Postado em 04 Feb 2016 18 49 Textos Anteriores
Depois da Faixa de Gaza, hoje reduzida a uma
enorme favela de 1,8 milhão de habitantes, Hebron,
na Cisjordânia, é a maior expressão da violência
e da dor no conflito israelense-palestino
por JOMAR MORAIS
Percebi que estava indo para um lugar tenso e perigoso tão logo embarquei no ônibus que parte da Rodoviária de Jerusalém. Não há vidros comuns nas janelas do veículo, mas uma dupla lâmina com película escura. Não há paisagem a observar durante 1h30 de viagem até Hebron, cidade de 183 mil habitantes na antiga Cisjordânia, território palestino capturado por Israel na guerra de 1967.
Observo as poltronas e, então, compreendo o fato insólito: o ônibus leva soldados que moram em Jerusalém e trabalham em Hebron e podem ser alvo de pedradas, apesar dos muros e dos check-points que limitam a locomação de palestinos em áreas ocupadas por colonos e o exército israelenses.
Cidade de 5 mil anos, Hebron é o berço da religião organizada para judeus, muçulmanos e cristãos. É lá que estão as tumbas dos patriarcas Abraão, Isaac e Jacob e suas mulheres (exceto Raquel), encravadas entre uma mesquita e uma sinagoga geminadas, de onde se pode vê-las através de grades. E é lá que o conflito israelense-palestino exibe uma de suas faces mais violentas e degradantes, azeitado pelo fundamentalismo religioso.
Hebron é o único lugar dos territórios ocupados onde colonos - a maioria judeus que acreditam estarem vivendo tempos messiânicos - instalaram um assentamento na área urbana, agora dividida em H1 e H2. Ali, uma paz artificial é mantida ao custo da movimentação permanente de milhares de soldados com seus fuzis automáticos, muros e check-points segregadores.
Para entrar e sair de suas casas, os palestinos enfrentam catracas, raios X e, se necessário, revistas feitas por militares. Em vielas antigas, onde colonos apossaram-se de residências nos andares superiores, os palestinos que insistem em ficar embaixo com suas casas e lojas são protegidos por redes de arame para conter pedras e lixo atirados pelos invasores.
Todo esse aparato garante a Israel o controle militar da Cisjordânia (o comando político é da Autoridade Palestina, fruto dos acordos assinados ao tempo de Yasser Arafat e Ytizak Rabin), mas é insuficiente para conter a indignação dos palestinos e os atos radicais, dos homens-bomba dos anos 80 aos ataques com faca dos dias atuais.
Depois da Faixa de Gaza (hoje uma enorme favela de 1,8 milhão de habitantes, cuja infraestrutura foi devastada por bombardeios israelenses em represália a ataques do radical Hamas), Hebron, onde o moderado Fatah é a força política predominante, apresenta-se como o nó mais complicado desse conflito interminável.
Lá, almocei com palestinos e tomei café com colonos israelenses. Ambos operam argumentos históricos para reivindicar a posse dessa terra disputada por tantos há milhares de anos.
Nesse momento, o governo conservador de Israel, incentivador dos assentamentos, está preocupado com ataques praticados por jovens judeus fundamentalistas contra a vida e o patrimônio de palestinos. Jornais de Israel falam até na aplicação de tortura pelas forças de segurança na caça a esses extremistas.
Não há, contudo, nenhum sinal de que dias melhores virão. Jerusalém (que israelenses e palestinos reivindicam como sua capital), Hebron e as desapropriações de terras invadidas por colonos inviabilizam qualquer aceno de paz.
[ Publicado na edição do Novo Jornal de 02/02/16 ]
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