PULSAR, DE VALDENIDES CABRAL
Postado em18 Jun 2019 18 39 LEITURAS



Pois é; os tais biografismos, ao se comentar uma obra, ferem princípios das Teorias da Literatura. Mas, como além de ser indisciplinado, há muito estou afastado dos bancos da academia, vou enveredar por eles.

Quem teve o privilégio de ser aluno da professora Valdenides Cabral (Tia Val- Letras UFRN), guarda, indelevelmente, na memória esta imagem:  Ela sentada, de pernas cruzadas, cercada de pupilos, conduzindo-os pelo fascinante mundo das Letras: de Chico Doido de Caicó a Drummond, de José Bezerra Gomes a Machado de Assis. Esse trajeto era feito com a leveza e o desprendimento de borboleta degustando néctar (de livros), polinizando conhecimentos e despertando encantamento pela literatura.

E eis que, mesmo ciente da dualidade eu lírico/autor no jogo da criação literária, por pouco o seu PULSAR não me provocou um choque. Claro que um choque bom, sem riscos, senão o de reacordar para o caráter ondulatório e rebelde da poesia, do poeta.

Há muito li este livro. Um dos seus poemas deixou-me mudo:  Eu/ uma náufraga/ salva / pela palavra. Para mim, a poesia destes versos extrapola os limites do sentir, atingindo o âmago do ser. Escrever sobre isso é coisa para gente grande, o que não sou. Por isso, nesse comentário, vou deixar de lado este proceloso oceano e tratar do choque que o PULSAR pode causar nos eternos alunos de Valdenides.

Este choque poderá ocorrer em função dos biografismos que, comumente, se procura numa obra, especialmente, quando se conhece de perto o autor. Portanto, não adianta buscar neste livro o lado borboleta da Tia Val. A começar pela capa, exaltando uma dualidade cósmica de negritude silenciosa e explosão de luzes, sua obra é perpassada de altos e baixos, contrastes, forças que se opõem, assim como as estradas, o relevo, os rios e cascatas do Seridó que lhe são tão caros. São escritos desafiadores, sinuosos sem prolixidade, agudos sem agressividade.

Na sua pulsante caminhada, há espinhos brotando, pedras e pássaros pousando em cactos. Sua correnteza não se entrega mansamente ao mar, toma o rumo do precipício. Seus horizontes, longe da calmaria dos vales, optam por se fazerem de serras, montes com chãos de cascalhos marcando os pés e sol ardente.

Para os desavisados, o poema para Valdenides seria um mansa regência de palavras, como notas e acordes numa orquestra de new age. Mas, ao contrário, é ruptura, incerteza, queda livre em abismo.

E vai além: há um eu lírico que viaja da flor da pele às profundezas do ser, explode como um Big Bang, e convida a conhecê-lo à luz de um exacerbado naturalismo,  expondo em carne viva a moça tecelã e deixando-se explorar através de gânglios e vísceras.

E até quando voa no dorso das palavras, a serenidade cede lugar à turbulência dos sentidos.  E no seu apascentar de palavras, nem batuta de maestro, nem flauta pastoril, mas “cajado forjado no grito”.

Enfim, essa é Valdenides Cabral, menina seridoense que, enquanto meninos alumbrados brincam de empinar estrelas, ela, no seu PULSAR, as cria e semeia entre nós e em universos ainda por virem.

Aldenir Dantas


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Aldenir Dantas da Costa
19 Jun 2019 02 29
A gratidão maior é nossa, minha cara Valdenides Cabral Dias. Especialmente por se manter firme, semeando estrelas entre nós, quando poderia alçar outros voos. Grande abraço.
Valdenides
18 Jun 2019 19 00
Meu querido amigo,
Obrigada pelas palavras carinhosas sobre a minha pessoa. Obrigada sobretudo, por compreender o meu Pulsar de uma forma tão intensa e por ter captado a essência do livro já na capa.
Beijo meu pra ti.
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