa alma e a nossa personalidade.
De fato, somos muitos dentro de um só corpo e de uma só alma. E a toda hora estamos trabalhando essas modelagens no exercício existencial complexo visando harmonizar as nossas relações da melhor forma possível.
Vejamos um exemplo muito prático:
É bem provável que você tenha uma imagem muito boa ou não sobre minha pessoa. Aqui você lê o que eu escrevo, logo é uma continuidade do que penso. Mas, na minha própria vida existem outros Gutos dentro de um mesmo: existe um Guto que é professor de Filosofia; um Guto escritor e poeta; um Guto esposo e pai de quatro filhas; e um Guto mais próximo dele mesmo.
E isso não é feio, não é um problema, é natural da condição humana. Veja que até um bebê usa do artifício da máscara por meio do riso para ganhar o leite materno da mãe. Experimenta tirar isso dele e ele irá ao choro, aos gritos, até conseguir o que deseja.
E assim quantos sorrisos são oferecidos diante de uma oportunidade de emprego, diante do recebimento de um presente, diante de um elogio, etc. E quantas modelagens faciais são criadas diante de situações contrárias, opostas, ao que desejamos.
Outros poderão até dizer:
– Eu só tenho esse rosto, não tenho duas caras, sou muito verdadeiro, etc.
É bem provável que isso possa ocorrer também. Mas, não é uma regra.
Antes eu reclamava das máscaras das pessoas. Achava uma falta de caráter, uma falta de firmeza e coerência na personalidade de uma pessoa. Hoje, eu aceito e reconheço como um agir natural do ser humano nesse jogo que faz parte do que definimos como “civilidade”. E penso que sem essas modelagens o mundo seria bem diferente.
Bom dia! Tem certas ocasiões, e não são poucas, que nos deparamos com pessoas em situações extremas de estresse, irritação, desconforto, fúria, entre outras excitações emocionais. E parte dessas vivências emotivas tem uma relação direta ou indireta com a ideia de não saber ouvir a si mesmo antes de tomar uma decisão.
Muitas pessoas acreditam que para tomar uma boa decisão, por exemplo, tem que usar a razão. Outras procuram escutar um amigo, e outras mais buscam um terapeuta, enfim, alguém que possa organizar e aconselhar sobre toda complexidade posta. E elas acreditam que isso é assim mesmo.
E isso pode ser assim mesmo. E também pode não ser. Pois, muitas decisões não levam em conta apenas a ideia que surge no pensamento, na razão. É preciso ouvir outras regiões dentro do próprio corpo, como por exemplo, o coração.
É conhecida a história de sabedoria do Rei Salomão. Certo dia, duas mulheres vieram reclamar o direito a posse de um filho. O rei escutou as duas, mandou que trouxessem o menino vivo, uma espada e ordenou que cortassem a criança ao meio e desse cada metade a cada uma das mulheres. Uma delas em meio ao choro gritou rapidamente:
- Por bondade Rei Salomão não faça isso. Deixe o menino viver. Prefiro que ele fique vivo com aquela mulher a vê-lo morto!
Então, o Rei Salomão pegou o menino e mandou que o dessem à mulher que pedira por clemência. Ela sim era a mãe verdadeira, pois queria que seu filho vivesse, mesmo longe dela, se fosse o caso. E assim a questão foi sabiamente resolvida.
Essa analogia mostra que muitas vezes a melhor decisão para agir da melhor forma possível não vem apenas pelo uso da razão. Na verdade apenas uma parte dela participa, a outra diz respeito aos sinais que são manifestados pelo corpo, pelo coração e até mesmo pela alma.
De fato, ouvir o pensamento por si mesmo para tomar uma decisão não é mérito nenhum. Muitas vezes a surdez diante de uma palpitação do coração pode ser o melhor sinal para motivar uma boa decisão. Portanto, que você saiba levar em consideração esses vetores – razão e emoção – além dos fatores externos, antes de tomar qualquer decisão na vida. Isso irá surpreendê-lo.
É certamente uma afirmação das mais citadas com a entrada de um novo tempo. Muitas pessoas aproveitam o momento para zerar tudo e começar um novo período de forma diferente. Todavia, com tanta informação circulando por aí como escolher o que de fato será bom para carreira, para a saúde, para a família, enfim, para vida de cada um?
Vamos a um exemplo prático: uma pessoa que come muito doces, salgados, gorduras, bebidas, etc. Certamente essa pessoa terá sérios problemas com a saúde do corpo. Com o pensamento não é diferente. Observe como analogia a seguinte cena: Uma pessoa que consome muita informação, informação ruim, que propaga violência, conteúdos pesados, imorais, ruídos, distorções, etc. Com certeza, encontraremos nesta pessoa sérios problemas existenciais e que poderão influenciar na sua saúde física e mental.
Portanto, é uma construção errada, por exemplo, a ideia de que o pensamento é livre. Nunca foi. Em um dos seus ensaios sobre o tema, o psicanalista e filósofo clínico Lúcio Packter diz que “o pensamento é tão limitado quanto o próprio corpo”. O indivíduo é o que consome fisicamente e mentalmente – fruto de seus relacionamentos inicialmente na família, depois na escola, posteriormente na universidade, no trabalho, no lazer, na vida, etc.
Voltando ao início da nossa conversa.
Diante deste questionamento: Como anda seu pensamento? O que você está lendo? Qual a última canção que você escutou? Assistiu a um filme? Foi ao teatro? Comentou algo? O que abordou? Observe que assim como você realiza uma dieta para o corpo, um dia dedicado ao silêncio, é preciso também que você realize sistematicamente uma dieta para o pensamento.
Comece eliminando o excesso de informação. Desligue os programas ruins. Evite os sons distorcidos, as notícias que não acrescentam nada na sua vida, etc. Faça sua própria escolha musical, o que vai assistir, procure ler diretamente em livros.
Outro dia eu escutei o filósofo Mustafary, aquele do “ser humaninho” na rádio Mix, e ele dizia que “ler diretamente no papel é melhor do que ler no computador, na internet”. Não é que Mustafary, o maluco beleza, tem razão. Pois, quando você lê na internet, a cada instante aparece uma mensagem para você no Face, no Twitter, no Messenger e aí você perde o foco na leitura do texto que tinha programado para estudar.
E perdendo esse foco, é bem provável que seu pensamento seja levado para outro caminho – e quando você percebe o ano já terminou e tudo que você tinha programado de bom para sua vida prática, o seu crescimento espiritual, intelectual, não aconteceu porque você não conseguiu cuidar bem da sua mente. Daí a importância de uma dieta para o pensamento. Bem é isso. Ano novo com vida nova e bons pensamentos.
Gosto muito de caminhar na praia, principalmente neste período em que a primavera fecha o seu ciclo e o verão anuncia a temporada de festas – Natal, Ano Novo, Férias e Carnaval. É certamente também um tempo muito bom para encontrar pessoas de todos os lugares, acolher, contar histórias, inspirar outras, trocar experiências, alimentos, etc.
Neste fim de semana, caminhando pela praia de Búzios (RN), no litoral Sul, conheci Renato e Gabriela. O casal está celebrando 30 anos de vida matrimonial e um pouco desta fórmula para viver um grande amor eu transcrevo aqui nas palavras do próprio Renato.
- Eu fui um homem muito rico, proprietário de empresas, dono de carros luxuosos e apartamentos lindos. Todavia, raras vezes tinha tempo para curtir esse patrimônio junto com a minha família. Estava sempre trabalhando para manter e pagar os custos de uma vida que não vivia...
Por um momento ele parou, contemplou o mar e em seguida falou:
- Um dia, sentindo as dificuldades que atravessava na vida, inclusive financeira, voltei para casa mais cedo e abracei a Gabriela e disse para ela colocar uma roupa de banho.
- Roupa de banho? Perguntou ela.
- Sim roupa de banho. Vamos para praia.
- Mas hoje é terça-feira. Você tem que trabalhar...
- A vida não é somente trabalho. Não nos abraçamos há muitos anos e não tomamos um banho de mar há muito tempo. Vamos! Nada justifica tanto tempo empregado em troca de dinheiro. E nenhum dinheiro do mundo vale a pena sem o seu amor, o amor dos meus filhos. De maneira, que quero ficar mais tempo com você e a nossa família.
E, então, como seguiu a vida de vocês? Perguntei.
- Passei a trabalhar menos, a ganhar menos dinheiro, é claro. Perdi patrimônio, carros, imóveis. Contudo, recuperei o amor de Gabriela e ganhei mais tempo de vida útil ao lado dela e dos nossos filhos. Hoje, tenho mais tempo para regar o jardim, conversar com os passarinhos, andar com os pés nus na areia da praia, tomar um delicioso café na volta para casa, sem a correria do dia a dia. Essa doce rotina tornou os nossos dias mais longos, os anos já não são tão breves e a vida ficou mais digna de ser vivida. Reconquistamos também o tempo da nossa infância e hoje brincamos de viver.
E depois de um sorriso largo ao lado de Gabriela, Renato concluiu sua fala:
- Estamos felizes. Obrigado!
Bem é isso amigo, amiga! Felicidade, Amor, Paz, Saúde, Harmonia... Que venha 2017 com muitos nomes. Todavia, quem vai escolher a sua melhor maneira de viver no amanhã é você e que sua escolha seja livre e leve como a vida deve ser.
Marcos era um moço tímido e de poucos amigos, quando o conheci. Veio ao meu encontro durante uma conferência que realizei sobre o medo e a coragem numa universidade em Natal. Numa conversa rápida revelou que tinha medo da vida, de fazer amigos e que lhe faltava coragem de viver plenamente sua vida.
Disse na época que podia contar comigo. E assim em vários outros momentos nos encontramos para tratar sobre o tema, principalmente no mundo de hoje onde as aproximações são inicialmente harmoniosas e posteriormente seguem tendências conflituosas, especialmente se forem muito estreitas.
Todavia, o problema do medo para Marcos não é somente dele. É meu, é de você e de todos nós. Pois, no mundo atual o afeto dominante nas pessoas é o medo. Temos medo da violência, medo de perder o emprego, medo do chefe, medo de perder a esposa, o esposo, medo da crise, medo disso, medo daquilo, etc
E como viver no mundo com tanto medo? A filosofia aponta um caminho: a coragem. Na Antiguidade, a coragem formava com a prudência, a temperança e a justiça o conjunto das quatro virtudes cardeais.
E por ser a mais admirada do mundo, a coragem é também considerada pelos maus, até os animais selvagens não atacam os seres humanos quando estes não demonstram medo em seus olhos durante a possibilidade de confronto.
O exemplo teológico de Daniel na Cova dos Leões pode e deve ser usado como analogia nesta máxima. Outro exemplo: a coragem é a virtude dos heróis e os heróis são sempre admiráveis como o pequeno Davi vencendo o gigante Golias.
Já a falta de coragem, segundo Aristóteles, é a covardia. De fato, se há um antídoto contra o medo, este seria o de enfrentar o temor com coragem. Certamente é mais louvável do que se entregar ao medo covardemente. Mas, um detalhe: existem certos desafios que são maiores de que toda a nossa coragem para vencê-los. Uma boa saída neste caso é recuar um pouco, ganhar tempo, e seguir posteriormente para uma vida gloriosa.
E, como tudo na vida, a coragem pode ser boa, quando usada para o bem. Citamos o exemplo de Sócrates, Jesus Cristo que aceitaram humildemente as sentenças de morte que lhes foram impostas. E a coragem é ruim, quando usada para o mal. A história recente está cheia de exemplos: 11 de Setembro (EUA), Paris (França), etc.
E o Marcos? Podemos concluir brevemente este ensaio escrevendo a máxima que ele próprio cita hoje em suas andanças por aí, depois de encarar seus temores:
- O medo também tem seu valor, amigo. Afinal, é do medo que nasce à coragem para enfrentar os desafios da vida. Portanto, não tema. Tenha coragem!
A alegria é a interrupção da tristeza. Provavelmente cada pessoa tem o seu próprio sentido para a palavra. Todavia, a tristeza tem seu valor. É, inclusive, possível encontrar alegria no meio da tristeza.
Quantas obras (livros, músicas, pinturas, filmes, imagens) foram realizadas em momentos de profunda tristeza? Quantos amores nasceram depois de tantos desencontros? Quantos bons negócios surgiram depois que outros acabaram em meio ao lamento? Quantas moradias novas surgiram depois que a primeira se foi? Quantas alegrias chegaram depois de um momento tristonho?
É clássica, por exemplo, aquela imagem do palhaço triste. Também é um clássico o soneto "A Felicidade" do poetinha Vinicius de Moraes na melodia do Tom Jobim:
Tristeza não tem fim
Felicidade sim
A felicidade é como a gota
De orvalho numa pétala de flor
Brilha tranquila
Depois de leve oscila
E cai como uma lágrima de amor...
Que saibamos, portanto, celebrar também a tristeza como parte desta vida. E assim como o palhaço, quem sabe mais tarde, não ter vergonha de mostrar ao mundo que também somos infelizes – ainda que momentaneamente.
Pois, a alegria e a tristeza passam assim como tudo nesta vida e sua experiência depende apenas de um fio único e muito delicado: a consciência do ser em que aparece. A alegria e a tristeza, portanto, são emoções de quem vive.
Neste tempo de tanta complexidade (econômica, moral, ética, existencial, etc) costumamos ouvir entre os amigos algumas máximas:
“– Não fui feliz, o destino não quis.”
“– Eu quero ser feliz, mas o mundo não deixa.”
“– A culpa é das estrelas”, etc.
Na verdade, são construções erradas e que impedem você de crescer espiritualmente e ser feliz. O ideal é entender que a vida é assim mesmo e você nunca terá felicidade se realmente não acreditar que é feliz, suportando o que é necessário e amando, inclusive, as próprias adversidades e dores que por ventura aparecem aqui e ali – e que são bem menores do que você imagina comparadas as outras vidas.
Na teologia, um sentido mais amplo desta analogia pode ser visto no próprio exemplo de Jesus Cristo que dedicou sua vida aos desígnios de Deus, cumprindo com amor, coragem e paixão o fim trágico na crucificação. A virgem Maria também suportou todas as angústias e dores desde o nascimento do seu filho até a caminhada pela Via Crucis. E nem por isso deixou de cumprir sua jornada entre nós.
Outro exemplo interessante de entendimento e amor ao destino foi o do líder Mahatma Gandhi, que faleceu saudando o seu assassino, Nathuram Godse. A morte violenta contribuiu para idealizar ainda mais a figura de Gandhi como “pai da nação Índia”.
Na poesia, alguns anos atrás sobre forte angústia existencial, produzi um poema denominado “A Dor” e que depois foi publicado num livro chamado “13 Poemas Muito Ruins” (2013), onde citava parte dos seguintes versos:
O governador governa a dor
O legislador legisla a dor
O vencedor vence a dor
E Maria Dolores?
Continuará com muitas dores...
De fato, a vida de todo mundo é assim mesmo. Cada um tem sua dor. Todavia, a vida é para ser vivida. E viver é engajar-se permanentemente na certeza de que somos felizes quer seja na dor do vencedor, quer seja na sensação penosa e permanente de Maria Dolores. E que, portanto, antes de tomar qualquer decisão extrema devemos amar a vida como ela é - como forma de anular toda e qualquer tentação e diminuir a dor, a tristeza, a angústia, a depressão e o pessimismo. Não seria esse o segredo da felicidade dos santos? A aceitação virtuosa e serena do destino.
Hoje eu vou tratar de um tema muito especial: a importância da amizade. Já dizia a sabedoria grega que “os encontros com bons amigos valorizam a vida”. De fato, quem não necessita dos amigos não precisa viver na cidade, na sociedade, no Estado, de modo que ele deve ser uma fera ou um outro animal de sociabilidade duvidosa.
Na filosofia, a amizade é pois uma virtude extremamente necessária à vida. Na ética aristotélica, por exemplo, a justiça e a amizade possuem os mesmos fins, mas considera-se a amizade superior à justiça, uma vez que a ideia, o conceito da própria justiça é utilizado para contornar atos conflituosos em relação ao próximo. Com os amigos de verdade não precisamos recorrer à justiça, pois a natureza da amizade torna o convívio harmonioso. Epicuro, considerado o filósofo da amizade afirmou que “de todas as coisas que a sabedoria nos oferece para a felicidade da vida, a maior é a amizade”. Dai a máxima de que ninguém é feliz sozinho.
Na teologia, o significado da palavra amigo também é muito valorizado. Os antigos já diziam que “o aprender sem amigo nos torna sós e incultos”. No Budismo, por exemplo, o Sutra Foshuo Bei afirma que “há quatro tipos de amigos: os que são como flores, os que são como pratos de balança, os que são como as montanhas e os que são como a terra”. Os amigos que são como flores irão agradá-lo somente quando quiserem alguma coisa de você. Os amigos que são como pratos na balança irão bajulá-lo nos bons tempos, mas, quando você estiver por baixo na vida, eles irão olhá-lo de cima. Já os verdadeiros amigos são como as montanhas e a terra, pois estarão sempre a sua disposição e o irão apoiar em todas as dificuldades.” A ideia central desta máxima é “que mesmo que a época e as circunstâncias da vida mudem, o que nunca se altera é a verdadeira amizade. Quanto mais adversidade encontrar, mais forte e mais profunda se torna a amizade” (Daisaku Ikeda).
No Islã, “ter amigos fiéis é tão importante quanto à satisfação das necessidades da vida. Estar entre um círculo seguro e pacífico de amigos significa encontrar segurança contra riscos e perigos”. Os sábios, ao verem que uma amizade está danificada, removem imediatamente a causa do descontentamento e restabelecem as boas relações.
No Cristianismo, no Antigo Testamento, está escrito que “amigo é fiel proteção poderosa, e quem o encontrar, terá encontrado um tesouro. Amigo fiel não tem preço e o seu valor é incalculável. Amigo fiel é um remédio que cura, e os que temem ao Senhor o encontrarão” (Eclesiástico 6, 6-17).
Para os cristãos, os amigos têm muita influência em nossas vidas: “Quem anda com os sábios será sábio, mas o companheiro dos insensatos se tornará mau” (Provérbios 13:20). Nossos amigos não envolvem apenas relações, mas decidem a nossa direção na vida e na eternidade. “Não vos enganeis: as más conversações corrompem os bons costumes” (1 Coríntios 15-33).
No mundo contemporâneo, o sociólogo polonês Zigmunt Bauman fala que “Vivemos tempos líquidos. Nada é para durar, inclusive, a amizade.” O contato virtual, via rede social, tomou o lugar de boa parte das pessoas, cuja a principal marca é ausência de comprometimento. As relações se misturam e se condensam com laços momentâneos, frágeis e volúveis.
E você como tem cultivado os amigos? Qual a importância da amizade na sua vida? Laços humanos são bênçãos ou maldições? Quanto a minha opinião manifesto aqui a máxima de que é muito bom contar com vocês todos os dias, seja no mundo real, no virtual e na vida eterna. Amém.
Lembrei desta citação por esses dias depois de assistir um show da banda Plutão Já Foi Planeta. No tempo da faculdade, usava a máxima como analogia para se referir a tudo que já tinha sido alguma coisa, em algum dia, em algum tempo, etc. De fato, nada parece mais o que era. E tudo que já foi um dia não é mais. E o que restou parece desvirtuado, deturpado.
No tempo antigo, por exemplo, o sujeito “ordenava-se” numa determinada profissão e se colocava a disposição para servir o próximo. E assim, por tabela, além do seu local de trabalho, sempre existia na frente de sua residência uma placa indicativa de que ali morava um profissional X ou Y para servir a qualquer hora do dia ou da noite – principalmente no atendimento aos mais humildes. Perceba que o verbo “ordenar” empregado na formação era posto no sentido de ser um verdadeiro sacerdote.
O trabalho, enfim, e suas condições de bem servir ao próximo era tudo que importava e o dinheiro, ou fruto por esse exercício profissional, não tinha tanta importância quanto tem hoje em dia. Não que o homem não tinha o direito de viver dignamente do seu altar, consultório, ofício, mas, a ideia da ética empregada no exercício profissional dizia que não se devia pensar, trabalhar e produzir apenas por dinheiro.
Daí o surgimento das grandes almas que viveram focadas no amor ao próximo, livres de qualquer cupidez por tesouros mensuráveis. Eram pessoas, enfim, desapegadas de qualquer ambição e que usavam os dons de suas respectivas vidas como testemunhos de amor ao próximo. E viviam quase como santos porque não se assemelhavam absolutamente a um mortal, uma vez que estavam focados em bens supremos imortais e imensuráveis.
Hoje, aquele pobre mortal que usa o seu saber como exercício para ganhar dinheiro e ficar rico, por ironia, é mais pobre, miserável e vive em meio a “valores materiais” que minimizam o valor real de seu ofício. É um dos pecados capitais do nosso tempo.
O que se espera, portanto, é que possamos reverter essa máxima que torna a ideia do conceito de humanidade menor entre nós. Afinal, o que se espera de um especialista é antes de tudo que ele use sua habilidade acima de qualquer interesse simplesmente financeiro, que ele saiba compartilhar o saber em prol dos seus pares, e principalmente, os mais humildes. Não ser um lobo solitário e infeliz, e muito menos um ganhador no sentido corporativo, mas um poeta sempre cortês com o semelhante. E esta missão também deveria ser a finalidade do homem político: a de usar sua representação na defesa da comunidade que o elegeu, que o indicou como vereador, prefeito, governador, parlamentar e presidente.
E assim, quando mais tarde o tempo chegar, que possamos acreditar novamente em verdades absolutas e inquestionáveis como as máximas de que Platão é filósofo, Plutão continua sendo planeta e Deus é o que é.
Toda casa está tomada pela presença da luz. Em cada canto há uma lâmpada e aonde a luz não chega existirá sempre uma vela, uma lamparina, uma lanterna para iluminar as nossas noites mais longas.
E foi numa noite que aconteceu outra vez. Maria Clara decidiu dormir com a luz da sala acesa. Pensei, com os meus botões, a conta de energia vai estourar novamente. E, de prontidão, tentei negociar um acordo bom para os dois lados.
- Filha assim que você dormir posso desligar a lâmpada?
E ela de imediato respondeu:
- Sim papai... Já não estarei mais por aqui. Boa noite e bons sonhos.
A frase de Maria Clara provocou uma inquietude e acabou tirando o meu sono. Afinal, por onde andará Clara em seus sonhos?
Lembro que a maior parte das minhas histórias nasceu entre sonhos e pesadelos. Ainda menino usava os sonhos, por exemplo, para fugir do tempo ruim, do dia difícil e das dificuldades.
Engraçado! Com o passar dos anos aprendi que essa estratégia era interessante e benéfica, embora muitos terapeutas argumentam o contrário.
- Mas, afinal o que será da vida sem os sonhos? Um pesadelo? Mandela, por exemplo, atravessou anos de solidão numa prisão sonhando com uma África livre. No Brasil, Tiradentes morreu sonhando com uma pátria livre. O jornalista e inventor Augusto Severo morreu em pleno sonho voando no seu dirigível Pax, ao lado do mecânico Sachet – em Paris.
Hoje, de fato, já não sei mais separar os dois mundos. Quando acordo, penso que estou sonhando e quando adormeço percebo que estou acordado. E isso tem acontecido todos os dias, desde muito cedo.
- Não será a vida um grande sonho? Outrora um grande pesadelo?
Não tenho respostas. Talvez encontro um Norte no pensamento do escritor Guimarães Rosa que um dia escreveu: “- A vida é sorte perigosa passada na obrigação: toda noite é rio abaixo, todo dia é escuridão.” (Grande sertão: vereda, p. 278). Ou ainda as breves palavras do poeta José Paulo Paes nos versos “sem a pequena morte de toda noite como sobreviver à vida de cada dia?” (Hino ao sono – Livro Versos Livres).
Não sei se Maria Clara tem usado seus sonhos como saída feliz deste mundo que se tornou complicado para viver, quase um pesadelo. Ela é muito nova para pensar sobre essas coisas. De coração, sonho o melhor desta vida para ela, todas as minhas filhas, familiares e vocês. Que possamos, enfim, sonhar e realizar um mundo melhor para todos nós. Inclusive, mais humano, fraterno e solidário.
De quantos Estados precisamos para viver com segurança?
A insegurança tem sido o assunto principal dos governos em todo mundo. De fato, trata-se de um fenômeno globalizado que caracteriza a vida nas grandes cidades. Paris, Nova York, Londres, Istambu, Cabul, São Paulo, Rio, Natal são cidades hoje que mais parecem campos de batalha entre o Estado público, o Estado privado e as forças opositoras ligadas a grupos com interesses distintos.
De fato, a morte de uma jovem universitária vítima da violência em Natal (RN) é tão imoral e injustificável como a morte violenta de uma jovem estudante palestina em Jerusalém, embora seus algozes operem por motivos alheios.
Observa-se, particularmente, no Brasil que há muito tempo a sociedade já não é mais protegida pelo Estado oficial ou pelo menos é pouco provável que confie na proteção oferecida por este. Limitado, o Estado público como conhecemos tem mantido sobre sua guardar os gestores e os amigos dos gestores que acreditam e falam em nome de um Estado soberano.
Todos lembram que quando o Estado perdeu o controle na Educação nasceu a crença na escola particular; quando o Estado perdeu o controle da Saúde pública, surgiu com força a Saúde privada; e agora, mais recentemente, quando o Estado perde a guerra para insegurança, prosperam a segurança privada, os condomínios residenciais e comerciais – verdadeiras cápsulas de sobrevivência privadas mantidas pelos mais ricos dentro de um Estado público inoperante, inseguro e corrupto.
Uma terceira “via estatal” é operada pelo crime organizado que protege e condena sob sua tutela o cidadão mais simples – morador das famosas áreas de risco. Aquele que não tem moradia, escola, saúde e segurança pública. São os mais vulneráveis.
Nos demais países a violência também é produzida como um escape as pressões. Entre elas a política, a étnica, a religiosa, etc. Recordamos as Brigadas Vermelhas (Itália), o IRA (Irlanda do Norte), mais recentemente a batizada “Al Qaeda” de Bin Laden e toda forma de terror promovida pelo Estado Islâmico. São reações a falta de políticas públicas que atendam aos anseios de todos.
Percebe-se neste contexto a complexidade de um tema que não será resolvido somente com a presença da polícia na rua, mas a própria ideia do Estado Oficial (Público) assumir de fato suas prerrogativas de Estado protetor e único de direito e de dever. E essa não parece ser uma tarefa fácil aqui no Brasil e no resto do mundo.
Em seu estudo sobre a insegurança, o pensador polonês Zigmunt Bauman afirma que “é por essa razão, em primeiro lugar, que os governos dos Estados em luta contra a insegurança e a violência, dia após dia, para resistir às tempestades atuais, caminham aos tropeços de uma campanha ad hoc de administração de crise e de um conjunto de medidas de emergência para o outro, sonhando apenas em permanecer no poder após a próxima eleição, mas desprovidos de programas ou ambições de longo alcance”. (Tempos Líquidos-2007)
Um homem entra em uma padaria no centro da cidade e pede um café sem leite. O garçom responde: - Desculpe, o leite acabou, só temos café. Posso trazer o café sem leite?
E novamente o homem tenta mais um diálogo: - Gostaria também de uma torrada sem manteiga. O garçom retruca: - Perdão, a manteiga acabou, posso tostar sem manteiga?
O diálogo em questão mostra muito bem como anda nossa relação de atenção com o próximo. Muitas vezes estamos falando do mesmo assunto, mas nossos interlocutores não estão entendendo e retornam com os mesmos chavões que jogamos no ar numa tentativa desesperada de ser compreendido e compreender.
Uma das ironias mais cruéis desta cena é que ambos estão falando da mesma coisa e não conseguem um diálogo lógico para chegar a uma conclusão. Há um caos sob o céu, e a situação talvez seja excelente para praticar o silêncio, para evitar desentendimentos.
Podemos ver que há potencialidades imensuráveis por trás do silêncio. A ausência do som, por exemplo, por si só nos proporciona paz. Ninguém briga quando o outro se cala.
O silêncio também é bom para a saúde mental. Já se sabe, por exemplo, que só a quietude de um silêncio profundo leva a um nível profundo de autoconhecimento, permite a construção de sentimentos positivos e fortalece a autoestima. Existe até uma máxima oriental que diz que: “- A paz que você procura está no silêncio que você não faz.”
Não faz tantos anos, em 1952, o compositor americano John Cage apresentou uma peça musical revolucionária. Ele entrou no palco, sentou-se à frente do piano e durante 4 minutos e 33 segundos, ficou em silêncio. Naquele instante, o único som que se ouvia eram os leves murmúrios da platéia atônita. Ao final da apresentação, Cage levantou-se e agradeceu ao público como se tivesse acabado de apresentar uma de suas obras convencionais.
Então, diante de tantos ruídos no mundo virtual e real contemporâneo, qual será o melhor programa para o ano novo? - Não ter programa, ou melhor, ficar em silêncio.
O silêncio é o início de tudo. De onde surgem o amor, o bem-estar, a saúde física e mental, a criação e a paz. O silêncio será, enfim, um novo começo, uma nova era pela paz e para paz entre todos.
No Brasil, o ladrão não está à altura do seu roubo. Penso que o ladrão só é digno de respeito quando não busca o enriquecimento de si mesmo, mas da sua comunidade, da sua cidade, do seu estado e do seu país.
A história é rica em exemplos de ladrões dignos de respeito. Barrabás, Robin Hood e Ali Babá são alguns dos nomes cujos meios justificaram os fins. O primeiro lutou contra o domínio romano em Israel; o segundo se imortalizou como um ladrão do bem que roubava dos ricos para dar aos pobres; o terceiro foi um pobre lenhador árabe que roubou parte do tesouro de um grupo de quarenta ladrões, na floresta onde trabalhava, e distribuiu com os mais necessitados. Daí, à máxima de que "ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão".
Aqui no Brasil, não temos ladrão, pelo menos o que definimos como bom ladrão. O que nasce e vive aqui é o canalha. Aquele indivíduo mau caráter, aproveitador, cínico, mentiroso e perigoso. O canalha é homem carnal, amante do prazer que para garantir a felicidade dos seus instintos mais primitivos é capaz de vender a própria mãe. O indivíduo que rouba o coletivo para garantir sua boa vida de individual.
Recentemente, lembrei do famoso Sermão do Bom Ladrão escrito pelo Padre Antônio Vieira em 1655: "O ladrão que furta para comer, não vai nem leva ao inferno: os que não só vão, mas levam, de que eu trato, são outros ladrões de maior calibre e de mais alta esfera (os canalhas); os quais debaixo do mesmo nome, e do mesmo predicamento, distingue muito bem São Basílio Magno”.
E prossegue Vieira: “Não só são ladrões, diz o santo, os que cortam bolsas, ou espreitam os que se vão banhar para lhes colher a roupa; os ladrões que mais própria e dignamente merecem este título são aqueles a quem os reis encomendam os exércitos e legiões ou o governo das províncias, ou a administração das cidades, os quais já com mancha, já com forças roubam cidades e reinos”.
Por fim deixo vocês com uma oração também inspirada no padre Antônio Vieira e colhida no balcão do Café São Luiz em Natal (RN), na manhã deste dia tão longo: “Rei dos reis e Senhor dos senhores, que foste crucificado entre dois ladrões para pagar o furto do primeiro ladrão; e o primeiro a quem prometeste o Paraíso foi outro ladrão, tens misericórdia também dos canalhas, colocando-os em seu devido lugar, longe dos bons ladrões”. Amém!
Atravesso a Rua Dr. Múcio Galvão, no antigo bairro do Tirol, e encontro com o núcleo ambulatorial do Hospital Severino Lopes. O endereço abriga também um dos manicômios da cidade, a antiga Casa de Saúde Natal (foto).
Lá dentro um interno grita:
- Doutor... O Sol nasce no Oeste.
Afinal, por que um dia o sol não poderia nascer no Oeste?
Maior gravidade é manter alguém preso por pensar diferente. Tirar a liberdade de um ser sob o pretexto que ele faz um mau uso dela.
É olhando para o manicômio que podemos conhecer também a cidade, suas famílias, os colocados de fora do sistema, os expulsos, os colocados às margens da sociedade, os excluídos dos excluídos.
Uma cidade é civilizada quando trata seus diferentes iguais.
Não seria essa hospedaria uma mesma versão do manicômio na Idade Média que tinha caráter excludente, punitivo e moral?
Falar em ética e civilidade nos tempos atuais parece um tema meio fora de moda da grande mídia e redes sociais que insistem em pautar o dia a dia com conteúdos de gosto duvidoso. Não que a violência, a miséria, a injustiça e a barbárie não existam. Mas, poderíamos minimizar seus efeitos com pautas maximizadas no bem.
De fato, bem que os conteúdos poderiam mostrar que a vida em sociedade é uma maneira do indivíduo se agarrar a um cotidiano mais humano e seguro fundamentado na prática dos bons costumes, regras morais e sistemas racionais que condicionam o homem a uma vida equilibrada e feliz, longe é claro do caos da antiga caverna.
Amizade, companheirismo, solidariedade, paz e amor são antigas e inquestionáveis fórmulas que possibilitam uma saída para o Bem Supremo. Daí, que toda vez que um poeta ou qualquer outro artista fala de amor olhamos com especial interesse sua vivência entre os lobos e cordeiros da Terra. São figuras interessantes, bem místicas e iluminadas que praticam e divulgam sempre o bem. Afinal, os homens não vão melhorar o mundo ateando fogo nele, mas ressuscitando as boas normas de convívio, as boas maneiras, a cortesia, a polidez.
É preciso, portanto, que se busquem antigas virtudes, princípios de civilidade e ética e as tragam de volta à luz. A prática do bem requer um novo olhar, um novo coração em cima de tudo que está sendo vendido como “verdade”.
Em busca da civilidade perdida, teremos um longo caminho pela frente. Muita coisa precisa ser feita. As famílias, os líderes religiosos, os poetas, os artistas, os professores, os jornalistas e formadores de opinião serão instrumentos de propagação desta antiga e boa nova de ensinar as próximas gerações sobre o amor.
Muitas vezes as coisas que me pareceram verdadeiras se tornaram falsas. E as falsas se tornaram verdadeiras. Tudo é muito relativo, depende do espaço, do tempo e do objeto.
Imagine um jogador de basquete que atira a bola na tabela, ainda que ele não acerte a cesta e marque os pontos, existe a possibilidade de a bola retornar para suas mãos.
Mas, existe também a possibilidade de não voltar e, inclusive, da bola cair dentro do anel metálico com a rede amarela pendurada, ou simplesmente sair da quadra, chegar às mãos da torcida. Tudo é muito relativo compreende?
O importante, entretanto, é que tudo isso acontece de fato e que você é capaz de compreender que não tem o controle das coisas e que provavelmente também as coisas não tenham o controle das coisas e que o mundo, de fato, é isso que chamamos de um grande milagre.
Então, alegre-se, viva o milagre. Foi presente de Deus.
Alice, Gabriela e Fernanda são três dedicadas e esforçadas alunas que estudam na escola da comunidade. Moram bem longe daqui, é verdade, mas nem por isso se entregam a dura rotina de acessar as avenidas e ruas do bairro em busca de novos saberes. De todas as adversidades que enfrentam nesta travessia, talvez a mais brutal seja encontrar em determinadas dias o portão da escola fechado após as 7h15 da manhã – um choque de autoridade.
Outro dia, fiquei indignado com a insensibilidade do porteiro diante da cena. Embaixo de uma árvore, durante um período de chuva, as três meninas aguardavam fora do colégio, o toque para segunda aula. Tratei do caso com o oficial da portaria na unidade de ensino, que disse que não tinha competência sobre o assunto. Estava ali para fechar o portão naquela hora e não podia fazer mais nada. Fui ao coordenador, que encaminhou o caso ao diretor, que simplesmente respondeu:
- É norma da escola. Não posso fazer nada.
Argumentei:
- Não, seu diretor, não é normal.
Ele rebateu:
- De fato não é normal. Falo de normas senhor, códigos de condutas.
Ainda em choque com as palavras do diretor, encontrei forças para reagir.
- E quanto a deixar as estudantes embaixo de chuva? É normal castigar desta maneira? Não basta já a falta apontada na caderneta escolar e o conteúdo perdido com a matéria? É preciso humilhar as pequenas e indefesas criaturas? Colocá-las nas ruas?
Não, não é normal seu diretor. É no silêncio de cenas como estas que os estudantes são acolhidos na esquina da escola pelo narcotráfico e toda a indústria do crime.
Não podemos ser ingênuos de achar que a questão é meramente um problema pontual de falta de disciplina das alunas. E, mesmo que fosse, o papel da escola deve ser sempre o de acolher. Daí a necessidade de falar e discutir publicamente esses acontecimentos.
De fato, promover esse debate é retomar o direito de questionar e sugerir melhores práticas de convivência na escola e na sociedade por meio de uma gestão participativa entre o poder constituído e a sociedade. Esse texto convoca cada um de nós a levantarmos as mangas da camisa e darmos uns passos a mais na conquista da cidadania plena.
“É chegado o tempo da travessia. E, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos”, diria o filósofo. Temos, portanto, um longo caminho pela frente no sentido de transformar essa realidade diária com atitudes, ações e modos de vida que contribuam para um mundo melhor e mais humano. Não vejo outro sentido na função da velha escola.
Diz um ensinamento oriental que não só aos braços foram conferidas as oportunidades de servir ao próximo. Os ouvidos também trabalham em prol do bem quando ouvem a história de dor ou de alegria do próximo. Os pés quando auxiliam o caminhar de alguém na direção ao bem. A boca quando manifesta uma palavra de carinho e consolo ao próximo. O cérebro quando descobre mil formas de colocar em práticas ações que não precisam necessariamente ser extraordinárias e visíveis para que todos possam testemunhar que habita em fulano ou beltrano uma alma boa.
Se nos faltam estruturas financeiras e materiais para agir ajudando o próximo, nos é ampliada a capacidade de servir de outra maneira, na intimidade da alma, manifestando assim o sentimento imensurável do amor.
As grandes figuras humanas se santificaram realizando pequenas ações. Vejamos, por exemplo, a história do magnífico São José, que não foi nem sacerdote e nem religioso, mas o pai adotivo do Menino Jesus e esposo da Santíssima Virgem Maria. Ele viveu ocupando-se da manutenção da Sagrada Família com seu ofício humilde de carpinteiro.
Outro exemplo, o de São João Bosco que dizia: “Seja sempre alegre e faça bem feito todas as coisas. Nisso consiste a Santidade”. Guardo com carinho essa citação do professor catequista Dom Bosco que era alegre e transmitia felicidade para quem não tinha com quem contar.
O que dizer, então, de um enfermeiro que cuida com carinho de um doente? De um filho que cuida com amor da sua mãe idosa? De um irmão que ampara o outro que não conseguiu caminhar com as suas próprias pernas? De um professor que ensina com paciência seus alunos? De um jardineiro que cuida bem do jardim da praça pública? São santos nas pequenas ações. Pois, todos eles receberam da Divina Providência a vocação específica de se santificarem nos afazeres de suas rotinas no mundo.
Vocês já pararam para olhar um jardim na praça pública? Será que o jardineiro tem a noção do tamanho do bem que faz ao outro com seu oficio. Contemplar uma flor, uma rosinha no meio de um caminho cheio de espinhos e pedras pode ser motivo de salvação, alegria e conforto para quem não tem.
De fato, o caminho para prática do bem não é complicado. Basta que cada um faça de suas habilidades um instrumento do bem a serviço da vida coletiva, realizando assim o valor imensurável das pequenas e boas ações que nos foi confiada por Deus.
De fato, observamos ainda um mundo cheio de atrocidades, injustiças sociais e misérias. Entretanto, o desejo para que tais fenômenos não se repitam é fundamental para que a humanidade alcance dias melhores no planeta.
Um novo tempo luta para nascer e a esperança assume um papel fundamental para um mundo mais justo e fraterno.
A esperança constitui-se assim num formidável instrumento de mudança. Mas, para que realmente este mundo melhor aconteça é necessário promover uma mudança dentro da gente por meio da prática das boas ações.
Por isso que é fundamental rever posturas e transmitir verdadeiramente de dentro do coração o sentimento mais profundo do amor para com o próximo. Pois, aquilo que você irradia de bom para os outros é bom também para você. Não falo de nenhuma novidade. Trata-se de uma sabedoria milenar: o amor atrai o amor, a alegria atrai a alegria e a paz atrai a paz. Tudo se conecta.
No passado, desejei muito mudar o mundo. Hoje, sonho em mudar o que sou. Quero ser uma criatura melhor. Luto por isso. Penso que não sou o único. Neste momento, milhares estão assumindo o compromisso de mudar suas respectivas vidas.
Não é tarefa fácil. Pois, a ideia de que o mal está no outro nos impede de reconhecer a nossa própria barbárie interior. O desafio, portanto, é trabalhar esse conceito e crescer em humanidade, fraternidade, solidariedade e amor.
No semáforo aberto, Manuela faz bolinhas de sabão enquanto aguarda a chegada dos clientes. A brincadeira de criança se mistura com a obrigação de limpar os para-brisas dos veículos para sustentar sua mãe e um irmão ainda menor do que ela.
Não considere a cena digna de uma poesia pós-moderna urbana. A imagem da frágil menina no trânsito, magrinha, despenteada e com pés descalços nos entristece os olhos, o coração e nos dar remorso.
Sim, remorso. Pois, não conseguimos acabar com a corrupção e todas as desigualdades no país. Reside neste contexto à máxima que diferencia o homem de bem do outro homem: o primeiro sente remorso e o segundo é imune a qualquer tipo de compaixão com seus pares. Ele é capaz de tirar o futuro de uma criança e assim mesmo deitar numa cama e dormir como um “justo”.
Perceba a complexidade da cena e não ignore essa triste realidade. Sinta-se, portanto, em parte responsável pelo destino de Manuela que é mais uma vítima desta corrupção que você vê nos jornais. Uma Manuela que passa despercebida na leitura rápida dos periódicos.
Um ato corrupto implica em vários efeitos. Um deles é a menina que pede esmola no trânsito da cidade. De fato, Manuela poderia ser uma criança normal. Uma aluna na escola, uma menina brincando de bolinhas de sabão em um lindo jardim, de uma bela casa. Porém, não é o que acontece.
Observamos assim que mais do que um ato imoral, “a corrupção é uma doença que causa tristeza” como diria o filósofo. Não uma tristeza qualquer. Na verdade uma tristeza acompanhada de uma sensação de impotência, de uma angústia e de uma depressão.
Concluímos, pois, que o fim da tristeza é desejável, o fim da corrupção é desejável. Mas, observamos que não possuímos ainda instrumentos e os remédios capazes de combater essa doença degenerativa da sociedade brasileira.
Em um dia qualquer da minha infância, sozinho, tomei a decisão de deixar a escola mais cedo, na verdade bem no meio da tarde, em troca da aventura de andar no trem da Estação Central na Ribeira.
Entrei no velho prédio da Praça Augusto Severo, subi no vagão e comecei aquela que seria a primeira das minhas inúmeras viagens sem destinos no planeta Terra. Era uma linha local, que ligava Natal à cidade de Ceará Mirim, na região metropolitana.
Em algum lugar perto da antiga Ponte Velha de Igapó alguém avisou que do outro lado da margem, próximo ao Forte dos Reis Magos, uma moça havia se afogado.
Perguntei:
- Isso foi agora?
O companheiro de viagem respondeu:
- Sim. É o que todo mundo fala na cidade.
Era dezembro de 1985. O apito do trem tocou algumas vezes e tirou o foco da trágica história. Continuei a viagem até Ceará Mirim, onde na cidade conheci importantes edificações, o mercado central e o delicioso caldo de cana oferecido aos visitantes pelo povo acolhedor do lugar.
Mas, a história da moça que se afogou alguns quilômetros dali nunca saiu da minha cabeça. Quando retornei para casa, havia um recado da minha Tia Iolanda dizendo que a chefe dela na Biblioteca Pública tinha falecido. Era a poetisa Zila Mamede.
Formada em Biblioteconomia no Rio de Janeiro, Zila Mamede fez especialização nos Estados Unidos. Em Natal, ela foi responsável pela estruturação das duas mais importantes bibliotecas da cidade: a biblioteca central da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e a biblioteca pública estadual Câmara Cascudo.
Hoje, depois de tantos anos, lembro da viagem de trem, da tragédia na vida da poetisa Zila Mamede e do descaso das autoridades com a biblioteca Câmara Cascudo.
A grande lição para nós seguidores de Cristo é que, se quisermos de verdade um encontro em vida com Deus, deveremos momentaneamente esquecer o Paraíso e fazê-lo aqui. Aí reside a ideia do respeito e a prática dos mandamentos, do respeito às escrituras sagradas, do respeito ao planeta Terra, do respeito à vida, do respeito ao próximo e a si mesmo.
Acompanhei com especial interesse o atentado aos editores da revista Charlie Hebdo, em Paris. O ataque foi o cumprimento de uma sentença de morte determinada por um grupo de radicais com o objetivo claro de silenciar pessoas que questionam o radicalismo religioso, político, etc.
A ação na capital francesa envolve uma dialética bem mais complexa do que o lugar comum com que o tema foi tratado. Fere o princípio da decência humana e mostra o pior do agir desrespeitando as leis da santificação. E que, portanto, deve ser combatida como qualquer ato que atente contra a vida humana.
É verdade o homem é um animal extraordinário, que faz coisas maravilhosas, mas um ser que também faz coisas detestáveis. Já dizia o filósofo que “somos capazes de fazer coisas nobres como elevar o ato de comer, mas também não devemos esquecer que nos aliviamos posteriormente na privada”. O que Hegel, na obra “Fenomenologia do Espírito” chamou de “o mundo invertido”.
Temos aí a máxima do mundo invertido. Um ser humano nobre que acredita em Deus, nos ensinamentos de amor ao próximo, mas é capaz de tirar a vida deste, quando de certa forma se sente contrariado. Um ser humano que oscila entre o sublime e o execrável.
Vamos a outro caso. Ao longo desta última semana, o Brasil acompanhou a angústia de Marco Archer condenado à morte por tráfico de cocaína na Indonésia. Apesar de seu ato ilícito, a situação do brasileiro feriu todos os princípios da civilidade humana. Trata-se, na verdade, de uma crueldade, embora o governo da Indonésia argumente que está agindo em nome da decência pública.
O que realmente podemos aprender com as duas histórias? Em nenhum lugar do Cosmo essa oscilação entre o Sublime e o Excrementício é mais evidente do que no Planeta Terra.
O que isso significa é que devemos ter mais cuidado no agir e nas decisões que tomamos. Pois, Deus mora nos detalhes, na virtude que consiste em perdoar os pecadores, na bondade, na indulgência, na doçura. A oposição a essa máxima é que deve ser combatida como qualquer ato que atente contra a vida na Terra. Não é Deus que condena o homem à morte, mas o próprio homem que condena o seu semelhante. Deus é amor, Deus é vida.
De repente deu uma vontade de andar de carrossel, navegar num barquinho, dirigir um carrinho, girar na roda gigante, contemplar a cidade de cima.
Na infância, eu costumava andar nos brinquedos do lendário Parque São Luiz. Todos os anos a companhia chegava para enriquecer as férias de verão e a festa da Paróquia de Nossa Senhora da Candelária (Natal/RN).
De férias, 40 anos depois, encontro com parte do que foi o antigo parque da minha infância numa dessas cidades do interior deste lindo país. É interessante como brinquedos tão simples possuem um valor imensurável para o coração daquela que foi a criança que reside nas minhas memórias.
No fundo, todas as pessoas trazem consigo, desde muito cedo, lembranças de antigas brincadeiras. Basta você tentar lembrar qual era o seu divertimento favorito.
Engraçado como as férias revitalizam prazeres tão antigos. Se você lembra o que mais gostava de fazer na infância, é hora, portanto, de curtir novamente esse momento junto com sua família, seus filhos, pais, avós, etc. Você vai perceber que pode reviver antigas lembranças com um novo olhar.
Muitas pessoas dirão:
- Você não pode ser mais aquela criança.
E de imediato, responderei:
- Posso, o coração é o mesmo, os brinquedos estão aqui. As cores são as mesmas, o som, o cheiro do algodão doce, da pipoca. O que falta? Nada. É só cair na brincadeira. Tudo se conecta. É mágico, é fantástico, extraordinariamente lúdico e encantador como a vida deve ser.
A vida é uma universidade na qual o aluno nunca obtém seu diploma. Uma grande jornada cuja meta está sempre em vista, mas nunca é atingida. Talvez daí a origem de tantas angústias e euforias.
Com o tempo, a gente começa entender que as vitórias e as derrotas são parte destes protocolos. E que, portanto, devemos na alegria e na dor manter o equilíbrio. Isto, de certa forma, nos levará a uma qualidade de vida melhor.
Na Roma antiga, Boécio (480-524) já dizia que “a felicidade pode entrar em toda parte se suportarmos tudo sem queixas”. Lutar contra as adversidades apenas piora o estado de espírito da pessoa. É preciso surfar nas ondas boas, mas também aceitar quando o mar não está para o surf. Neste intervalo, por exemplo, você pode fazer outras coisas como tomar sol na praia.
Com o tempo consegui entender esses movimentos. Talvez não se possa, ou melhor, não se deva compreender o que acontece. Tudo rola muita acima da nossa capacidade de compreensão. E neste cenário, é triste a ilusão dos ingênuos que aspiram um novo mestre tentando justificar o injustificável.
A questão não é neutralizar em definitivo a dor, mas sim o oposto usar a experiência da dor a fim de recuperar o acesso ao gozo. De maneira a entender que esse processo é contínuo na vida de todos. E que ninguém realmente escapa à vitória e à derrota neste jogo.
É loucura imaginar que podemos fugir deste destino. É o ciclo da vida, da existência, que move a todos nós, na dor e na alegria, pelos séculos e séculos amém. O ano novo se aproxima e não será diferente do ano que passou.