Postado em 14 Jan 2017 04 48 Textos Anteriores
Em geral, as platitudes que postamos nas
redes são apenas gritos de dor ou de guerra
que reforçam nossas intenções mórbidas
por JOMAR MORAIS
Platitude, eis a palavra. Segundo o dicionário, quer dizer algo banal, trivial, dito de um jeito pouco ou nada criativo, sem acrescentar conhecimento ou beleza.
Platitude, sabemos, é algo que dizemos quando nada temos a dizer ou queremos dizer aquilo que tememos dizer, sob pena de expormos nossas verdadeiras intenções. E nesse último aspecto a nulidade da platitude pode perder sua esterilidade para tornar-se veneno que corrói corações e mentes mediante fraudes emocionais.
Neste momento, no planeta inteiro, uma supersafra de platitudes sufoca-nos e ameaça nossa qualidade de vida e sanidade. Graças ao acesso universal à Internet, elas nos espreitam e assediam em todas as esquinas da vida, todas as horas do dia.
Não mais apenas na TV, em seus programas açucarados, ou nos grupos das redes sociais, dos quais podemos nos proteger com o controle remoto ou a ausência de um clique. Agora as platitudes também nos chegam em mensagens privadas que entopem os celulares de textos, imagens e vídeos vazios, no ritmo ansioso de nossos contatos.
Mas, afinal, o que queremos com essas imagens coloridas e esses textos adocicados que nos mantém na superfície das emoções e bloqueiam o acesso ao bom senso e à serenidade?
Talvez possamos afirmar que, fazendo assim, queremos realizar alguma catarse que expurgue nossas contradições, alivie a nossa dor e purifique o nosso espírito. Nesse nível, as platitudes podem ser o sinal de que nada melhor temos a dizer por absoluta impossibilidade de aceitar, acolher e lidar com o nosso caos – o caos da condição humana.
Mas há outros detalhes que merecem uma reflexão. Por exemplo: por que as platitudes que produzimos ou repassamos tem sempre a intenção de impor aos outros um modelo, uma prática de vida que não corresponde àquilo que fazemos no dia a dia nem ao sentimento real (a motivação) que nos leva a entregar a “receita”?
As platitudes, em geral, estão sobrecarregadas de “recados” de egos feridos, repletos de rancor e ódio, porque um dia se imaginaram não reconhecidos ou preteridos ante a simples evidência de que ninguém – nem mesmo aqueles que nos amam – consegue atender todas as exigências desse constructo mental cruelmente insaciável e sofredor por sua própria natureza.
Quase sempre, com as platitudes, não queremos mudar nada em nosso coração e em nossa mente, a base de onde emerge e se sustenta nosso mundo tumultuado.
Na melhor das hipóteses queremos tão somente lançar o nosso grito de dor, a dor de um ego machucado, e reafirmar a nossa avidez por prazer. Na pior, ecoamos nosso grito de guerra de um modo disfarçado e fraudulento, como a maioria das platitudes que circulam na Internet, simples pastiches em que mentes perturbadas tentam conquistar audiências usando nomes de filósofos, do papa, de escritores famosos e outras pessoas públicas.
E assim as nulidades das platitudes acabam se tornando férteis para, em nome da luz, fortalecerem em nós os sentimentos mórbidos que constituem a nossa sombra.
[ Publicado na edição do Novo Jornal de 10/01/17 ]
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